24 jun, 2016 - 15:48 • Filipe d'Avillez , Aura Miguel , enviada da Renascença à Arménia
O Papa Francisco referiu esta sexta-feira, na Arménia, à tragédia sofrida pelos arménios na segunda década do século XX, fazendo questão de improvisar e usar o termo "genocídio", a que a Turquia se opõe ferozmente.
Falando aos líderes políticos e aos representantes diplomáticos na Arménia, onde chegou esta sexta-feira para uma visita pastoral, Francisco utilizou primeiro o termo arménio para a catástrofe, mas logo de seguida desviou do seu discurso escrito para usar o termo genocídio, lamentando depois que o mundo tinha olhado para o lado durante o massacre.
Recordando e agradecendo a recente visita do presidente e dos líderes religiosos da Arménia a Roma, Francisco disse que “naquela ocasião, comemorou-se o centenário do ‘Metz Yeghérn’, o ‘Grande Mal’, que atingiu o vosso povo e causou a morte de uma multidão enorme de pessoas. Aquela tragédia, aquele genocídio, marcou o início, infelizmente, do triste elenco das imensas catástrofes do século passado, tornadas possíveis por aberrantes motivações raciais, ideológicas ou religiosas, que ofuscaram a mente dos verdugos até ao ponto de se prefixarem o intuito de aniquilar povos inteiros.”
O número de mortos, sobretudo arménios, às mãos das autoridades otomanas é alvo de discussão, mas há estimativas que apontam para vários milhões. Cristãos assírios e gregos também morreram. Ao longo das últimas décadas a comunidade arménia, incluindo uma importante diáspora, tem feito campanha para que o evento seja conhecido oficialmente como genocídio.
O Papa já tinha referido o termo, numa audiência a uma delegação arménia, espoletando na altura uma crise diplomática com a Turquia.
O genocídio arménio tornou-se um elemento central da identidade do país ao longo dos últimos 100 anos, mas Francisco não concentrou o seu discurso neste aspecto, preferindo apelar aos seus anfitriões que sejam solidários com quem sofre atrocidades semelhantes hoje em dia.
“O povo arménio experimentou estas situações na própria carne; conhece o sofrimento e a dor, conhece a perseguição; guarda na sua memória não só as feridas do passado, mas também o espírito que sempre lhe permitiu começar de novo. Neste sentido, encorajo-o a prestar a sua valiosa contribuição à comunidade internacional.”
Apelo à paz
A visita do Papa Francisco a esta região inclui ainda uma ida ao Azerbaijão, país com o qual a Arménia tem um longo conflito territorial, devido à ocupação de Nagorno Karabakh, um enclave de maioria arménia naquele país.
É por isso de particular significância o apelo do Papa à resolução pacífica das guerras. “Tendo diante dos nossos olhos os resultados nefastos a que conduziram, no século passado, o ódio, o preconceito e a ambição desenfreada de domínio, espero vivamente que a humanidade saiba tirar daquelas experiências trágicas a lição de agir, com responsabilidade e sabedoria, para evitar os perigos de recair em tais horrores.”
“Por isso multipliquem-se os esforços, por parte de todos, por que, nas disputas internacionais, prevaleçam sempre o diálogo, a busca constante e genuína da paz, a colaboração entre os Estados e o assíduo empenho das organizações internacionais, a fim de se construir um clima de confiança propício a alcançar acordos duradouros.”
Francisco elogiou ainda a identidade cristã da Arménia, o primeiro país a adoptar o cristianismo como religião de Estado. “Esta identidade, longe de obstaculizar a sã laicidade do Estado, exige-a e alimenta-a, estimulando a cidadania participativa de todos os membros da sociedade, a liberdade religiosa e o respeito pelas minorias. A coesão de todos os arménios e o maior esforço por identificar estradas úteis para superar as tensões com alguns países vizinhos tornarão mais fácil realizar estes objectivos importantes, inaugurando uma época de verdadeiro renascimento para a Arménia.”
A Renascença na Arménia com o Papa Francisco. Apoio: Santa Casa da Misericórdia de Lisboa