09 nov, 2023 - 14:19 • Cristina Nascimento com Lusa
Começaram por ser sete arguidos, mas esta quinta-feira foram conhecidos mais dois na “operação Influencer”, a investigação que levou António Costa a pedir a sua demissão do cargo de primeiro-ministro.
António Costa não é arguido, disse-o claramente no dia em que anunciou a sua saída. Para já, é somente alvo de inquérito por parte do Supremo Tribunal de Justiça.
Costa não é, mas há oito pessoas e uma empresa que são arguidas. Os mais recentes nesta lista são João Tiago Silveira e a empresa “Start Campus”.
João Tiago Silveira confirmou esta quinta-feira à Renascença que é arguido. Este advogado e antigo secretário de Estado da Justiça, num dos governos liderado por José Sócrates, é também sócio do gabinete de advocacia Morais Leitão, o mesmo gabinete a que pertence outro dos arguidos, Rui de Oliveira Neves.
O outro mais recente arguido é a empresa “Start Campus”. O seu estatuto de arguido foi conhecido esta quinta-feira, uma condição confirmada pela Lusa, que teve acesso ao despacho.
A empresa foi criada em 2020 e apresenta-se, no seu site, como sendo uma “empresa inovadora no processo de seleção de local, design e construção de ecossistemas 100% verdes”. É a empresa responsável pelo projeto de instalação de um “data center” em Sines, megacentro de armazenamento de dados informáticos que envolve um investimento que poderá chegar a 3,5 mil milhões de euros.
O projeto de armazenamento de dados em Sines, classificado pelo Governo como o "maior investimento estrangeiro desde Autoeuropa”, aparece no centro da investigação do Ministério Público que levou à detenção na terça-feira de dois administradores desta sociedade (Afonso Salema e Rui Neves), de Vítor Escária, Diogo Lacerda Machado e Nuno Mascarenhas, presidente da Câmara de Sines.
O Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP) revelou esta semana que está a investigar vários negócios, direta ou indiretamente, ligados às energias renováveis: as concessões de exploração de lítio nas minas em Montalegre e em Boticas, um projeto de central de produção de energia a partir de hidrogénio em Sines e ainda a construção pela Start Campos de um ‘data center’ na Zona Industrial e Logística de Sines.
Destas três linhas de investigação, apenas a relativa à Start Campus consta no despacho de indiciação dos arguidos detidos esta semana.
Dos sete arguidos inicialmente conhecidos, cinco estão detidos e devem ser ouvidos esta quinta-feira à tarde.
Um deles é o agora ex-chefe de gabinete do primeiro-ministro é Vítor Escária, 52 anos. Foi nomeado chefe de gabinete de António Costa em agosto de 2020 e exonerado esta quinta-feira. Antes da nomeação para chefe de gabinete já trabalhava na esfera mais próxima de António Costa, dado que entre 2015 e 2019 foi assessor económico, cargo que já tinha desempenhado entre 2005 e 2011, quando José Sócrates era primeiro-ministro.
Escária foi o principal assessor económico de José(...)
Também o presidente da Câmara de Sines é Nuno Mascarenhas, cargo que exerce há 10 anos está nesta lista. Nuno Mascarenhas está a meio do seu terceiro mandato, sempre eleito pelo Partido Socialista. Antes foi chefe de divisão na administração do Porto de Sines, entre 2005 e 2013. Nuno Mascarenhas tem 56 anos, é licenciado em Economia e chegou a ser professor de Matemática e Economia.
Os restantes três detidos estão ligados à empresa “Start Campus”. Fonte ligada à empresa confirma à Renascença que se trata do presidente executivo Afonso Salema e do diretor jurídico e de sustentabilidade Rui Oliveira Neves. Quanto ao advogado/consultor contratado pela sociedade, será Diogo Lacerda Machado.
Diogo Lacerda Machado é amigo pessoal de António Costa, tendo sido inclusivamente seu padrinho de casamento. Advogado, Lacerda Machado já foi secretário de Estado da Justiça, entre 1999 e 2002, quando António Costa foi ministro da Justiça, no governo liderado por António Guterres.
Amigo de António Costa desde os tempos da Faculdad(...)
