02 dez, 2017 - 23:44 • Aura Miguel
O Papa terminou este domingo a sua viagem apostólica a Myanmar e o Bangladesh. A situação dos Rohingya dominou grande parte da conversa de Francisco com os jornalistas a bordo do avião no regresso ao Vaticano.
Francisco disse que não usou essa palavra em Myanmar para não cancelar o diálogo com as autoridades e poder passar a sua mensagem.
“Interessava-me que a mensagem chegasse. Por isso, percebi que se, no discurso oficial tivesse dito aquela palavra, batia a porta na cara. Mas descrevi a situação, os seus direitos, sem excluir ninguém, a cidadania, para que pudesse depois ir mais longe nos colóquios privados. Fiquei muito satisfeito com os colóquios que tive e pude ver que a mensagem chegou”, disse.
O Sumo Pontífice falou da conversa que teve em privado com o general birmanês, sem revelar conteúdos.
“Foi o general que pediu para me falar e eu recebi-o. Nunca fecho a porta: se queres falar comigo, vem! A falar, nunca se perde nada, ganha-se sempre. Foi uma bela conversa. Não posso falar dela, porque foi uma conversa privada, mas eu não negociei a verdade. Mas falei de modo a que ele compreendesse que regressar ao caminho errado que havia dantes, hoje já não é viável”, acrescenta.
Francisco elogiou a disponibilidade do Bangladesh, um país pobre que recebeu 700 mil refugiados, quando há países mais ricos que lhes fecham a porta.
“Sabia que ia encontrar os Rohingya, não sabia era quando, nem como, mas era uma condição para eu lá ir. Foi tudo preparado entre o governo e a Cáritas. Trata-se de um problema para o governo, que os protege e lhes dá hospitalidade. Por isso, é grande o Bangladesh, e é grande o exemplo de acolhimento que lhes dá: um pequeno país pobre que acolheu 700 mil enquanto penso em países que lhes fecham as portas. Devemos estar gratos pelo exemplo que nos deram”, referiu.
O Papa confirmou ainda que chorou ao ouvir os testemunhos dos Rohingya e que teve pena de não poder visitá-los, lá nos campos de refugiados onde estão amontoados, mas era fisicamente impossível.
“Depois de os ter ouvido, um a um, com intérprete, comecei a sentir uma coisa cá dentro e pensei “não posso deixar que eles partam sem lhes dizer uma palavra”. Então, pedi o microfone e comecei a falar. Não me lembro do que disse, mas sei que, a certa altura, pedi perdão. Naquele momento, eu chorava, mas tentava que não se visse. Mas eles, choravam também”.
Francisco também se interrogou sobre a licitude das armas nucleares, face aos riscos crescentes em destruírem a humanidade.
“Estamos no limite da licitude de possuir e usar armas nucleares. Porque hoje, com um arsenal nuclear tão sofisticado, arriscamo-nos à destruição da humanidade ou, pelo menos, de grande parte dela. O aumento das armas nucleares, cada vez mais sofisticadas e até cruéis, pois são capazes de destruir as pessoas, sem atingir as estruturas… chegámos ao limite. E, porque chegámos ao limite, faço esta pergunta - não como magistério pontifício, mas é a pergunta que um Papa faz a si mesmo: “É lícito hoje manter os arsenais nucleares, tal como estão? Ou hoje, para salvar a Criação, salvar a humanidade, não é necessário dar um passo atrás?”
Quanto a próximas viagens, a Índia continua nos planos do Papa, “talvez no próximo ano, se ainda for vivo”, disse Francisco. E quanto à China, o percurso é lento, exige muita paciência, de momento, as relações são a nível cultural e científico. Não está prevista nenhuma viagem, mas Francisco reafirmou que gostaria muito de lá ir.
A Renascença com o Papa em Myanmar e no Bangladesh. Apoio: Santa Casa da Misericórdia de Lisboa