10 mai, 2019 - 06:59 • Ângela Roque (Renascença), Octávio Carmo (Ecclesia)
Secretário-geral do Conselho das Conferências Episcopais da Europa (CCEE) durante mais de 10 anos, o padre Duarte da Cunha voltou a Portugal há pouco mais de meio ano, mas continua atento ao (cada vez mais) “velho” continente, que o cargo que exerceu lhe permitiu conhecer bem.
Responsável pela paróquia de Santa Joana Princesa, em Lisboa, o sacerdote organizou o ciclo de debates "Europa? Qual Europa? O tempo presente é o tempo favorável", cuja última sessão decorrerá na próxima terça-feira, dia 14.
Em entrevista à Renascença e à agência Ecclesia, Duarte da Cunha lamenta que na campanha eleitoral não se fale mais dos problemas da Europa, como o dos migrantes e refugiados. Diz-se preocupado com os movimentos populistas, xenófobos, mas também com a "cartilha ideológica"’, com que alguns "lobbies" em Bruxelas tentam “homogeneizar” a Europa, que “perdeu a alma” e tem de “redescobrir” as suas raízes cristãs. Porque os europeus, garante, “são pessoas religiosas”.
Duarte da Cunha fala em comunidades cristãs “vivas e coesas”, em vários países, mesmo não sendo a maioria, e lembra que é a Igreja que continua a assegurar importantes respostas sociais. “Se desaparecessem as obras de caridade” promovidas pelos católicos, o mapa europeu “seria trágico”, diz.
Acabámos de celebrar mais um Dia da Europa e estamos em contagem decrescente para as eleições europeias. Tendo em conta a sua experiência de vários anos, de contacto com a realidade em vários países, do ponto de vista da Igreja e não só, o que é que mais o preocupa na Europa hoje?
Poderíamos dizer que o que mais falta hoje na Europa - aquilo que o Papa Francisco às vezes chama a "velhice da Europa" - é a falta de esperança e empenho, achar que as coisas não podem melhorar. Isto tem a ver com o envelhecimento da população, as crises demográficas, o chamado inverno demográfico, mas também com uma perda de alma da Europa, uma certa desorientação sobre a identidade da própria Europa. Isso é transversal não só aos países da União Europeia, mas aos países em geral.
Paradoxalmente, são os países de Leste - talvez porque saíram de regimes ditatoriais, onde a esperança estava atrofiada - que mais mexem com a Europa hoje em dia, numa perspetiva de construção. Também por isso são mais rebeldes, às vezes, a certas orientações.
Mas a falta de esperança e empenho no futuro, a falta de querer qualquer coisa, de ser claro sobre onde se quer chegar, é um problema generalizado que faz com que muitos desistam. Estão metidos na sua vida, nas suas coisas, não se interessam muito com o destino do bem-comum, do seu país, muito menos com o destino dos europeus.
Sentiu essa falta de esperança nestes anos em que esteve no CCEE? Mesmo do ponto de vista da Igreja?
A falta de esperança está ligada ao individualismo: as pessoas não querem construir uma coisa comum, porque querem construir o seu conforto. Isto é falta também de evangelização. Se pensarmos bem, o que é que faz com que uma pessoa possa ter um certo ímpeto para construir? É qualquer coisa a que a pessoa se sente chamada a fazer, uma dimensão mais vocacional, diria quase. Com a secularização generalizada, o desaparecimento de Deus e o individualismo, muito concentrado no "eu", na autoestima e realização pessoal, há uma certa crise de querer fazer coisas melhores para os meus filhos, para o destino dos outros, ou para as próximas gerações. Há um consumismo também... Mas isto são aspetos negativos e a Europa não tem só aspetos negativos.
"Há uma espiritualidade cristã, uma vida interior dos europeus"
A hierarquia católica, e os últimos Papas, têm chamado sistematicamente a atenção para o abandono das raízes cristãs da Europa - o secularismo, o afastamento da fé. São problemas que vão para além da própria religião?
