19 abr, 2019 - 20:06 • Aura Miguel
A Via Sacra no Coliseu de Roma, nesta Sexta-Feira Santa, vai recordar em 14 Estações todas as vítimas do tráfico humano, em especial os menores, as mulheres forçadas à prostituição e os migrantes.
A celebração presidida pelo Papa Francisco começa às 21h15 (menos uma hora em Lisboa). Este ano as meditações da Via Sacra foram confiadas à religiosa Eugenia Bonetti, uma irmã missionária da Consolata que é também presidente da Associação “Slaves no more” (Escravos nunca mais), que se tem dedicado à defesa dos mais explorados e excluídos da sociedade.
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Todos os anos, o Papa pede a um autor diferente a redação dos textos de reflexão apresentados nas estações da Via Sacra de Sexta-feira Santa. Em 2018, as meditações foram escritas por um grupo de jovens estudantes de Roma.
Quanto ao tema do tráfico humano, o Papa aprofundou esta matéria em 2015, na sua Mensagem anual para o Dia Mundial da Paz.
Irmã Eugenia Bonetti: “Enquanto governos discutem, o Saara enche-se de esqueletos”
A impotência de tantas mães que veem os filhos “padecer e morrer por doença, por falta de comida, de água, de cuidados médicos e de oportunidades de vida”, ou a tragédia de tantas crianças “exploradas nas minas, nos campos, na pesca, vendidas e compradas – por traficantes de carne humana – para transplante de órgãos, e também usadas e exploradas nas nossas estradas por muitos, inclusive cristãos, que perderam o sentido da sacralidade própria e alheia. Como aquela menor de corpinho frágil, encontrada uma noite em Roma, com uma fila de homens a bordo de carros luxuosos para dela se aproveitarem. E, no entanto, poderia ter a idade das suas filhas...”, escreve a Irmã Eugenia Bonetti, missionária da Consolata.
“É fácil trazer o crucifixo ao peito ou pendurá-lo como ornamento nas paredes das nossas belas catedrais ou das nossas casas”, lê-se numa das meditações, “mas não é tão fácil encontrar e reconhecer os novos crucificados de hoje: os sem-abrigo, os jovens sem esperança, sem emprego nem perspetivas, os imigrantes obrigados a viver em barracas à margem da nossa sociedade”.
A religiosa, com vasta experiência no acompanhamento de mulheres e crianças vítimas de tráfico humano, denuncia que “dinheiro, bem-estar, poder” são os ídolos do nosso tempo, em que “tudo é adquirível, inclusive o corpo dos menores, privados da sua dignidade e do seu futuro”.
E se “a nossa sociedade proclama a igualdade em direitos e dignidade de todos os seres humanos”, também “pratica e tolera a desigualdade nas suas formas mais extremas, com homens, mulheres e crianças comprados e vendidos como escravos pelos novos mercadores de seres humanos”.
No elenco destas tragédias, não falta o calvário dos migrantes e de tantos que morrem pelo caminho: “O deserto e os mares tornaram-se os novos cemitérios de hoje. Perante estas mortes, não há respostas. Mas há responsabilidades. Irmãos que deixam morrer outros irmãos. Homens, mulheres, crianças que não pudemos ou não quisemos salvar. Enquanto os governos discutem, fechados nos palácios do poder, o Saara enche-se de esqueletos de pessoas que não resistiram à fadiga, à fome, à sede.”