05 jul, 2022 - 07:00 • Tomás Anjinho Chagas , Susana Madureira Martins
A Câmara Municipal de Lisboa (CML) pode ser o travão para a venda da sede do CDS-PP ao Chega. O edifício pertence ao Patriarcado de Lisboa, mas desde 2004 a autarquia lisboeta tem “direito de preferência” sobre a sede dos democratas-cristãos no Largo do Caldas, no centro da capital.
D. Manuel Clemente diz que, além de conversas, “não recebemos nenhuma” proposta em concreto. Já Nuno Melo, o novo líder do CDS-PP fala em “disparates” do partido liderado por André Ventura.
Em 2004, a CML realizou “obras coercivas” no edifício porque o Patriarcado não realizou as “obras de conservação”, por isso, o Patriarcado teve de assumir uma dívida de 608 mil euros perante a Câmara, revela a autarquia, em resposta a diversas perguntas enviadas pela Renascença.
Apesar de o município não ser o proprietário, a atual sede do CDS só pode ser vendida com o consentimento da Câmara ou se a dívida, resultante das obras, for paga.
A autarquia, salienta, numa das respostas à Renascença, que “não pode vender o que não lhe pertence”, no entanto, ressalva que “neste caso, pode fazer depender o negócio do pagamento da dívida ao município”.
Neste momento, em vez de o CDS pagar a renda de cerca de 1.000 euros ao Patriarcado de Lisboa (o arrendatário), efetua o pagamento diretamente à Câmara Municipal de Lisboa. Esta foi a forma, acordada entre todas as partes, para o valor das obras coercivas ser pago à CML. Até maio deste ano, a autarquia lisboeta avançou que 215 mil euros já foram pagos. Isto representa cerca de 35% do valor das obras (608 mil euros).
A intervenção da CML pode pesar no futuro da história do edifício-sede do CDS-PP, mas o Chega mostrou recentemente interesse em comprar o imóvel. É público que os centristas têm um problema de saúde financeira por resolver, mas o líder centrista, Nuno Melo, apressou-se a dizer que o CDS não vai sair do Caldas.
Depois da proposta do Chega para ficar com a sede (...)
O Patriarcado de Lisboa, proprietário do edifício adianta à Renascença que “espera para ver”. D. Manuel Clemente ressalva que “o edifício está alugado” e que “as rendas estão pagas”.
Em relação à Câmara de Lisboa, o Cardeal Patriarca assume que a autarquia tem uma palavra a dizer. “Também tem, com certeza. Mas aí, no que diz respeito à relação proprietário-inquilino, são as regras gerais que funcionam”, assegura.
Sobre propostas concretas, D. Manuel Clemente diz que “conversas são conversas, propostas são propostas”, sublinhado que não houve nada concreto.
Em abril, a CNN noticiou que teriam sido oferecidos sete milhões de euros pela sede do Caldas. A Renascença perguntou ao Patriarca de Lisboa sobre se uma eventual nova proposta precisa de mais seriedade, com D. Manuel Clemente a responder: “Com certeza. A este nível não poderia ser de outra maneira. E, sobretudo, tratando-se de quem se trata, concretamente o Patriarcado de Lisboa”, diz o Cardeal.
Após uma primeira abordagem com o Patriarcado, o partido de André Ventura diz que vai voltar “muito brevemente a entrar em contacto” com os proprietários do edifício no centro de Lisboa “para avaliar as condições em que o imóvel pode ser vendido e se existe vontade nesse sentido”.
Sobre o papel da Câmara Municipal de Lisboa, que tem “direito de preferência” (segundo a própria autarquia disse à Renascença), o Chega “não se pronuncia, para já, sobre eventuais dívidas que carreguem o imóvel”, e acrescenta que isso acontece em qualquer caso. “Quer sejam dívidas à CML ou a qualquer outra entidade”, pode ler-se no comunicado.
O partido só o fará quando tiver “o conhecimento, em detalhe, da situação financeira global em que se encontra o imóvel”. Questionada pela Renascença, a direção de André Ventura garante que “não quer melindrar nem ferir de alguma forma o CDS”, ao querer adquirir a sede histórica do partido. E justifica: “houve notícias públicas da vontade do CDS e do Patriarcado em ter um novo senhorio no Largo do Caldas, o CHEGA entrou nesse potencial negócio com toda a boa fé do mundo e com interesse legítimo em não deixar desbaratar para o turismo ou para a banca um edifício com tamanho interesse histórico e cultural (e até religioso)”, lê-se na nota enviada à Renascença em resposta a uma lista de várias perguntas enviadas à direção do partido.
“O CDS não comenta disparates”, dispara Nuno Melo, presidente do partido à Renascença. Apesar disso, o líder centrista lembra que o CDS é “arrendatário da sede do Caldas há muitos anos e estará no uso dos respetivos direitos até que assim o entenda”.
À margem da Conferência dos Oceanos em Lisboa, Nuno Melo preferiu não responder sobre este tema. “O CDS não comenta assuntos internos”, mas apelidou o tema de “um qualquer disparate” que foi “lançado para o debate público”.
A tónica foi sempre a mesma sobre o tema. Quanto à participação da CML no negócio, Nuno Melo reforça que “a sede do Largo do Caldas é uma sede histórica do CDS. Da qual o CDS é arrendatário e com as rendas em dia” e acrescenta que o partido está “no uso dos seus plenos direitos, dos quais não pretende prescindir”, insiste.
“A questão não é questão. Não tenho mesmo mais nada a comentar a propósito”, afirma o líder centrista. Questionado sobre se falou com Carlos Moedas sobre este tema, voltou a rejeitar comentários: “Não tenho mais nada a comentar. Os assuntos internos do CDS são assuntos internos do CDS”, sentencia Nuno Melo.