26 out, 2015 - 09:02 • Aura Miguel, em Roma, e Filipe d’Avillez
Durante dois anos, foram muitos os especialistas que discutiram as possibilidades, os efeitos e as eventuais consequências de um sínodo sobre a família que, por vezes, parecia ser unicamente debruçado sobre os casais de divorciados recasados ou os homossexuais.
Agora que o documento final já foi aprovado e divulgado, as opiniões continuam divididas. O jornalista britânico Austen Ivereigh, autor de uma das mais importantes biografias do Papa Francisco, considera que, mais do que o documento final, o próprio sínodo é que foi histórico.
“Acho que neste sínodo tem havido uma discussão que era muito necessária e que há alguns anos não era possível. Em geral, os sínodos no passado não têm tido muito efeito directo sobre os fiéis, porque os sínodos foram desenhados para reafirmar o que a Igreja já pensava e já sentia", diz Ivereigh e,notando que “um dos temas grandes do sínodo tem sido o sínodo mesmo. A estrutura, o formato e o método do sínodo.”
Já Jean-Marie Guénois, vaticanista veterano do jornal francês “Le Figaro”, mostra-se mais céptico em relação ao que se passou ao longo das últimas três semanas em Roma.
“Penso que assistimos a uma batalha teológica rara, na história recente da Igreja e que, ao mesmo tempo, é uma batalha política muito específica - política, no sentido em que há duas visões pastorais da Igreja opostas”, diz.
Sobre a questão do acesso aos sacramentos por parte das pessoas em uniões irregulares e o facto de o documento final incluir a proposta de que cada pessoa nessas situações faça um discernimento interior, acompanhado por um assistente espiritual, o jornalista afirma que “há mais ambiguidade do que nunca, porque a decisão para julgar uma situação moral particular é entregue ao casal, ao bispo, ao padre. Assim, passa a haver menos normas universais, para haver cada vez mais avaliações individuais. Por isso, sem obviamente julgar as pessoas e sem julgar o Papa, para mim é evidente que a estatura moral da Igreja Católica enfraquece”.
Questionado sobre se trata de uma vitória da vertente pastoral sobre a doutrinal, Guénois discorda: “Não creio que seja uma vitória, porque a pastoral sempre existiu. Até parece que este sínodo inventou a pastoral na Igreja, mas não é verdade. A pastoral já existia no tempo de João Paulo II, de Paulo VI, de João XXIII.”
“Ficamos com a impressão de que, actualmente, a Igreja já não julga e que apenas se interessa sobre as pessoas, mas ela sempre se interessou pelas pessoas. Só que, antes, fazia-o no segredo do confessor e do confessionário, e, hoje, a Igreja dá a impressão de ceder a uma evolução mundial que justifica o divórcio e, em parte, a homossexualidade", aponta Guénois.
“E na Igreja, um passo nessa direcção, terá consequências graves e pesadas”, conclui.