São, porque as raízes cristãs da Europa podem ser vistas em três blocos. Uma é a raiz cristã relacionada com a espiritualidade da Europa. Os europeus são pessoas religiosas, basta andar pela paisagem europeia e vê-se nas igrejas, locais de oração, santuários, ainda há muita gente a rezar e muita devoção, por piedade popular ou formas mais sofisticadas. Podemos dizer que há um abandono da prática dominical, uma diminuição do número de cristãos, mas há uma espiritualidade cristã, uma vida interior dos europeus. A perda da prática da vida espiritual é, de facto, um certo afastamento das raízes cristãs e isso tem consequências no resto da vida.
Uma outra raiz cristã relaciona-se com os valores, os princípios morais e a orientação da vida, aquilo que, no fundo, é a mundividência cristã, que tem a ver com o amor, a caridade, a solidariedade, o respeito pela dignidade da vida da pessoa, no fundo com os grandes princípios da Doutrina Social da Igreja (DSI). Os nossos bispos acabaram de publicar uma Carta Pastoral sobre a Europa, onde sublinham esta importância. Se estas referências cristãs desaparecem, são substituídas por outras mais utilitaristas e consumistas, de outra ordem. E esse abandono das raízes cristãs no âmbito dos valores é também uma perda.
Mas há ainda um terceiro fator, que é o que a Europa entende como a sua vocação no mundo global. A globalização implica uma consciência de cada um sobre o seu papel neste mundo global. Todos somos específicos, especiais, únicos, cada um tem a sua missão. E a Europa tem a sua missão.
No mundo, a Europa teve sempre um papel, às vezes menos bom, mas teve um papel e levou muita coisa boa: alem da fé cristã, levou desenvolvimento, levou a tecnologia. Mesmo os direitos do Homem que hoje temos e são genericamente aceites. Podemos dizer que nem toda a gente aceita os Direitos do Homem pelas mesmas razões, embora aceite aquela formulação, mas não há dúvida de que a raiz que deu origem a esta afirmação dos Direitos do Homem depois da II Guerra Mundial, é uma raiz cristã. É um entendimento cristão da humanidade e da sociedade.
"Se na Europa desaparecessem as obras de caridade promovidas pelos católicos, em cada um dos países, o mapa seria drástico, trágico mesmo"
Quando terminou o segundo mandato como secretário do CCEE deixou uma nota otimista de esperança, ao dizer que há uma vida eclesial forte na Europa. Teve oportunidade de contactar com diversas realidades, sobretudo no Leste, que muitos desconhecem. Sente mesmo que há essa esperança, capaz de dar um sinal diferente para a Europa de hoje?
Julgo que a esperança virá do que podemos chamar de comunidades vivas, que podem não ser maioritárias, mas são vivas e coesas. É interessante ver que há, por toda a Europa, norte ou sul, desde a Noruega a Malta, da Moldávia à Irlanda, há vida cristã viva. Talvez não sejam já as maiorias, talvez haja crise, muitos conflitos e problemas, mas há lugares onde esta experiência é viva, gente a converter-se, pessoas a pedirem o batismo, comunidades a serem construídas. E há estas raízes, gente a querer ter uma vida interior e espiritual cristã, que não é simplesmente o "New Age" à procura de um vazio para descansar, mas que é procura de Deus para o encontrar, a procura da verdade e do encontro com Deus, a experiência em presença de Deus, aquilo que é o específico da espiritualidade cristã.
Há comunidade coesas de amigos, amizades, de apoios entre famílias, há obras de caridade e misericórdia que são muito visíveis. Bastaria imaginar que se na Europa desaparecessem as obras de caridade promovidas pelos católicos, em cada um dos países, o mapa seria drástico, trágico mesmo. Por isso, há muitas experiências vivas e bonitas, assim como há muitos jovens, famílias e políticos até… talvez gostássemos que fossem mais, mas há alguns que pensam e querem pensar o bem comum e cuidar da pessoa, defender a vida. Por isso, não é uma experiência morta, antes pelo contrário. Pode ser uma mudança.
O "New age" de que se fala também revela que as pessoas procuram a dimensão espiritual. A Igreja Católica, se calhar, nem sempre consegue responder a esse desejo e procura?
Há uma procura do religioso na Europa. As sondagens do Eurostat indicam isso claramente, que os europeus, ao contrário do que talvez se tivesse pensado nos anos 60, não se secularizaram, no sentido de considerarem a dimensão religiosa, ou a sua relação com o transcendente, completamente inútil. Mas, não há dúvida de que a experiência religiosa cristã - que não é simplesmente a experiência de um encontro com o transcendente, mas com Jesus Cristo -, essa experiência, que era maioritária num ambiente que chamávamos de Cristandade, hoje já não é maioritária, mas não deixa de ser verdadeira e de existir.