Nos últimos anos, Lacerda Machado tem acompanhado de forma próxima a governação de Costa, tendo chegado a representar informalmente o primeiro-ministro em várias negociações sensíveis, nomeadamente dossiers relacionados com a TAP, no caso dos lesados do papel comercial do Grupo Espírito Santo e também no BPI, nas reuniões entre Isabel dos Santos e o catalão CaixaBank.
Afonso Salema, engenheiro industrial formado pelo Instituto Superior Técnico, está há dois na presidência executiva da sociedade “Start Campus”. Antes de chegar à liderança desta sociedade teve várias experiências internacionais em Londres, Nova Iorque e Madrid, sempre na área das energias renováveis, energia e infraestruturas. Afonso Salema chegou a passar pela EDP entre 2009 e 2011.
Rui de Oliveira Neves é advogado, licenciado pela Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa. Na “Start Campus” é Diretor Jurídico e de Sustentabilidade, cargo que ocupa enquanto é, também, um dos sócios do gabinete de advocacia de Morais Leitão, Rui de Oliveira Neves regressou a este gabinete de advogados onde já tinha estado antes de 2013. Entre 2013 e 2021, Neves chegou a desempenhar funções de gestão na Galp.
Além dos cinco arguidos detidos e dos cinco arguidos conhecidos esta quinta-feira, há neste processo mais dois arguidos.
Uma deles é João Galamba. Nomeado ministro das Infraestruturas em janeiro de 2023, Galamba já tinha sido secretário de Estado do Ambiente e da Energia no anterior Governo, além de secretário de Estado Adjunto e da Energia e secretário de Estado da Energia em governos anteriores, desde 2019.
Antes, foi deputado do PS, de 2009 a 2019, tendo sido vice-presidente do grupo parlamentar socialista. Licenciado em Economia pela Faculdade de Economia da Universidade Nova de Lisboa, concluiu a parte letiva do Doutoramento em Ciência Política na London School of Economics, tendo lecionado Filosofia Política no departamento de Government.
A terminar, também é arguido Nuno Lacasta é presidente do Conselho Diretivo da Agência Portuguesa do Ambiente desde 2012.
É licenciado em Direito pela Faculdade de Direito da Universidade de Lisboa (FDUL), tem um mestrado pelo Washington College of Law da American University e o Advanced Management Program da Kellogg Business School/Católica Business School.
Sob investigação estão as concessões de exploração de lítio de Montalegre e de Boticas, no distrito de Vila Real, um projeto de produção de energia a partir de hidrogénio em Sines, Setúbal, e o projeto de construção de um ‘data center’ (centro de dados) na Zona Industrial e Logística de Sines pela sociedade Start Campus.
Em causa estão os crimes de prevaricação, corrupção ativa e passiva de titular de cargo político e de tráfico de influência.
A Procuradoria-Geral da República (PGR) justifica as detenções com “o perigo de fuga, de continuação de atividade criminosa, de perturbação do inquérito e de perturbação da ordem e tranquilidade públicas”.
António Costa é alvo de uma investigação autónoma do Ministério Público (MP) junto do Supremo Tribunal de Justiça (STJ)
A PGR refere que, durante as investigações, surgiu “o conhecimento da invocação por suspeitos do nome e da autoridade do primeiro-ministro e da sua intervenção para desbloquear procedimentos” nos negócios investigados.
Porque a função de primeiro-ministro goza de foro especial, um inquérito só poderá decorrer no Ministério Público junto de um tribunal superior, daí a intervenção do STJ.
A investigação foi coordenada pelo Departamento Central de Investigação e Ação Penal (DCIAP) e contou com o apoio da Polícia de Segurança Pública (PSP) e Autoridade Tributária (AT).
As buscas foram feitas na terça-feira e foram realizadas pelo menos 42, incluindo 17 buscas domiciliárias, cinco buscas em escritório e domicílio de advogado e 20 buscas não domiciliárias, nomeadamente, em espaços utilizados pelo chefe do gabinete do primeiro-ministro; no Ministério do Ambiente e da Ação Climática; no Ministério das Infraestruturas e na Secretaria de Estado da Energia e Clima; na Câmara Municipal de Sines e na sede de outras entidades públicas e de empresas.
[atualizado às 19h16]