09 jan, 2020 - 10:55 • Ana Catarina André
O Papa Francisco considera “particularmente preocupantes” os sinais que chegam do Médio Oriente, “após a recrudescência da tensão entre o Irão e os Estados Unidos que se arrisca, antes de tudo, a colocar à prova o lento processo de reconstrução do Iraque e a criar as bases dum conflito de uma escala mais ampla”.
Na audiência aos membros do corpo diplomático dos 183 países com acreditação na Santa Sé, o Papa voltou a apelar à paz.
“Renovo o meu apelo a todas as partes interessadas para que evitem um agravamento do conflito e mantenham acesa a chama do diálogo e do autocontrolo, no pleno respeito da legalidade internacional”, disse.
Num ano que surge “não tanto com sinais encorajadores, mas antes com uma intensificação de tensões e violências”, Francisco recordou a Terra Santa, lembrando à “comunidade internacional inteira a urgência de confirmar, com coragem, sinceridade e no respeito pelo direito internacional, o seu compromisso e apoio ao processo de paz entre Israel e a Palestina”, assim como à Síria, envolta numa “cortina de silêncio que corre o risco de encobrir a guerra”.
“Penso ainda no Iémen, que vive uma das mais graves crises humanitárias da história recente, num clima de indiferença geral da comunidade internacional, e na Líbia, que há muitos anos vive uma situação conflituosa, agravada pelas incursões de grupos extremistas e por uma nova escalada de violência nos últimos dias”, disse.
Francisco lembrou também a Venezuela, “para que não esmoreça o empenho na busca de soluções”.
“Os líderes políticos devem esforçar-se por restabelecer, urgentemente, uma cultura do diálogo em prol do bem comum e por fortalecer as instituições democráticas e promover o respeito pelo estado de direito, a fim de prevenir deslizes antidemocráticos, populistas e extremistas”, destacou.
Num discurso em que recordou as viagens que fez em 2019, e em que renovou a sua intenção de visitar este ano o Sudão do Sul, o Papa abordou a questão do abuso sexual de menores a propósito da viagem ao Panamá por ocasião da Jornada Mundial da Juventude.
“Poder encontrar os jovens é sempre uma alegria e uma grande oportunidade. E todavia, como é tristemente sabido, não poucos adultos, incluindo vários membros do clero, tornaram-se responsáveis de delitos gravíssimos contra a [sua] dignidade”, constatou, sublinhando “o empenho da Santa Sé para que se descubram os abusos cometidos e se garanta a proteção dos menores”.
Estratégias para continente africano
Recordando a sua viagem ao continente africano, o Papa recordou ter visto “esperança onde apenas se sente fatalidade”. E falando sobre a violência que se sente em países como Burkina Faso, Mali, Níger e Nigéria, exortou a comunidade internacional “a apoiar os esforços que estes países estão a fazer na luta para derrotar o flagelo do terrorismo”.
“À luz destes acontecimentos, é necessário que se implementem estratégias que incluam intervenções não só no campo da segurança, mas também na redução da pobreza, na melhoria do sistema de saúde, no desenvolvimento e na assistência humanitária, na promoção da boa governança e dos direitos civis”, defendeu.
O Papa alertou ainda para a inexistência de uma resposta internacional coerente em relação aos deslocados internos: “O resultado é que nem sempre recebem a proteção que merecem e dependem da capacidade de resposta e das políticas do Estado onde se encontram”.
Francisco condenou também o recurso às armas nucleares, que “fomentam um clima de medo, desconfiança e hostilidade”. “Um mundo sem armas nucleares é possível e necessário”, frisou.
E, sublinhando o “espírito de solidariedade que, há séculos, caracteriza a Europa”, afirmou que “o projeto europeu continua a ser uma garantia fundamental de desenvolvimento para quem faz parte dele há algum tempo e uma oportunidade de paz, depois de turbulentos conflitos e lacerações”.
Lembrando o 75.º aniversário da fundação das Nações Unidas, recordou os princípios da organização – o desejo de paz, a procura da justiça, o respeito pela dignidade humana, a cooperação humanitária e a assistência – como “ideais que devem guiar as relações internacionais”.