23 dez, 2024 - 19:46 • Tomás Anjinho Chagas
O líder do Chega foi, esta segunda-feira, véspera da véspera de Natal, à boca do lobo. André Ventura fez questão de ir a uma das zonas de Lisboa com maior presença de imigrantes e que foi o epicentro da polémica operação da PSP da semana passada, de onde saíram imagens de dezenas de estrangeiros de mãos na parede, mas de onde só saíram dois detidos, ambos portugueses.
A comitiva do Chega levava um saco de rosas brancas que foi distribuindo durante o trajeto, de cerca de 40 minutos, entre a praça do Martim Moniz e a Rua do Benformoso. As flores brancas serviram de resposta aos cravos vermelhos que foram distribuídos este fim-de-semana por várias pessoas a imigrantes. Aos jornalistas, André Ventura falou para se voltar a colocar do lado da PSP.
"Não podemos, sempre que há uma ação mais musculada da polícia, fazer rolar cabeças na polícia, dizer que a polícia está a agir como no tempo do fascismo", atirou o líder do partido, rodeado por vários apoiantes e a habitual larga equipa de segurança pessoal. Pouco antes, afirmou que o país está a "assistir a um genocídio das forças de segurança".
André Ventura defende que "ninguém deve dizer aos polícias como é que se faz policiamento", e cava um fosso ao dizer que há "quem esteja contra a imigração ilegal e com a PSP".
Apesar de criticar os restantes partidos e de colocá-los no mesmo saco, André Ventura assume que o Governo, ao incentivar ativamente este tipo de ações policiais está a aproximar-se do Chega: "Estamos a conseguir que o Governo acorde. Chega está a marcar uma nova linha política de atuação", atira.
Com uma provocação, responde à pergunta se isso pode enfraquecer o Chega e robustecer a AD: "Chega ainda está a crescer mais. Entre a imitação e o original, as pessoas escolhem sempre o original. Com toda a humildade e respeito, o original sou eu".
No percurso de algumas centenas de metros, a bolha do Chega foi-se cruzando com as centenas de imigrantes, a maior parte deles do subcontinente indiano. Muitos deles reconheceram André Ventura ao vê-lo passar, outros não perceberam quem era e estavam mais entusiasmados com o aparato.
Os portugueses que lá moram, dividem-se ao cumprimentar o líder do Chega. "Nunca tive problema com pessoa nenhuma, mas têm de trabalhar e circular, não andar a vender certos produtos", queixa-se uma senhora em passo apressado, referindo-se ao tráfico de droga. Lamenta que muitos imigrantes se sentem à porta de sua casa e obstruam a passagem.
Mais aceso, um morador passa pela comitiva do Chega na berma da estrada e grita: "Eu moro neste bairro e o problema não são os imigrantes. A rua do Benformoso é a rua do populismo. Isto é teatro, vocês falam dos imigrantes na televisão e depois vêm para aqui cumprimentá-los".
A frase dirigia-se a André Ventura, que tentou responder, mas o morador seguiu em frente e foi-se embora porque não queria ser filmado.
Durante o trajeto, um imigrante fura a bolha para falar com o líder do partido. É o líder da comunidade do Bangladesh em Portugal e cumprimenta André Ventura calmamente. "Somos uma comunidade para todos, aqui todos são bem-vindos, o senhor também, nós somos amigos", afirmou Rana Taslim Uddin. A resposta: "Eu é que o cumprimento por estar aqui, porque a terra é nossa ainda", corrigiu o presidente do Chega.
A réplica não desmoronou a boa vontade deste imigrante. "Eu sei! No dia 29 queria convidá-lo para uma festa aqui no Martim Moniz".
Dentro das lojas, os trabalhadores, a esmagadora maioria imigrante, iam estranhando aquela quantidade enorme de pessoas a passar a meio da tarde e em simultâneo.
O líder do Chega, que tantas vezes critica os "subsidiodependentes" foi abordado por uma portuguesa que estava sentada na rua com um pacote de vinho ao lado. "É a favor dos portugueses?", perguntou a André Ventura. "É isso mesmo", respondeu o deputado. "Eu sou portuguesa, era capaz de me dar uma ajuda?".
O momento foi de tal forma inusitado que André Ventura explicou que não tinha ali dinheiro. Depois da insistência, dois membros da comitiva passaram-lhe algumas moedas e uma nota de cinco euros, que foi entregue à senhora que fez o pedido.
O percurso foi naturalmente tenso e atribulado, mas não foi registado qualquer incidente físico, os confrontos foram essencialmente verbais. Um grupo de três portugueses saiu do prédio e, em uníssono, gritaram: "25 de abril sempre, fascismo nunca mais". A resposta dos apoiantes de André Ventura foi cantar pelo Chega.