24 nov, 2023 - 16:56 • Susana Madureira Martins
Fazer um comício-festa de um dia, alterar os estatutos do partido, lançar a campanha para as legislativas de março e evitar cair na armadilha de usar o caso Influencer como arma política contra um PS em processo de escolha de líder. É o resumo do que poderá ser o Congresso extraordinário do PSD deste sábado, em Almada.
Escaldados pelos casos Tutti-Frutti e Vórtex que, este ano, colocaram o partido no centro de polémicas judiciais, a cúpula social-democrata quer aproveitar toda a oportunidade criada pela dissolução do Parlamento, sem falar diretamente do caso Influencer.
À Renascença, Miguel Pinto Luz reconhece que a política e a justiça "são dois espaços que têm de alguma forma contacto, mas devem de uma forma higiénica funcionar em paralelo, em separado e com independência".
Este vice-presidente do PSD justifica que o partido "nunca se aproveitou" de casos judiciais específicos para fazer oposição, mas, ressalva, que não desapareceu o foco de "apresentar um projeto alternativo" ao país, que também abrange a área da Justiça.
"A justiça não vai ser esquecida nesta campanha eleitoral, simplesmente porque há um caso judicial que assola o atual Governo, não", garante Pinto Luz.
O dirigente social-democrata acusa ainda os socialistas de terem esquecido o mantra de António Costa - "à justiça o que é da justiça à política o que é da política" e o PS "agora faz tábua rasa e já se tenta intrometer e influenciar a justiça".
No mesmo sentido vai Luís Newton, presidente da concelhia do PSD de Lisboa, ele próprio a braços com a justiça, na sequência do processo Tutti-Frutti. Este dirigente e apoiante de Luís Montenegro diz à Renascença que, "infelizmente, aquilo que temos estado a assistir com os vários processos judiciais é a transformação da justiça num programa de Big Brother".
Newton lamenta o clima mediático em que, "de repente", os suspeitos são sujeitos a "um direto, a um especial com informações privilegiadas". Em relação ao caso Influencer, que envolve o primeiro-ministro, o dirigente do PSD nota que o país "está a assistir a uma banalização de um processo que deveria ser sério, íntegro" e tratado "nos locais próprios".
Contra o estado de um país a assistir a "mais uma telenovela", o PSD "tem que falar daquelas que são as verdadeiras ansiedades dos portugueses", resume Newton. Por exemplo, "esta ideia de que a classe média em Portugal vive com 1200 euros. Isto não cabe na cabeça de ninguém, é este o país que temos que alterar".
Também o deputado e líder da Federação da Área Oeste do PSD, Duarte Pacheco, assume à Renascença que esse "não pode ser esse o cavalo de batalha", mas, a reflexão deve ser feita sobretudo "depois das eleições e nunca a quente, porque quando se reage a quente, normalmente, reage-se mal", conclui.
A estratégia dos dirigentes nacionais é, assim, a de saltar por cima de casos concretos e não fazer do Congressso extraordinário de Almada um ajuste de contas judicial com o PS. Mas no partido esta posição não é absolutamente consensual e há quem considere que o PSD não deveria perder a oportunidade.
Em conversa com a Renascença, um antigo dirigente do PSD conclui que "é muito difícil ignorar o assunto" e que "nem é saudável ignorar". Mostrando-se "contra a judicialização da política", a mesma fonte refere que "não pode ser ignorado que o primeiro-ministro se demitiu" e "não é responsável", tratando-se mesmo de "um erro" que o Congresso não fale disso.
Para este antigo dirigente do PSD a linha que não pode ser cruzada pelo partido "é acusar os socialistas de terem praticado atos, mas é impossível esquecer que o Parlamento vai ser dissovido porque um processo judicial afetou o primeiro-ministro".
E isto "mesmo que amanhã sejam todos considerados inocentes", assume a mesma fonte. Porque aí "é muito importante" debater que "se o Ministério Público errou temos de olhar para a Justiça" como um todo.
É esse debate que a direção nacional evita agora. Em conversa com a Renascença, um deputado do PSD mostra-se muito desconfortável com o rumo de todo o processo Influencer.
"António Costa tem um processo aberto e se não há nenhuma deliberação o inquérito corre o risco de ir para o tribunal ordinário", salienta esta fonte que questiona: "O processo foi para o Supremo só para o primeiro-ministro cair?".
É uma versão que corre no meio socialista e que corre agora entre os social-democratas. O mesmo deputado considera que "o Supremo Tribunal de Justiça devia pronunciar-se rapidamente", porque "do que vem a público parece não haver nada", conclui, rematando que "houve exageros".
Nada disso é assumido pelo PSD oficial. O que se assume na direção nacional é a resposta aos problemas das grandes áreas, incluindo na Justiça. Face à intenção manifestada esta semana por José Luís Carneiro, um dos candidatos à liderança do PS, em fazer uma reforma da justiça consensualizada com o PSD, Miguel Pinto Luz não diz que não.
"A área da Justiça, a área da Educação, da Saúde são áreas que obrigam,de facto, a grandes consensos nacionais em, pelo menos em certas componentes dessas áreas", admite o vice-presidente do PSD, que desabafa ainda que folga "em saber que um dos candidatos ao Partido Socialista tem esse espírito mais ecuménico e mais de consenso num tema que manifestamente não está a funcionar".
Pinto Luz assume que "manifestamente estamos todos de acordo" que a Justiça precisa de respostas. "É importante pensarmos aquilo que temos que mudar", mas "a seu tempo, o PSD também terá uma palavra a dizer sobre isso". Ou seja, a resposta a dar não pode ser é a quente.