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Cristãos no Iraque não confiam na ONU. "Só as igrejas trabalham"

29 jun, 2018 - 17:32

Em entrevista à Renascença, o padre de uma vila iraquiana que fugiu em massa perante o avanço do autoproclamado Estado Islâmico defende a unidade do seu país e rejeita a ideia de se criar uma milícia cristã.

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Os cristãos do Iraque não confiam nas agências das Nações Unidas que se encontram no terreno.

Quando o Estado Islâmico ocupou a cidade de Mossul e toda a área circundante, incluindo a Planície de Nínive, centenas de milhares de cristãos foram obrigados a fugir e a procurar refúgio no Curdistão iraquiano.

No dia 20 de junho o Secretário-Geral da ONU, António Guterres, encontrou-se com o Patriarca Cirilo, de Moscovo, a quem garantiu estar pessoalmente empenhado no regresso dos cristãos iraquianos às suas casas, agora que o Estado Islâmico foi expulso do território.

Mas segundo o padre iraquiano Thabet Habeb Mansour, que esteve em Portugal a convite da fundação Ajuda à Igreja que Sofre (AIS), o entusiasmo de Guterres não é refletido no terreno.

“Se perguntarem aos cristãos desta zona eles dirão que as igrejas é que funcionam. A Igreja, com a ajuda de organizações não-governamentais como a Ajuda à Igreja que Sofre, trabalha com eficiência. A ONU está lá, mas não se nota nada. Não é eficiente.”

“No meu caso estou à espera que o Programa de Desenvolvimento das Nações Unidas abra poços de água na minha aldeia de Karemlash. Eles aceitaram o projeto, mas até agora não vimos nada. Até vermos resultados concretos, não acreditaremos”, diz.

Entretanto são as igrejas que vão trabalhando pelo regresso dos cristãos. Formou-se uma Comissão de Reconstrução para a Planície de Nínive, de que o padre Thabet faz parte, que com donativos canalizados por organizações como a AIS já procedeu ao restauro ou reconstrução de milhares de casas.

“Quando Mossul foi libertada as nossas vilas foram-nos devolvidas, mas em muito mau estado. Parte da destruição deveu-se aos bombardeamentos contra o Estado Islâmico, mas os terroristas também incendiaram muitas das casas, depois de as terem pilhado e danificado. Danificaram igrejas, cemitérios, todos os símbolos cristãos foram destruídos pelo Estado Islâmico. Por isso a área foi libertada, mas os danos foram imensos”, explica.

“Depois de um ano, quando os gabinetes da comissão formada pelas igrejas começaram a trabalhar, e após algum trabalho limitado por parte do Governo iraquiano para limpar as vilas, já conseguimos que 40% das famílias regressasse às suas casas”, acrescenta.

A fuga

Foi na noite de 6 para 7 de agosto que a vida mudou para os cristãos da vila de Karemlash.

Mossul caía às mãos do Estado Islâmico, que espalhava o terror, massacrando soldados do exército iraquiano, que foi totalmente desbaratado.

“Quando o Estado Islâmico atacou a nossa região as forças curdas, que a estavam a defender, fugiram antes da população. O povo da minha vila perguntou-me o que devia fazer e eu disse que estavam livres para partir. Em duas horas a vila estava vazia. Fiquei sozinho com dois diáconos, na esperança que os terroristas não viessem, mas quando se tornou evidente que iam atacar fui à igreja buscar o Santíssimo Sacramento e alguns manuscritos antigos e fugimos. Era melhor para nós continuar com os nossos fiéis”, recorda o padre Thabet. A viagem para Erbil, capital do Curdistão iraquiano, demorou perto de sete horas, em vez dos habituais 40 minutos.

Agora que os cristãos começam a regressar a casa, muitos prometem que não voltarão a fugir segunda vez. Mas continua a haver desafios complicados, com algumas forças políticas e regionais a querer alterar a demografia da região, para que os cristãos e outras minorias percam influência.

E persiste também o medo, uma vez que muitos cristãos recordam que quem os expulsou das suas casas não foram os jihadistas, mas os seus vizinhos muçulmanos. Perante a tentação de recorrer à força, criando milícias, para proteger as comunidades cristãs o padre Thabet é perentório.

“Uma milícia cristã, uma para os yezidis, outra para os shabaques… Isso só gera confusão. Mas se tivermos um bom exército iraquiano, que se creia servir o país e não este ou aquele grupo étnico, isso seria bom. É nisto que pomos a nossa esperança, não nas milícias. Acreditamos num Iraque unido”, explica.

Na mesma linha, o sacerdote da igreja caldeia, uma igreja católica de rito oriental, rejeita a ideia de dar autonomia à Planície de Nínive, como reivindicam alguns grupos representativos dos cristãos daquela zona. “A maioria dos líderes cristãos opõe-se a essa ideia, que não é realística. Não é possível trazer forças internacionais para proteger poucas aldeias e vilas.”

Apesar disso, e de defender a unicidade do Iraque também perante as tentativas de independência curdas, o padre gostaria de ver reforçados os direitos e o poder local das aldeias e vilas cristãs, melhorando assim a sua capacidade de responder às ameaças políticas e demográficas e aumentando o potencial de criação de empregos.

O Iraque já foi um dos países com maiores comunidades cristãs no Médio Oriente, mas a queda de Saddam Hussein e a consequente instabilidade que se lhe seguiu, levaram muitos a emigrar. A Planície de Nínive, terra ancestral dos cristãos iraquianos, continuava a ser um dos poucos locais onde estes viviam em segurança, até que a chegada do Estado Islâmico obrigou à fuga generalizada. Com o regresso da paz os líderes cristãos procuram convencer a comunidade a permanecer no país.

Comentários
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  • Fernando Machado
    30 jun, 2018 Porto 15:00
    A ONU é uma palhaçada pegada. O nosso Guterres que se ponha a pau, que qualquer dias o mau da fita Trump, corta-lhe os brutais subsídios e depois quero ver. Agora temos o nosso roliço Bitorino como diretor-geral da .......se precisarem de mim, estou disponível, carago.

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