02 mar, 2020 - 16:36 • Ângela Roque
Intitulado "Acesso aos serviços por grupos vulneráveis: barreiras, obstáculos e boas práticas", o mais recente relatório da Cáritas analisa a forma como os principais direitos sociais estão, ou não, acessíveis a quem mais deles precisa. A análise faz parte do projeto europeu "Cáritas Cares", que avaliou a situação em 16 países.
Para contextualizar a análise e os resultados obtidos, o documento começa por sublinhar que Portugal “é um país em rápido envelhecimento”. Entre 2009 e 2018 “a população diminuiu 2,6%”, enquanto o número de crianças baixou para 12,7% e o de idosos aumentou 16,6%, sendo que a população acima dos 85 anos subiu 51,4%. E lembra que, apesar dos dados sobre a pobreza e a exclusão social continuarem a baixar, Portugal continua com uma elevada taxa de pobreza no trabalho -- em 2017 havia ainda 13,3% de trabalhadores em risco de exclusão e 4% estavam em “grave privação material”.
Diagnóstico
Segundo o relatório, que será apresentado na terça-feira de manhã, “todos os direitos sociais foram avaliados como não sendo totalmente acessíveis, particularmente pelos grupos mais vulneráveis da população”, que incluem quem tem mais idade, mas também crianças, jovens, pessoas sem abrigo, portadores de deficiência, minorias étnicas, requerentes de asilo e refugiados. Todos eles, garante o documento, “enfrentam barreiras e obstáculos consideráveis”, sendo que no geral a qualidade dos serviços foi classificada como “muito baixa”.
A habitação é o indicador mais problemático, e foi o que teve a pior classificação (1 em 5), seguido da educação e dos cuidados de primeira infância (2 em 5). “O acesso à habitação piorou” e “as famílias vulneráveis têm dificuldade em comprar ou arrendar uma casa devido ao aumento dos preços”, indica o relatório, que fala mesmo numa situação “descontrolada”.
A situação também se agravou relativamente ao acesso a creches públicas, uma área fundamental para as famílias. “A garantia de assistência infantil (0 aos 3 anos) é alta”, mas segundo o relatório há uma “incompatibilidade entre a oferta e a procura”, sobretudo nas áreas metropolitanas de Lisboa e do Porto.
“Os serviços públicos de emprego ainda são ineficazes no combate ao desemprego de longa duração”, conclui o documento, que fala nas dificuldades que os “migrantes e requerentes de asilo” têm para aceder “à regularização, emprego, habitação, assistência à saúde”, e diz que apesar dos serviços de aconselhamento serem “prestados principalmente por ONG’s”, não há “apoio financeiro ou estrutural suficiente do governo para desenvolver estas atividades”.
Recomendações
O relatório apresenta cinco recomendações da Cáritas ao governo, sendo que a primeira é sobre a necessidade de se “promover níveis salariais decentes” e “ampliar a garantia de proteção social em caso de desemprego”. A instituição católica diz que é preciso que haja “habitação acessível e controlar os preços de venda, compra e arrendamento para os mais vulneráveis”, e ter creches com preços que permitam que “pais e famílias tenham acesso a este serviço”.
“Apoiar a descentralização” e “o envolvimento dos atores locais na integração de migrantes e requerentes de asilo”, e alargar os serviços sociais” que existem, melhorando “o apoio financeiro e a capacitação das organizações sociais no terreno”, são outras das recomendações.
O relatório nacional “Cáritas Cares” vai ser apresentado esta terça-feira pela Cáritas Portuguesa, com a participação de Shannon Pfohman, da Cáritas Europa, e de Manuel Carvalho da Silva, do Centro de Estudos Sociais. Como exemplo de boas práticas será apresentado o projeto MakeBraga, pela Cáritas Diocesana de Braga.
Esta apresentação antecipa a Semana Nacional da Cáritas, que começa no próximo domingo, e que incluirá o habitual peditório público, que vai decorrer de 12 a 15 de março.