23 ago, 2018 - 19:41 • Aura Miguel, enviada a Dublin
A zona onde decorre o Encontro das Famílias, em Dublin, é uma espécie de FIL com stands e bancas para vários gostos, com gente de todas as idades e raças, mais ou menos apressados, consoante os horários das conferências e encontros agendados. E o ponto alto está guardado para o fim de semana, quando o Papa chegar, como sempre acontece nestes encontros mundiais.
O panorama fora do Encontro, no entanto, é mais agreste. É que a visita de Francisco a Dublin vem ao encontro de uma Igreja dispersa e fraturada, não só pela recente derrota no referendo contra o aborto, mas com feridas profundas causadas por sucessivos casos de abuso sexual, denunciados nas últimas décadas, com graves consequências na prática religiosa.
Em 2010, o Papa Bento XVI escreveu uma carta ao povo irlandês a prometer tolerância zero e medidas efetivas, mas pouco ou nada se fez. E agora, nem a recente Carta de Francisco ao Povo de Deus, sobre a mesma questão, acalma os ânimos dos irlandeses.
Marie Collins - que representou as vítimas na Comissão Pontifícia para a Proteção de Menores, mas se demitiu em 2017 frustrada pela inércia vaticana - disse à imprensa local que “as intenções podem ser boas, mas o que conta são os atos”. Por isso, acrescentou. “se Francisco vem cá sem anunciar medidas concretas para responsabilizar os encobridores (padres, bispos e cardeais que silenciarem estes crimes), será devastador para o povo”.
A Irlanda seria, pois, o sítio certo para o Papa o fazer, “uma vez que o crime de abuso atinge o coração das famílias e elas precisam de saber o que ele vai fazer para proteger as suas crianças e acabar com isto no futuro”, conclui esta irlandesa vítima de abuso.
A jornalista da Renascença Aura Miguel acompanha o Papa Francisco na sua Viagem Apostólica à Irlanda com o apoio da Santa Casa da Misericórdia de Lisboa.