05 fev, 2024 - 07:08 • Tomás Anjinho Chagas (nos Açores)
Queria ter maioria absoluta mas a fragmentação não deixou. José Manuel Bolieiro conquistou a primeira vitória eleitoral do PSD desde 1996 – na altura com Mota Amaral – mas ficou a três deputados com a maioria absoluta. E ao contrário de 2020, a aposta agora é encostar o PS à parede.
Ao chegar à sede do PSD em Ponta Delgada, Bolieiro foi engolido por uma multidão que abanava bandeiras laranjas e açorianas. Levantaram-no e atiraram-no ao ar como se faz aos treinadores depois de vencerem um troféu.
Já no interior do edifício, a frase de Montenegro levantou o véu sobre a estratégia: “Não obstante não haver uma maioria absoluta da coligação, só pode haver um governo alternativo a este se todas as outras forças políticas, e em particular o PS e o Chega, se unirem e coligarem”
Ao conquistar 26 deputados na assembleia legislativa regional, a coligação PSD/CDS/PPM precisa de apoios parlamentares para viabilizar o programa de governo, caso contrário cai. Mesmo conseguindo convencer a Iniciativa Liberal e o PAN, José Manuel Bolieiro precisa de mais uma fatia do queijo limiano.
Ou seja, para a maioria absoluta os social-democratas teriam de se entender com o Chega, tal como aconteceu em 2020, mas ao invés, a estratégia mudou: quer governar em “maioria relativa” e deixar com o PS a responsabilidade de derrubar um governo liderado por um partido que venceu eleições.
A tónica de Bolieiro é essa: “Não se pode colocar as maiorias relativas em crise com coligações negativas na oposição. Se o fizerem, cada um assume a sua responsabilidade”, disse durante o discurso de vitória.
E em resposta aos jornalistas fala numa "bela memória" referindo-se à aprovação de um governo minoritário do PSD por parte do PS em 1996, indicando que idealmente esse seria o caminho de 2024.
Sabendo que o eleitorado português tende a castigar quem provoca instabilidade política, o PSD vai tentar afastar o fantasma do Chega atirando-o para o PS. Se os socialistas votarem contra o programa de governo ou tirarem o tapete a Bolieiro num orçamento regional, ficam com o peso de terem alinhado na “coligação negativa” em que está o Chega. E de inviabilizar um governo sem o Chega.
Para o PS a noite esteve longe de corresponder aos objetivos. Com a derrota agravada – em 2020 o PS foi o partido mais votado, mesmo não havendo maioria de esquerda – os socialistas podem estar perante um horizonte de quase oito anos de oposição na região autónoma.
Seria sempre muito tempo, mas o peso é agravado pelos Açores terem sido um bastião do PS nas últimas décadas. Vasco Cordeiro, que foi líder do governo regional entre 2012 e 2020 voltou a deixar escapar a vitória para Bolieiro e pode estar na iminência de abandonar a liderança do PS/Açores.
O secretário-geral do PS, Pedro Nuno Santos, esteve no arquipélago a fazer campanha mas isso foi insuficiente para os socialistas recuperarem o poder. A dinastia César pode estar de regresso e ser assumida por Francisco César, atual deputado do PS e filho de Carlos César.
Apesar de em termos absolutos o Chega ser o partido que mais cresce em relação a 2020, o partido de André Ventura pode vir a ser anulado pela estratégia do PSD.
Se até aqui o deputado regional, José Pacheco, tinha um papel preponderante na aprovação de orçamentos regionais, o PSD pode dar um abraço de urso ao Chega e reduzir o partido ao protesto.
Não obstante, o partido cresce de dois para cinco deputados regionais e torna-se inevitável na aritmética parlamentar açoriana.
Foi até à última. Os dirigentes do Bloco de Esquerda, Iniciativa Liberal e PAN perderam seguramente unhas ao acompanhar a noite eleitoral. Os três partidos estiveram até aos derradeiros minutos da contagem dos votos para assegurar representação parlamentar nos Açores e conseguiram-na no círculo de compensação (o último a ser apurado).
Apesar de manter a representação, o Bloco de Esquerda perde um deputado em relação a 2020. O PAN e a Iniciativa Liberal sobrevivem ao manter o deputado único. De fora volta a ficar a CDU que, mais uma vez, falhou a eleição.