01 out, 2019 - 07:35 • Olímpia Mairos
Não há em Machico, cidade na costa leste da ilha da Madeira, quem não conheça o “padre Tolentino”. O arcebispo, bibliotecário e arquivista da Santa Sé, nasceu ali, a 15 de dezembro de 1965. Depois, partiu com a família para o Lobito, Angola, onde viveu até aos 11 anos. Regressou à Madeira em 1976, na ponte aérea que trazia os retornados.
“O padre Tolentino, agora já arcebispo - pode dizer lá na Renascença - é um grande homem. Eu tenho um filho que andou aqui, no seminário, aqui, na Madeira, até ao 5.º ano com ele. Conheço-o bem”, conta António, do alto dos seus mais de 80 anos.
Sentado com mais dois amigos num banco de madeira, em frente à igreja matriz, o octogenário prossegue: “O pai dele foi pescador e o meu pai também”. Daí, tira a conclusão: “De pobrezinho também se chega a grande."
E é com orgulho que António conta que “quando o homem foi ordenado padre”, e porque o seu filho “estava lá, no continente, no Porto, ele convidou-me a mim, no lugar do meu filho”. “Foi uma festa muito bonita. Um orgulho para Machico. E é um orgulho maior ainda, agora, vê-lo cardeal”, diz.
João Gomes, que está sentado ao lado de António, entra na conversa para acrescentar que “é muito importante para a terra de Machico o padre Tolentino ser cardeal, porque é uma pessoa que fica presente na história da terra”.
“Conheço-o bem. Ele também me conhece. Já falei com ele algumas vezes e gosto muito, porque é uma pessoa muito simpática e muito inteligente”, diz João.
Também José António Correia, de 66 anos, aposentado da empresa de eletricidade da Madeira, descreve o novo cardeal como “um homem simples, muito humilde e superinteligente”.
“Conheço-o muito bem, ou seja, há umas décadas. É uma pessoa que sempre nos marcou pela positiva. Gostamos muito dele e esperamos que tenha muito sucesso, porque isso também trará resultados positivos para a religião católica”, declara.
José Correia recorda com alegria as “grandes conversas, mesmo sendo pequenas, porque muito úteis e altamente positivas” com D. Tolentino Mendonça.
“E de que conversam?” Perguntamos.
“Conversamos sobre coisas importantes, a vida do país, sobre o bem-estar das pessoas, sobre aquilo que as pessoas devem lutar para conseguirem obter. O futuro cardeal é uma pessoa que nos ajuda muito, clarifica-nos, esclarece-nos”, confidencia à Renascença. E é por isso, e não só, que José Correia considera que “para Machico é um orgulho ele ser cardeal”.
“É muito bom, merece-o totalmente. Tolentino Mendonça fica no lugar que merece e de grande destaque e com mérito próprio”, conclui, não sem antes defender que a cidade deve “dedicar-lhe o nome de uma rua ou erguer-lhe uma estátua”.
Junto à ribeira de Machico encontramos Eugénia. Vem com mais duas amigas em amena conversa. Interrompemos o diálogo e o passeio e perguntamos se conheciam D. Tolentino Mendonça.
“Quem não conhece o padre Tolentino?”, começa por questionar Eugénia, para afirmar que “é um filho da terra que em breve será cardeal”. “É um grande orgulho para a nossa Madeira, porque, apesar de ser pequena e de ter poucas pessoas como ele, ser ele o primeiro da nossa terra a ser cardeal, é de louvar a Deus”, acrescenta.
Eugénia conta à Renascença que participou na missa nova do padre Tolentino. E apesar de já terem passado uns bons anos, foi em 1990, recorda-se como se fosse hoje.
“Ouvi a primeira homília, gostei muito das palavras que disse. E eu disse para mim ‘este vai ser um grande homem’, porque as palavras foram poucas, mas muito sábias”, conta, acrescentando que o novo cardeal “fala muito bem e é daquelas pessoas que vai visitar os presos, vai visitar os doentes aos hospitais, é uma pessoa que passa por qualquer um e é como se fosse sempre um amigo”.
“Pessoa simples, humilde, simpática e afável, o padre Tolentino não olha para o rico nem para o pobre, não faz diferença de classes”, afirma Eugénia que gostava muito de ir a Roma, à criação do novo cardeal, mas não pode.
“Estarei unida e se der na televisão - deve dar - vou ver desde o princípio ao fim, porque ele é uma pessoa muito querida da nossa terra e o Papa Francisco soube muito bem escolher”, conclui, afastando-se em passo apressado.
Do grupo de amigas faz parte Maria Carmelita Ornelas, de 56 anos. Sorridente entra na conversa e apresenta-se como familiar do novo cardeal. “Tenho muito orgulho em ter aquele primo. Ele é um orgulho para nós e para os madeirenses e não tenho palavras para descrever o orgulho por o ver cardeal”, diz, por entre sorrisos.
Do primo destaca a simplicidade e a humildade. Características que, diz, guarda desde pequeno. “É uma pessoa simples, humilde, muito humilde. E vai continuar a sê-lo, porque sempre foi assim”, afirma.
Carmelita não esteve na ordenação sacerdotal nem na missa nova do primo, porque estava emigrada, mas lembra-se que a mãe “andou muito empenhada a pedir aqui e ali, para ajudar em alguma coisa”.
D. José Tolentino Mendonça nasceu no Machico, em 1965, e foi ordenado padre em 1990. Além de arcebispo, é poeta, ensaísta e tradutor e foi vice-reitor da Universidade Católica Portuguesa, até à sua nomeação episcopal, em 26 de junho de 2018.
Doutorado em Teologia Bíblica, foi condecorado, em 2015, com o grau de Comendador da Ordem de Sant’lago da Espada pelo então Presidente da República Cavaco Silva.
Em 2018, D. Tolentino Mendonça orientou o retiro quaresmal que o Papa Francisco cumpriu em Ariccia, nos arredores de Roma. Vai ser criado cardeal no consistório marcado para sábado, 5 de outubro.
O também bibliotecário e arquivista da Santa Sé junta-se aos outros atuais cardeais portugueses, D. José Saraiva Martins, D. Manuel Monteiro de Castro, D. Manuel Clemente e D. António Marto, os dois últimos com direito de voto num eventual conclave para a eleição do Papa, tal como sucederá com D. Tolentino Mendonça.