22 set, 2018 - 11:13 • Aura Miguel com Redação
A Santa Sé anunciou este sábado que chegou a um acordo provisório com a China sobre a nomeação de bispos chineses.
Segundo o comunicado emitido pelo Vaticano, este acordo resulta de um longo processo com vários contactos e reuniões entre delegações de ambos os lados. A Santa Sé salienta ainda que o acordo “é fruto de uma reaproximação gradual e recíproca” e prevê uma revisão periódica da sua implementação.
“Espera-se que este acordo favoreça um caminho frutífero e perspicaz de diálogo institucional e possa contribuir positivamente para a vida da Igreja Católica na China, para o bem comum do povo chinês e para a paz no mundo”, pode ler-se no documento.
O porta-voz da Santa Sé salienta que o acordo não tem motivações políticas. “O objetivo do acordo não é político, mas pastoral, para permitir que os fiéis tenham bispos que estão em comunhão com Roma e que, ao mesmo tempo, são reconhecidos pelas autoridades chinesas, diz Greg Burke.
Para o Vaticano, trata-se apenas o início do processo, não o fim. Greg Burke lembra que “tem sido uma questão de diálogo, de ouvir pacientemente ambos os lados, mesmo quando as pessoas têm diferentes pontos de vista.
Do lado chinês, o ministro dos negócios estrangeiros emitiu um comunicado em que refere que os dois lados assinaram um acordo para manter o diálogo e o trabalho com vista à melhoria das relações entre ambos.
Feridas abertas há várias décadas
China e Vaticano romperam os laços diplomáticos em 1951, depois de Pio XII excomungar os bispos designados pelo Governo chinês. Pequim reivindicava o direito a nomear os bispos católicos, considerando que a nomeação a partir de Roma representava uma ingerência inaceitável nos seus assuntos internos.
Os católicos chineses dividiram-se então entre duas igrejas: a Associação Católica Patriótica Chinesa, aprovada por Pequim, e a clandestina, que continuou fiel ao Vaticano.
A divisão esmoreceu-se nos anos 1980, quando o Papa João Paulo II reconheceu 30 bispos designados pela igreja oficial chinesa. Em 2007, Bento XVI apelou a uma reconciliação entre a igreja clandestina e a oficial, mas em algumas áreas do país continuaram a existir divisões.
Há muitas feridas abertas, sofrimentos, perseguições e martírio por parte da Igreja clandestina, sobretudo de sacerdotes e bispos que se recusam a pertencer ao partido comunista, como pretende o Governo na Igreja Católica Patriótica.
São milhões de fiéis católicos que, até aos dias de hoje, viram os seus bispos presos e enviados para campos de trabalho forçado por permanecerem fieis a Roma.
Não há detalhes neste comunicado, mas a Renascença apurou junto de fontes próximas do Vaticano que há sete bispos patrióticos em situação irregular, dois dos quais excomungados que Pequim quer que a Santa Sé reconheça. Do lado da igreja clandestina, há quatro bispos detidos e um outro em prisão domiciliária.
Neste momento, existem cerca de 60 os bispos patrióticos e cerca de 30 da igreja clandestina.
A perspetiva deste acordo há algum tempo que dividia as comunidades de católicos por toda a China. Alguns temiam que isso resultasse numa maior supressão por parte de Pequis, outros mostravam-se a favor da reaproximação e de um possível restabelecimento das relações diplomáticas entre a China e a Santa Sé, após um afastamento de mais de meio século.
Esta semana, o cardeal Joseph Zen, bispo emérito de Hong Kong, disse à agência Reuters que as consequências de um acordo seriam “trágicas e duradouras, não apenas para a Igreja na China, mas para toda a Igreja porque prejudica a credibilidade”. O Vaticano, disse, estaria a dar “o rebanho na boca aos lobos”. “É uma incrível traição”, afirmou.
[notícia atualizada às 15h00]