"A Europa cristã olha para cada pessoa, migrante, refugiado, como uma pessoa, e por isso tem de equilibrar as duas coisas: a coesão social e o acolhimento do outro"
Há um tema que tem gerado tensão que é o das migrações e dos refugiados. Conhece muita da realidade europeia, porque teve a oportunidade de percorrer os vários países. Há várias tensões até na forma como as diferentes comunidades católicas olham para esta realidade?
Há, e é preciso reconhecer isso, sem pretender que todos façam o mesmo, porque de facto as realidades e experiências são diferentes. Há, por vezes, uma certa demagogia da comunicação social, uma não compreensão, um não ir ao fundo das razões, que colocam nos títulos ‘bispo do país A contra bispo do país B’, e as coisas são mais profundas...
Julgo que há uma ideia generalizada na Europa de que existe necessidade de criar uma certa coesão e identidade, e que vivemos em tempos de grande desagregação social e de falta de coesão. O tema da coesão social é dos que mais ouvi falar ao longo destes anos, e isso, não há dúvida que interfere com a questão dos migrantes.
Mas, depois a Europa cristã olha para cada pessoa, migrante, refugiado, como uma pessoa, e por isso tem de equilibrar as duas coisas: a coesão social e o acolhimento do outro.
O que a Igreja tem dito, em geral, desde os Papas aos bispos, deste ou daquele país, é que as duas coisas têm de estar unidas. Os imigrantes não podem entrar num ambiente desagregado. Mas, isso não significa que não podem entrar, significa que temos de tomar consciência do que está a acontecer à Europa. Esta falta de identidade e coesão social, falta de amor à vida e à tal esperança que falava no início, faz com que as pessoas vivam egoisticamente, fechadas em si.
Não é tanto dizer que podem entrar mais ou menos imigrantes, mas o que podemos fazer para que a Europa não se sinta ameaçada pela chegada dos imigrantes, antes pelo contrário, se sinta chamada e ajudada. Porque há muitos lugares onde os imigrantes não só são ajuda porque são mão de obra, mas são ajuda porque são esperança, porque trazem juventude. Mesmo na Igreja há muitos locais pela Europa fora onde as comunidades imigrantes – e não só imigrantes europeus, mas da América Latina, africanos e de comunidade asiáticas - são muito vivas, e dão uma vitalidade à Igreja local.
Por isso, a experiência da chegada de imigrantes e de refugiados, além de provocar a caridade dos que recebem, também desafia a uma certa consciência de quem somos, que identidade temos e qual é a nossa verdade. Agora, às vezes estas coisas são um bocadinho teóricas: uma coisa é entrar um imigrante na Alemanha, onde há muito dinheiro e pode ser integrado, outra coisa é entrar na Hungria, onde há pouco dinheiro e não há integração. Uma coisa é um bairro de imigrantes refugiados, que são acolhidos e quase há uma cidade à margem das grandes cidades, onde eles têm tudo, escolas, onde são selecionados e integrados com entrevistas individuais. Outra coisa é em países mais pobres, onde não há essas infraestruturas e, de repente, ficam todos ali.
Há desigualdade na forma como a Europa é solidária, uns países em relação aos outros, na forma como se acolhe os refugiados. Também devia haver mais atenção aos países de origem, onde está a raiz do problema?
Essa é a posição que, em geral, os bispos da Europa têm defendido. Além de provocar um ambiente acolhedor - que, como eu dizia, precisa de ser coeso, precisamos de cuidar da nossa comunidade para poder acolher melhor, e não é uma alternativa, ou cuidados da comunidade ou acolhemos, as duas coisas podem estar em simultâneo -, mas, além disso, olhando para as pessoas concretas que vêm, sobretudo para os refugiados que chegam desesperados, somos chamados a ter atenção que é preciso desenvolver os outros países. E aí perguntamo-nos: quem é que governa a nossa Europa? São interesses económicos? São pessoas que querem o desenvolvimento do mundo e das pessoas? Quais os interesses? Porque é que não se empenham mais em desenvolver os países mais pobres? Porque é que continua a haver tanta venda de armas, uma certa hipocrisia nas atitudes para com os países em guerra?
