09 fev, 2018 - 15:41 • Liliana Carona
Na Casa de Saúde Bento Menni, na Guarda, as irmãs hospitaleiras estão decididas a apostar na arte como terapia, no tratamento da doença mental. Os 168 utentes pintam, cantam, escrevem poesia e até fazem um jornal.
Há dois anos inauguraram o “Espaço Arte”, uma espécie de museu onde todo este talento pode ser visto e reconhecido e que a Renascença foi conhecer, no âmbito do Dia Mundial do Doente que se assinala a 11 de fevereiro.
A Irmã Benedita, de 64 anos, passa pouco tempo no seu gabinete. Todos os dias pega na viola e vai ao encontro dos 168 utentes da Casa de Saúde. Alguns já ganharam gosto, e aprendem a tocar diversos instrumentos, “até já existe um grupo de rancho folclórico”.
“A viola sempre fez parte do meu instrumento de trabalho, todos os utentes têm já um ritmo com eles, eles vibram muito”, destaca.
Noutra sala ao lado, a utente Isabel Gantes de 55 anos, há oito anos, na Casa de Saúde Bento Menni prepara mais uma visita guiada ao “Espaço Arte”.
“É uma galeria de arte que tem algumas das obras que fizemos aqui na unidade, sofás feitos de azulejos, (sugerindo várias interpretações) e aqui está o beijo de Gustav Klimt, com papelinhos previamente colados de revistas” aponta para a parede, elogiando o apoio das irmãs hospitaleiras. “Foi graças às irmãs que consegui este espaço de trabalho em que me posso recolher”, conta à Renascença.
O “Espaço Arte”, criado há dois anos, a pedido dos utentes, faz Isabel Gantes, sair do quarto, onde os livros são tantos, que já não há mais espaço para colocar nenhum. Estudou Jornalismo e apesar de não ter terminado a licenciatura, vive ainda hoje com o bichinho. “Temos um jornal da casa, o ‘Serrano’ e temos também um jornal de parede, onde escrevemos todos os meses”, realça com orgulho, considerando que a sua arte suprema é a poesia, “escrevo muito prosa poética, mas também gosto da pintura, ajudou-me a descobrir esta arte, porque eu nunca tinha pegado numa tela”, confessa.
Esta é uma grande casa, a Casa de Saúde Bento Menni, na Guarda, tem valências direcionadas para áreas da psicogeriatria, psiquiatria e deficiência intelectual.
A casa é gerida pela Irmã Isabel Morgado. Também ela esteve há 24 anos na fundação deste espaço. “Eu estive na origem desta casa. É uma casa virada para cuidar de doente mentais. Chegam-nos situações mais graves, doentes de evolução prolongada, com dificuldades de adaptação social, com fracos recursos, no fundo as histórias das gentes comuns”, explica, justificando, o motivo que a leva a apostar na arte e cultura. “Aqui é sua casa, são pessoas que sonham e que conservam a sua inteligência e vontade”, admite, sobre o local que pertence à província da congregação das irmãs hospitaleiras do Sagrado Coração de Jesus.
Carla Costa, psicóloga clínica, há 15 anos, na Casa de Saúde Bento Menni, refere que também ela gosta de fazer justiça ao ideal da fundadora desta congregação, Maria Josefa Récio. “O modelo hospitaleiro é um modelo que trabalha muito os cuidados humanizados, olha-se muito à pessoa. Para que se sintam realmente bem”, enaltece.
Que ligação pode existir entre a escrita, a música, a pintura, a arte e a doença mental? “A arte tem sido utilizada como forma libertadora e terapêutica, e até, como dizia a utente Isabel, de descobrir o gosto de fazer algumas coisas diferentes, que nem sabíamos que tínhamos jeito”, esclarece a técnica. “São doenças que alteram o funcionamento da vida da pessoa, como a esquizofrenia, a depressão, a bipolaridade, mas que não retiram ao indivíduo a capacidade de sonhar e de fazer o que mais gosta”, adianta.
A congregação das irmãs hospitaleiras do Sagrado Coração de Jesus foi fundada em Ciempozuelos, Madrid, a 31 de maio de 1881 por S. Bento Menni, sacerdote da Ordem Hospitaleira de S. João de Deus, juntamente com Maria Josefa Recio e Maria Angustias Gimenez.