26 jan, 2019 - 18:51 • Ana Catarina André, na Cidade do Panamá
No Campo de Santa Maria La Antigua, onde decorrem os atos centrais da Jornada Mundial da Juventude, um grupo de peregrinos transporta uma bandeira da Venezuela com mais de 10 metros. Gipsy, 30 anos, caminha por baixo do pano, enquanto grita: “Venezuela, Venezuela.”
Está ansiosa com o desenrolar dos acontecimentos no país, desde que Juan Guaidó se autoproclamou Presidente interino na passada quinta-feira. “Vivemos há 20 anos numa ditadura disfarçada de democracia. Milhares de venezuelanos, como eu, tiveram de emigrar. É muito triste.”
Gipsy está há dois anos no Panamá. “Trouxe os meus dois filhos, mas o resto da família ficou lá.” Esta semana, foi surpreendida com as notícias de manifestações e conflitos no país. “Chorei durante quatro horas quando soube o que estava a acontecer no meu país.” Só lhe resta a esperança, diz. “É uma grande emoção saber que as coisas podem melhorar.”
Pelas ruas da Cidade do Panamá multiplicam-se as histórias de latino-americanos que vivem em contextos políticos e económicos instáveis. Estes têm sido, aliás, recordados pelo Papa Francisco nos seus discursos e homilias, desde que aterrou no país.
Na Via Sacra, Francisco não esqueceu os “olhos tristes dos jovens que veem arrebatadas as suas esperanças de futuro por falta de instrução e trabalho digno” e “os que caem nas redes de exploração e abuso”.
Juana, 50 anos, vem da Nicarágua e está no Panamá a participar como voluntária na JMJ. “ A minha irmã vive aqui e foi por isso que consegui vir”, conta. “Num tempo tão difícil para a Nicarágua [sob o regime autoritário de Ortega], estar aqui é um presente de Deus.”
Juana trabalha numa paróquia a uma hora de Manágua. “O Governo acusa a Igreja de golpista, mas não é verdade. Muitas empresas fecharam e quem conseguiu saiu do país.”
Tem dois filhos, de 24 e 20 anos, mas nenhum deles frequenta a universidade. “Não tenho dinheiro. Estão ambos desempregados. O mais velho está a ser perseguido pelas autoridades, porque criticou o regime nas redes sociais.” É por este motivo que Juana não quer ser fotografada. Teme pela vida do filho.
Além da Venezuela e da Nicarágua, países como Costa Rica e Brasil estão entre os mais representados.
Alfonso, 40 anos, vem da Colômbia. Sobrevive pelas ruas da cidade graças a um carrinho de venda de gelados. É assim que vai ganhando uns trocos para comprar comida. Para trás deixou o filho, de 20 anos, e um “montón de compañeros”.
“A vida no meu país é muito difícil por causa dos guerrilheiros”, diz. “Decidi arriscar. Comecei com este negócio há uns dias. Há muitos peregrinos e tem corrido bem.” Alfonso está no Panamá há seis meses, mas continua sem documentação. “Preciso de 400 dólares para me legalizar, mas ainda não consegui arranjá-los”, diz, contando que está a dormir em casa de um amigo. A chegada do Papa é uma lufada de ar fresco, diz. “Tenho muita esperança de que a minha vida melhore.”