11 dez, 2023 - 19:45 • Pedro Mesquita
O caso das gémeas brasileiras que receberam, em Portugal, o medicamento mais caro do mundo, também fez títulos, a letra gorda, no Brasil.
Quando a polémica estalou, o Globo escreveu: "Pistolão: brasileira terá furado a fila com ajuda do presidente de Portugal para obter remédio de 10 biliões de reais para filhas gêmeas". Já a Folha de São Paulo chamou a titulo: "Presidente de Portugal é acusado de favorecer bebés brasileiras em fila para remédio".
Mas o assunto tão depressa foi notícia no Brasil, como desapareceu rapidamente do radar mediático.
Lucas de Aragão, consultor político brasileiro, não tem dúvidas: "O que virou notícia no Brasil foi o sucesso do pedido em Portugal e, obviamente, o caminho polémico e controverso que aconteceu por aí".
O Brasil tem acompanhado o caso das gémeas brasileiras que receberam o medicamento mais caro do mundo em Portugal, e a polémica que estalou a propósito do envolvimento, neste caso, do Presidente português?
A repercussão foi pequena. Claro que houve uma repercussão, saiu na imprensa, mas eu acho que o interesse maior foi pelo facto de existir uma ligação ao Brasil.
Mais do que pelo facto político em si, por aquilo que aconteceu com o Presidente português.
Há indicação de que os pais destas gémeas tenham feito idêntico pedido ao às autoridades da saúde brasileiras?
Devem ter tentado. Podem ter tentado, mas viram ali uma brecha, via Portugal. Seja pelos seus contactos, seja por alguma oportunidade que apareceu e os pais, desesperados, acabaram por aproveitar.
O que virou notícia no Brasil foi o sucesso do pedido, em Portugal e, obviamente, o caminho polémico e controverso que aconteceu por aí.
Esse caminho polémico e controverso, de que fala, poderia ter acontecido no Brasil?
É difícil dizer que é impossível, mas é provavelmente seria mais raro isso acontecer. Porquê? Porque seria uma discussão que, provavelmente, acabaria na mão de um juiz.
O Brasil tem um sistema único de saúde, uma saúde universal para os seus cidadãos. Mas, obviamente, em casos muito específicos, isso é judicializado. Ou seja, a interferência direta de um Presidente, ou de um ministro, em relação a uma decisão de um juiz iria representar um perigo grande para o político que tomasse a decisão de tentar interferir.
Estaria a ver, por exemplo, o filho de Bolsonaro interceder por um casal amigo, com filhas, para tentar que elas recebessem o medicamento mais caro do mundo, aí no Brasil?
Olhe, não aconteceu mas, se acontecesse, isso seria um facto extremamente relevante, aqui no Brasil. Vamos lembrar, por exemplo, que durante a transição de Bolsonaro para Lula assistimos à prisão é do Mauro Cid, que era uma espécie de secretário do ex-presidente Bolsonaro.
O que aconteceu, naquele momento, é que houve uma investigação referente à falsificação de cartões de vacinação para que o Presidente, e alguns membros da família, pudessem viajar sem tomar vacina. Houve uma investigação para perceber se os cartões de vacinação foram adulterados, ou não. Isso já foi um grande facto político, aqui no Brasil.
Então imagine a repercussão que teria o caso do filho de um Presidente, ou de qualquer outro membro relevante da estrutura política do Brasil, que fizesse um pedido desses, que tem repercussões gerais pelo país. É que são muitos os pedidos no país de remédios caros, que não estão no rol de medicamentos que o sistema único de saúde entrega. São remédios que precisam de uma decisão legal para que sejam entregues, ou não, àquela família, àquela pessoa.
Então, seria um escândalo, aqui no Brasil, tal como imagino que esteja a ser, aí em Portugal.