Estas questões deviam fazer-nos refletir, agora que estamos à beira de eleições europeias. Afinal, o que queremos é uma Europa que se sente com uma missão para o mundo (as tais raízes cristãs que falava)? Somos capazes de levar a nossa consciência da dignidade da pessoa, da paz, do amor e da solidariedade aos outros países? Ou desprezamos?
É incontornável que as migrações são um dos principais problemas da Europa. Não acha que na campanha eleitoral se está a falar pouco disto?
Depende de país para país.
Em Portugal, em concreto?
Em Portugal, somos um país acolhedor, os imigrantes são bem-vindos, mas não querem vir muitos.
E dos que vêm, muitos não ficam…
Muitos não ficam, mas nós estaríamos dispostos a receber mais. Nesse sentido somos um país simpático, acolhedor. Quem fica sem vontade de se ir embora, até acaba por agradecer, há casos bonitos disso. Por isso, não estranho que em Portugal não se fale muito deste problema. Não é um problema grave.
Mas há notícias de que o Governo português não tem aproveitado os fundos comunitários que têm sido enviados para acolher as migrações. Parece que há um desinteresse por este tema?
É muito complexo. Não sei o que se passa a nível político, nos bastidores. Não sabemos tudo. Mas, tenho pena, porque vejo na sociedade, e na Igreja em Portugal, uma grande vontade, disponibilidade e empenho para acolher e fazer mais, para promover.
Organizei alguns encontros com responsáveis da Pastoral dos Migrantes, pela Europa fora, e a experiência portuguesa era muitas vezes apresentada por outros, e reconhecida, como uma experiência piloto de cooperação entre a sociedade e a Igreja. Por isso, se me diz que o Estado não está a aproveitar os fundos que poderia ter para fazer mais, eu diria que tenho pena disso. Agora, porque não o faz? Quais os interesses que estão por detrás? Não sei.
Como pároco de Santa Joana Princesa, em Lisboa, mantém o seu olhar atento sobre a Europa, e organizou um ciclo de debates "Europa? Qual Europa", neste tempo de preparação para as eleições. É importante que a Igreja tenha iniciativas como esta, para debater questões que vão para além da espuma dos dias?
Muito povo de Deus, muitos portugueses, têm solicitado que falemos da Europa e estão preocupados e conscientes da importância do que acontece na Europa, sabem que tem reflexo na vida em Portugal. Mas, não se percebem todos os porquês e os mecanismos, e as pessoas querem perceber mais. Era ótimo que a campanha eleitoral, em vez de debater questões muito internas, nos ajudasse a perceber o funcionamento da Europa.
Porque são eleições europeias…
E não só como é que funciona a estrutura, mas também quais as políticas comuns, os objetivos, as propostas, como pensamos a integração.
A Europa, o Papa Francisco diz muitas vezes, é uma ‘família de povos’, e é importante que se mantenha assim. Ele fala da multipolaridade, são vários povos, não é uma Europa que tem de olhar toda para uma direção, mas podemos ter diferenças, e isso é uma riqueza para a Europa. Como é que estes povos, que são diferentes, têm coisas comuns, como as raízes cristãs, e têm destinos comuns, porque estamos num mundo globalizado, e se os países europeus não estiverem unidos, acabam absorvidos por uma cultura dominante, que não é libertadora, mas antes limitadora.
Mas, para voltar à questão: era bom que conseguíssemos perceber melhor - e foi isso que me levou a propor um ciclo de conferências – as partes económicas, políticas, mas também as que não sendo da competência direta da União Europeia são muito marcantes na União, como as ideologias, as questões da vida e da família. Os ‘lobbies’ ideológicos em Bruxelas funcionam de maneira organizada, até reconhecida, não é sequer uma acusação que eu esteja a fazer, é algo reconhecido.
Mas, esta é uma batalha que existe e a Igreja está presente nessas batalhas com uma proposta, não de grupo de interesses, mas como representante da sociedade geral, com uma proposta de valores sociais. Mas, este género de questões, precisamos de as perceber, os seus mecanismos, ou pelo menos começar a perceber. Há mais de 30 mil funcionários da União Europeia em Bruxelas, não podemos perceber tudo o que cada um faz.
