09 abr, 2020 - 15:05 • Henrique Cunha
“A pandemia acentuou o sentimento de abandono”, diz à Renascença o bispo de Lamego, D. António Couto.
“Nós, aqui, nesta interioridade do nosso país, já nos sentíamos há muito tempo abandonados pela política central, não tenho qualquer ilusão”, afirma D. António Couto, lembrando as dificuldades por que passam muitos dos lares da diocese.
“Há crises sérias, por exemplo, em Resende, em Castro Daire e em Foz Côa. Existem problemas sérios”, diz o bispo, perguntando, retoricamente: "Como é que a gente resolve isto?.
"Não temos grandes apoios, grandes meios técnicos vindos de fora. O que temos é voluntários para ajudar nestas circunstâncias, o melhor que podem e sabem”, desabafa.
D. António Couto diz que ao interior tudo chega com grandes dificuldades. Nas palavras do bispo, “o problema é sempre saber que estamos no interior e que os testes aqui chegam com muita dificuldade e que, porventura, serão desviados para outras metrópoles, mais no litoral.”
“Nós sentimos que o nosso interior continua a ser interior”, afirma D. António, para quem “felizmente, não têm havido muito casos” de Covid-19, porque “senão, seria a completa desgraça”.
Para o bispo de Lamego, a crise deve ajudar a perceber que “não é a economia que está em causa” com esta pandemia”, mas sim “a humanidade”. Faz, por isso, um apelo ao despertar dos que pensam a sociedade e que, em sua opinião, têm vivido “anestesiados”.
“Esta sociedade apodrecida, adormecida, anestesiada e muito medicada em que nós estamos tem de olhar com um coração diferente para este tempo”, defende.
"Não são só os velhinhos, por estarem doentes, que estão medicados”, mas “os que decidem também estão muito medicados e anestesiados”. E “é por isso que nem sempre sentem estas situações”.
"Esta é a altura em que isto tem de entrar em carne viva nas pessoas, nos que têm as soluções e tomam as decisões”, sentencia.
Lembrando que na história da humanidade nunca se terá vivido uma situação como a atual, em que o mundo inteiro está praticamente parado e fechado, D. António Couto defende que para os cristãos, os lugares de culto não são o fundamental. “No livro do Êxodo, quando Deus manda a Moisés construir um santuário, é para Ele, Deus, vir viver no meio do povo”, e “viver no meio do povo para Deus é o mais importante”, pois “o santuário é apenas um meio”.
“Talvez neste tempo e nesta Páscoa nós compreendamos melhor que os meios são apenas meios e as pessoas é que são o coração de Deus, estão no coração de Deus e é aí que Cristo ressuscitado habita também”, sublinha o bispo de Lamego.