17 jan, 2024 - 06:51 • Beatriz Pereira
"Com a falta de humildade e a vaidade que me são atribuídas digo que estou absolutamente convencido de que" enquanto foi primeiro-ministro, entre 1985 e 1995, "em nenhuma outra década foi alcançado resultado semelhante".
É desta forma que o ex-Presidente da República Aníbal Cavaco Silva começa um texto, que assina no jornal Observador, esta quarta-feira, intitulado como "Memórias de um governo “cansado” e “arrogante” (Parte I)".
Num longo texto, em que assinala um rol de feitos durante o tempo que foi primeiro-ministro, Cavaco compara, com ironia, os seus dois últimos anos de Governo com os últimos oito do Governo socialista, auto-elogiando o seu trabalho à frente do país, que "deu um salto em frente e que muito surpreendeu a União Europeia".
O ex-Presidente da República começa por relembrar o programa de erradicação das barracas das áreas metropolitanas de Lisboa e Porto, "o maior no domínio da habitação alguma vez levado à prática em Portugal", diz.
"Por um lado, a conclusão do troço do IP4, na extensão de 52 quilómetros, de Vila Real a Mirandela, (...) por outro lado, a construção da Ponte do Freixo e do seu acesso a sul", relembra ainda.
Além das estradas e pontes, Cavaco Silva recorda "a preparação do terreno para a realização da Expo’98, a maior obra de requalificação urbana da zona metropolitana de Lisboa desde o tempo do Marquês de Pombal", "a introdução do gás natural em Portugal por gasoduto ligado aos poços da Argélia", "o lançamento, em junho de 1994, do programa das Aldeias Históricas de Portugal", a inauguração do "Hospital Distrital de Leiria, o oitavo construído de raiz durante o meu tempo de primeiro-ministro", "o lançamento do concurso internacional para a introdução do comboio na Ponte 25 de Abril" e até a promoção "da criação da Portugal Telecom".
Cavaco Silva afirma ainda que os feitos que recorda "é suficiente para demonstrar que é compreensível que afamados analistas e cronistas políticos pensem que era natural que os ministros do governo sentissem alguma fadiga física, tal a dimensão da obra realizada nos últimos dois anos da minha década de primeiro-ministro, quando comparada com a dos oito anos do atual poder socialista".
"A minha satisfação por esta obra é tanto maior, quanto ela foi realizada num tempo em que o Governo enfrentou uma forte oposição política, uma legítima, outra menos legítima", sublinha.
Já na parte final do texto, o antigo chefe de Estado refere estar "cansado de lembrar a obra do meu governo nos dois últimos anos do seu mandato", por isso evoca "a arrogância política e a vaidade com que, no dia 26 de abril de 1995, no final da cerimónia de inauguração da fábrica de automóveis da Autoeuropa, conduzi um veículo nela produzido, dando uma volta à pista de ensaios" quando faltavam seis meses para cessar as funções de primeiro-ministro.
E questiona: "quando é que chega o outro projeto do tipo Autoeuropa de que o poder socialista tem falado?".
Este é o primeiro de dois textos publicados por Cavaco Silva. A segunda parte do artigo será publicada na próxima terça-feira, "dedicada ao pecado da 'arrogância política' ".