Os bispos portugueses aprovaram a Carta Pastoral "Um olhar sobre Portugal e a Europa à luz da Doutrina Social da Igreja", na qual, entre outras questões, se manifestam muito preocupados com o crescimento da xenofobia, os movimentos de desagregação que ameaçam a coesão da Europa. São alertas importantes feitos pela Igreja, ainda mais em tempo de eleições?
A Carta está muito interessante, porque começa pelas questões da vida, da existência da vida e da dignidade da vida humana, para a forma como a vida humana vive e, depois, para a organização da sociedade onde essa vida humana se desenvolve. E portanto, os movimentos populistas ou xenófobos, assim como os movimentos ideológicos do ‘gender’ (género), ou mais complicados, como aquilo a que chamo a ‘homologação’ - esta tentativa de homogeneizar toda a realidade, pensarmos todos da mesma maneira, termos todos os mesmos interesses, sermos todos forçados a seguir a ‘cartilha’ ideológica vigente -, é um problema que a Europa atravessa.
O problema dos populismos que desagregam, identitários em excesso, e os problemas mais globalistas ou internacionalistas, que tentam dissolver as identidades, são dois pólos que se promovem uns aos outros, paradoxalmente. Porque quanto mais existe alguém a dizer ‘temos de fazer uma Europa completamente unida’, uns Estados Unidos da Europa, aparecem outros a dizer ‘temos que nos separar, para não haver esse perigo’. Quanto mais aparecem uns a dizer ‘temos de viver em tensão uns com os outros’, mais aparecem outros a dizer o contrário…
A Europa, a inteligência católica com que esta União Europeia foi pensada, era a capacidade de cada um ser mais ele mesmo, na medida em que é mais com os outros. Não é uma oposição ‘ser com’ e ‘ser eu’, porque esta é a experiência do amor, é a lógica da solidariedade, em que o país ganha por poder ajudar, porque no todo somos desenvolvidos, desenvolvemo-nos.
A Europa está visivelmente envelhecida, a vários níveis. A Igreja católica tem procurado que os jovens se sintam cada vez mais empenhados e tenham voz ativa, até na vida política. De que forma uma renovação de lideranças, inspirada nos valores que acabou de referir, pode ser importante para combater esses perigos na União Europeia?
Temos esperança, quer dizer… a Igreja na Europa tem tentado enfrentar a questão do envelhecimento em duas formas: uma é valorizando o idoso enquanto tal, a pessoa na sua dignidade até ao fim da dia, até último respiro queremos lá estar perto. A pessoa tem esse valor, e não lhe queremos retirar esse valor, nem acelerar a morte, porque ela vale.
A outra dimensão é dizer: a Europa não pode ser só envelhecida. A riqueza dos que viveram mais anos é também a possibilidade de passarem o testemunho a outros, e então queremos ter jovens que possam receber o testemunho – e o Papa fala muitas vezes da relação entre avós e netos como importante –, para que estes jovens possam pegar nas rédeas dos destinos do mundo com valores, que não só herdam, mas que desenvolvem. Não é uma herança fossilizada e pronta, mas é herdar algo vivo, que depois se desenvolve. E é isso que faz com que haja propostas novas e criativas. O Papa também diz que é muito importante a criatividade na Europa, haver uma ‘Europa fecunda e criativa’, como afirmou no Conselho da Europa. E é possível haver, mas não vai ser fácil.
Agora, os jovens políticos nos vários países, na Europa, vão ter de ser pessoas bem formadas e que vivam em alguma experiência comunitária, não podem ser uns ‘Robin Hood’ que vão salvar o mundo. Tem de haver, de facto, gente, grupos de reflexão, que sejam movidos pelo amor, e não só por um jogo de interesse, ou por um combate, mas sejam movidos pela tentativa, através do diálogo e da promoção do bem, e consigam melhorar as coisas.
Há uma nova geração começa a nascer que já não é tão anticatólica como a anterior, até porque o catolicismo não tem a expressão pública que tinha, e já não faz sentido em alguns países da Europa ser-se anticatólico. Faz sentido é procurar saber o que se perdeu pelo caminho, as tais raízes e valores, os tais ideais e esperanças, que se a Europa não tiver, e os jovens europeus não tiverem, também não se constrói.