04 set, 2022 - 00:16 • Lusa
Existe uma "enorme desconfiança" e "um controlo extremamente invasivo" do Ministério das Finanças em relação à Saúde, alerta a antiga ministra Leonor Beleza.
No último jantar-conferência da 18.ª edição da Universidade de Verão do PSD, que termina no domingo em Castelo de Vide, Leonor Beleza nunca se referiu à demissão da ainda ministra da Saúde, Marta Temido, mas defendeu mudanças estruturais neste setor.
"Tem vindo a crescer o número de médicos, o número de enfermeiros e o orçamento destinado ao SNS [Serviço Nacional de Saúde]. Há alguma coisa no conjunto disto tudo que não está a funcionar bem e precisa das tais reformas que não são reformas cosméticas. Não é pôr lá mais dinheiro e mais profissionais, não resolve, há um problema de produtividade", defendeu.
Sem questionar a necessidade de mecanismos de controlo financeiros apertados nos serviços do Estado, a antiga ministra da Saúde de Cavaco Silva (entre 1985 e 1990) considerou que existe atualmente "uma interferência para lá daquilo que é fácil de aceitar" por parte do Ministério das Finanças.
Em concreto, a também conselheira de Estado salientou que no recente estatuto do Serviço Nacional de Saúde, em processo de regulamentação, se prevê que a aprovação do plano de atividades anual e do orçamento de cada hospital seja feita pelo ministro das Finanças.
"Não é pelo ministro da Saúde, nem é com intervenção do ministro da Saúde, é pelo ministro das Finanças [...] Talvez ajude a compreender como acaba por ser dominante, não no discurso oficial, mas na prática, a parte financeira na prestação de cuidados de saúde", afirmou.
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Para a também presidente da Fundação Champalimaud, "existe alguma perversão na forma como essa necessidade de controlo tem de ser vista".
"E sobretudo existe uma coisa: existe uma enorme desconfiança por parte do Ministério das Finanças em relação àquilo que faz o Ministério da Saúde. Toda a gente sabe que essa desconfiança existe, só não sei se toda a gente sabe até que ponto existe um controlo minucioso e extremamente invasivo", alertou.
Na sua "aula" perante os jovens sociais-democratas, Leonor Beleza apresentou números que apontam para um crescente financiamento por parte de privados dos cuidados de saúde e na prestação desses mesmos cuidados aos utentes, considerando que a prática contraria em parte o que está escrito na atual Lei de Bases da Saúde.
"Há um peso que não pode nem deve ser esquecido do financiamento privado dos cuidados de saúde, apesar de a Constituição dizer que temos serviços de saúde tendencialmente gratuitos", referiu, embora considerando que o atual texto constitucional relativo à saúde não necessita de revisão.
Leonor Beleza lamentou o fim de algumas Parcerias Público-Privadas na área da saúde "que funcionavam", salientou o "efeito monumental" que a redução das 40 para as 35 horas teve neste setor e aconselhou os decisores a preocuparem-se mais em pensar "como é que Portugal pode criar mais riqueza do que saber onde se vai gastar o dinheiro".
"O nosso problema é saber como é que o nosso país fica mais rico [...] Deixemos de achar que só somos felizes quando entra dinheiro", defendeu.
No final do jantar, foi transmitido um vídeo com depoimentos antigos de alguns ex-líderes do PSD de homenagem ao diretor da Universidade de Verão, o antigo eurodeputado Carlos Coelho, com os alunos a aplaudirem com entusiasmo as palavras gravadas de Pedro Passos Coelho.
A 18.ª edição da Universidade de Verão do PSD, iniciativa de formação política de jovens que se realiza desde 2003 (com dois anos de paragem em 2020 e 2021 devido à pandemia de covid-19), decorre em Castelo de Vide (Portalegre) desde segunda-feira e até domingo, com o encerramento a cargo do presidente do partido, Luís Montenegro.