11 mar, 2024 - 04:12 • Alexandre Abrantes Neves , João Pedro Quesado (infografia)
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Copo meio cheio. Inês Sousa Real falhou o que tinha definido como o grande objetivo das legislativas – a recuperação de um grupo parlamentar -, mas, nem por isso, a líder do PAN falou em derrota no discurso de rescaldo da noite eleitoral.
A porta-voz do Pessoas-Animais-Natureza (a última líder partidária a ser eleita) preferiu reforçar a subida de mais de 35 mil votos do partido em comparação com 2022 e, num limbo entre o passado e o futuro, Sousa Real desviou as legislativas e colocou o foco no “bom resultado” na Madeira e na “esperança” para as europeias de junho.
Aliás, ao longo de toda a noite, na Sala do Rei na estação do Rossio, em Lisboa, o “estado-maior” do PAN nunca falou de pessimismo, mas sim de uma “noite longa e de grande expectativa”, como referiu na primeira reação às projeções o dirigente nacional Ernesto Morais.
Longo acabou por ser o silêncio nas cerca de 50 cadeiras que se alinhavam frente ao púlpito: até ao anúncio da eleição de Sousa Real, poucos foram os membros do PAN que teceram comentários sobre os resultados. Às oito da noite, a reação às primeiras sondagens acabou até boicotada por um problema técnico, que cortou a internet e travou a transmissão televisiva. Curiosamente, as televisões voltaram a sintonizar-se minutos depois, precisamente, no momento que as projeções abriam a possibilidade de o PAN ficar de fora do Parlamento.
O filme foi longo, na contagem dos votos, e os simpatizantes e militantes do PAN assistiram atentamente a todas as intervenções dos outros líderes partidários até Inês Sousa Real subir ao púlpito – durante três horas, a líder do PAN entrou e saiu da sala várias vezes. Mas quando a porta-voz interrompeu, finalmente, a sessão de cinema e apareceu rodeada pela direção, trouxe dois convidados especiais. O primeiro, o "Pipinho", o cão que acompanhou a comitiva do partido durante toda a campanha e que se tornou a grande atração da noite eleitoral. O outro, o Presidente da República.
Depois de dez dias na estrada, com críticas sistemáticas aos adversários políticos, nomeadamente a direita, Sousa Real deixou de lado algum pudor institucional e pela primeira vez virou-se para Marcelo Rebelo de Sousa. No que pareceu ser uma crítica à marcação de eleições antecipadas, a líder do PAN acusou o chefe de Estado de contribuir para “um clima de instabilidade” e para a “descrença das pessoas e para a frustração” – que, para Sousa Real, se transformaram num “voto de protesto, ao invés de um voto de confiança nas forças políticas do espetro democrático”.
Nem tudo pode ser novidade e, por isso, Sousa Real voltou a não esclarecer o que o PAN vai fazer no parlamento. Entre os valores “irrenunciáveis” e a necessidade de “proteger a democracia”, a porta-voz do PAN deixou apenas claro que Montenegro “matematicamente” não consegue governar sozinho. Contudo, para Sousa Real, a estabilidade do país que é “necessária”, não pode ser obtida a “todo o preço”. Por isso, a defesa dos direitos das mulheres, a causa ambiental e animal e a defesa da escola pública são algumas das condições apresentadas pelo PAN ao sociais-democratas – e um entendimento vai depender da “proximidade do PSD a estas causas”.
Perto de ficar de fora do Parlamento, Sousa Real trouxe para cima da mesa a revisão do sistema eleitoral e dos círculos uninominais - e deixou críticas ao PS e PSD por não estarem disponíveis para essa discussão que ia "reforçar a democracia".
E numa campanha marcada por desfiliações, Inês Sousa Real não quis arrumar as bandeiras partidárias sem insistir na saúde da democracia interna do partido.
Depois de vários membros se terem desfiliado – o ex-porta voz, André Silva, disse que o partido perdeu a “coluna vertebral” e “cria repulsa” a qualquer democrata –, a líder do PAN insistiu várias vezes ao longo da noite que vai respeitar os órgãos do partido e que a última palavra quanto a um entendimento será “sempre” da Comissão Política Permanente.
Com menos lugares do que queria, o PAN "estacionou" pela quarta vez no Parlamento. À direita, a caravana da AD pode precisar de ajuda, se encontrar pedras na estrada até uma solução de estabilidade governativa. Resta saber se Sousa Real está disposta a sair do carro e a dar balanço a um Governo liderado por Montenegro.