27 mar, 2023 - 21:14 • Tomás Anjinho Chagas com Lusa
Perante os 120 deputados do PS que formam uma maioria absoluta e que suportam o Governo, o presidente da Assembleia da República, Augusto Santos Silva, avisou esta segunda-feira que o executivo "responde perante o Parlamento", e que esse deve o órgão de soberania ao qual o executivo presta contas.
A farpa, que pode ser interpretada como uma resposta à subida de tom das críticas dirigidas pelo Presidente da República ao plano "Mais Habitação" do Governo, foi lançada durante o jantar que encerrou o primeiro dia de jornadas parlamentares do Partido Socialista, que decorrem esta segunda e terça-feira em Tomar, no distrito de Santarém.
"Claro que uma democracia tem muitas instâncias de poder, e que os poderes limitam-se uns aos outros", começou por introduzir Santos Silva, que os elencou: "órgãos de soberania do Estado, poderes dos tribunais, da imprensa, da opinião pública, associações cívicas, sindicatos".
Mas reconhecendo que todos esses poderes "se limitam" uns aos outros, o presidente da Assembleia da República estabeleceu que há um deles que tem um papel preponderante no papel de escrutínio do Governo: o Parlamento.
"O debate político entre Governo e oposição é no Parlamento que se faz. É ao Parlamento que o Governo responde e a dialética entre Governo e Parlamento, e não deve ser sequestrada ou retirada ao Parlamento", desfere Santos Silva.
As palavras da segunda mais alta figura do Estado surgem já depois de um fim-de-semana em que o Presidente da República e o Primeiro-ministro tentaram dar uma imagem de normalização das relações, depois de uma semana de tensão entre São Bento e Belém, na sequência das palavras direcionadas por Marcelo Rebelo de Sousa ao Correio da Manhã.
Na visita que os dois fizeram, primeiro à República Dominicana, depois ao Luxemburgo, Marcelo e Costa reconheceram que existem "divergências" políticas entre os dois no que toca à solução para os problemas da habitação, mas fizeram questão de frisar que nada sai para o plano pessoal.
O primeiro-ministro referiu-se ao Presidente da República como "seguramente, uma das melhores companhias que se pode ter, até de avião", e do outro lado Marcelo garantiu que "nunca houve nenhuma zanga pessoal" entre os dois.
No entanto, durante a semana passada, Marcelo Rebelo de Sousa abriu o "melão" da habitação para classificar as opções o plano do Governo como "inoperacional" e uma "lei-cartaz". Poucos dias depois, precisamente no Parlamento, António Costa respondeu ao dizer que prefere funções executivas, porque noutras funções "fala-se, fala-se, fala-se", mas no Governo é que tem de haver resultados. Agora, Augusto Santos Silva vem defender que é ao Parlamento que o executivo tem de prestar contas.
Estas posições foram transmitidas por Augusto Santos Silva no discurso que proferiu no jantar do primeiro dia de Jornadas Parlamentares do PS, em Tomar, distrito de Santarém, quando fez um breve balanço do primeiro ano de legislatura, que se completa na quarta-feira.
“Quero deixar uma palavra de felicitação e de encorajamento ao parlamento no seu conjunto. No momento em que nos aproximamos do balanço deste primeiro ano, essa palavra é merecida e justificada”, sustentou.
De acordo com o ex-ministro de Estado e dos Negócios Estrangeiros, neste primeiro ano, “o conjunto das forças políticas representadas no parlamento atua de acordo com as regras democráticas e as regras institucionais” em vigor.
“Como todos sabemos, é o caso de todas as forças políticas representadas no parlamento português menos uma. A essas forças política que seguem, obedecem e fazem suas as regras do debate democrático é também devida uma palavra de felicitação”, declarou, sem mencionar o Chega como exemplo pela negativa.
Depois, sobre a sua perspetiva pessoal em relação aos anos que lhe faltam cumprir nas funções de presidente da Assembleia da República, Augusto Santos Silva disse que tenciona orientar-se pelos princípios que enunciou no seu discurso de posse no ano passado.
“O meu primeiro compromisso é valorizar a Assembleia da República como a casa da liberdade onde tudo pode ser dito desde que não seja dito segundo o discurso de ódio ou de incitamento da prática da violência. A casa da liberdade rege-se por duas regras fundamentais: A Constituição e o seu próprio Regimento, esses são os limites, essas são as regras que todos temos a responsabilidade de cumprir ou fazer cumprir”, frisou.