09 mai, 2023 - 15:34 • Manuela Pires
Diogo Lacerda Machado, o homem escolhido por António Costa para liderar a nacionalização da companhia aérea, disse esta terça-feira aos deputados que, na altura, não havia outra saída e que não se tratou de qualquer opção ideológica.
Na comissão parlamentar de economia, o antigo administrador da TAP teceu duras críticas ao Governo de Pedro Passos Coelho, que "apressou" a privatização e fez um mau negócio para o Estado, concluindo que era uma privatização “injusta e desequilibrada”.
“O registo que ficou desses dias é, portanto, o de um Governo efémero, despojado da mais elementar legitimidade política pela reprovação do seu Programa nesta Assembleia da República acontecida dois dias antes, a tentar concretizar precipitadamente – contra a vontade bem conhecida de dois terços dos deputados e de quem, consabidamente, iria chefiar o iminente XXI Governo Constitucional – a alienação do controlo da TAP, pelo preço aviltado de 10 milhões de euros."
A par disso, Lacerda Machado refere ainda "a atribuição à Atlantic Gateway de uma opção unilateral de compra do capital remanescente também com contrapartida mínima, o que, a ter acontecido irreversivelmente, arredaria totalmente o Estado da vida da TAP, deixando-o, porém, vinculado a responder pelo passivo desta” disse Diogo Lacerda Machado na declaração inicial aos deputados".
O antigo administrador da TAP, que em 2021 pediu a exoneração do cargo, contrariou ainda o antigo ministro da Economia, António Pires de Lima, que na mesma comissão de economia há umas semanas, disse que o processo de privatização tinha ficado concluído em junho. O antigo administrador da TAP referiu que, legalmente, o processo de privatização estava ainda em curso.
“Julgo, pois, não ser necessária a convocação de ideologia política por bastar mesmo a aritmética mais simples para perceber quão injusta e desequilibrada era essa transação."
Essa, destacou, "era uma das várias vulnerabilidades, porventura a mais gritante, de um processo de reprivatização que, de resto, ao contrário do que aqui foi dito por outras pessoas, estava legalmente ainda em curso e longe de estar terminado por haver ainda diversos actos e formalidades para cumprir nos meses seguintes”.
O antigo administrador da TAP foi questionado pelo PSD sobre se tinha conhecimento do negócio entre David Neelman e a Airbus.
Lacerda Machado diz que soube do negócio em fevereiro de 2016, quando foi assinado o primeiro memorando, e que Fernando Pinto lhe explicou a operação. Lacerda Machado diz que ficou elucidado sobre a bondade de um negócio que favoreceu o Estado e os contribuintes portugueses.
“Eu fiquei elucidado sobre a bondade técnica operacional, económica e financeira daquela operação na perspetiva da TAP. Aquela negociação virou a mesa do jogo", revelou o responsável. "É que o principal beneficiado daquele dinheiro que apareceu na TAP foi o Estado, que recuperou o controlo sem pagar nada e pôde ver a TAP passar de 10 milhões para mil milhões de valor. Esta é a avaliação que eu faço e, portanto, o Estado usou o dinheiro que o senhor Neeleman e o comendador Humberto Pedrosa conseguiram.”
Ainda em resposta ao PSD, Diogo Lacerda Machado revelou que os privados tentaram, em 2020, com a paragem forçada pela pandemia, ajudar a companhia aérea. Os privados, indicou, “disseram que podiam ajudar” e terão tentado encontrar soluções de financiamento com garantias do Estado.
O ex-administrador da TAP revelou ainda que os 55 milhões de euros que David Neeleman recebeu quando saiu da TAP não saíram dos cofres da companhia, foram pagos pela Direção-Geral do Tesouro e Finanças (DGTF) e pela Parpública, garantindo que não participou na transação.
Questionado pelos deputados sobre o negócio no Brasil, a aquisição da manutenção e engenharia da Varig, Diogo Lacerda Machado afirmou que existe uma "perspetiva imbecil" sobre o negócio da manutenção no Brasil, e garantiu que sem esse investimento a TAP “provavelmente" hoje não existia.
“Aquilo que viabilizou a sobrevivência da TAP durante 15 anos foi o Brasil e aquilo que permitiu que a TAP se tornasse na maior operadora estrangeira no Brasil foi o investimento feito na VEM”, disse Diogo Lacerda Machado, que conclui que foi o melhor negócio que a TAP fez nos últimos 50 anos.
A questão do negócio da manutenção no Brasil foi levantada pelos deputados Filipe Melo, do Chega, Carlos Guimarães Pinto, da Iniciativa Liberal, e Bruno Dias, do PCP.