17 jan, 2023 - 11:51 • Susana Madureira Martins
Os socialistas querem alterar a lei orgânica do Tribunal Constitucional (TC) para obrigar os três juízes escolhidos pelos pares a serem sujeitos a audição no Parlamento. À Renascença, fonte da direção da bancada do PS diz que é "favorável" a essa alteração.
O argumento dos socialistas é o de que "não faz sentido" que os três juízes cooptados "não sejam ouvidos", tendo em conta que os restantes dez juízes eleitos pelos deputados são obrigatoriamente ouvidos, sendo a audição prévia imposta pelo artigo 257º do Regimento da Assembleia da República.
A Lei Orgânica do TC é omissa quanto à publicidade dos nomes dos juízes cooptados, ficando estes fora da esfera de escrutínio do Parlamento. "Não se pode deixar", refere fonte da direção da bancada socialista, que reforça: "tem de ser, é mesmo uma vontade, mesmo que seja para decidir que não se faz mais nada".
Cabe ao Parlamento legislar sobre o funcionamento do TC e o PS está empenhado em "envolver" os social-democratas nesta alteração à Lei Orgânica do TC e a mesma fonte socialista garante que "no que depender" dos socialistas as mexidas avançam, rematando com um "temos de falar com o PSD".
Esta intenção manifestada pelo PS surge na sequência do caso de António Almeida Costa, que em 2022 foi candidato a juíz do TC por cooptação e que acabou votado e chumbado pelos pares, após uma polémica relacionada com declarações sobre aborto e liberdade de imprensa.
A Renascença questionou o TC sobre como é que avalia esta hipótese de os juízes cooptados serem ouvidos no Parlamento antes de assumirem o mandato, com os juízes do Palácio Ratton a responderem que "sobre a forma de eleição dos juízes do Tribunal Constitucional, a competência para alterar o procedimento atualmente previsto na Lei é da Assembleia da República".
O TC avisa ainda que as "alterações à Lei Orgânica, que tem valor reforçado, exigem uma maioria qualificada" de deputados para serem aprovadas, ou seja, os socialistas precisam mesmo de entender-se com o PSD para obrigar os juízes cooptados a serem ouvidos no Parlamento.
Os juízes do Palácio Ratton salientam também, nas respostas à Renascença, que as "alterações aos artigos da Constituição só podem ser feitos através de revisão Constitucional, tendo de ser aprovadas por uma maioria de dois terços dos deputados em efetividade de funções".
Aberto o processo de revisão constitucional e com a comissão instalada, a Renascença sabe que não é intenção do PS, pelo menos para já, mexer no modelo de cooptação dos juízes do TC, sendo que isso implicaria mexer na Constituição.
Para os socialistas é importante é que o nome dos três juízes cooptados seja sujeito a escrutínio do Parlamento e para isso basta alterar a lei orgânica, acabando com a omissão que existe na legislação.
Em março termina o mandato do atual presidente do TC e o PS admite começar a negociar a substituição de João Caupers com o PSD. À Renascença, fonte da direção da bancada parlamentar socialista diz que este "é um tema a discutir em breve".
A escolha do presidente do TC é feita por votação dos 13 juízes conselheiros, mas há um "acordo histórico" entre PS e PSD para que a indicação da presidência rode entre a direita e a esquerda.
Há dois anos nas negociações entre as cúpulas de ambos os partidos terá ficado garantido que a indicação do próximo presidente do TC seria de um nome ligado ao PS, como contou a Renascença na altura. Em 2021, fonte ligada ao processo referia isso mesmo, que o "expectável" é que o próximo presidente "continue a ser de esquerda".
O PS estava escaldado com a forma como decorreu a eleição do atual presidente, em que para o lugar os socialistas indicaram o nome de José João Abrantes, mas os juízes do TC acabaram por eleger João Pedro Caupers e não o nome indicado pelos socialistas.
O "acordo de cavalheiros" na altura envolveu os líderes dos dois maiores partidos, António Costa e Rui Rio e resta saber agora se se mantém, tendo em conta que entrou em cena Luís Montenegro como novo presidente do PSD. À Renascença, fonte da direção da bancada social-democrata confirma que ainda não foram encetadas conversas com o PS sobre o tema.
Nesta altura há outros dois juízes que já terminaram o mandato há mais de um ano e que ainda não foram substituídos - Pedro Machete, vice-presidente do TC e Lino Ribeiro. Está por definir se a substituição de Caupers poderá ocorrer em simultâneo com a escolha dos substitutos dos outros dois juízes conselheiros. Fonte da direção da bancada socialista responde à Renascença com um "temos de analisar".
A Renascença pediu ao TC que explicasse porque é que dois juízes cooptados que já terminaram o mandato há mais de um ano se mantêm em funções e não se procede a uma eleição entre pares.
Na resposta é referido que "o Tribunal Constitucional não disponibiliza informação sobre os procedimentos de cooptação, que decorrem de acordo com as regras do procedimento que estão estabelecidas na Constituição e na Lei, desde a criação do Tribunal".