10 mai, 2020 - 08:13 • Olímpia Mairos
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“É doloroso, muito doloroso, não estar a caminho de Fátima”. As palavras são de Amélia Afonso, de 60 anos, que decidiu não fazer a peregrinação à Cova da Iria, interrompendo assim uma prática de 40 anos. A decisão envolveu “muita dor, angústia e uma grande tristeza, mas teve que ser, para não pôr em risco a minha saúde e a dos outros”, conta à Renascença.
O motivo que tem levado Amélia todos os anos ao Santuário de Fátima é apenas um: gratidão. E é com esse mesmo sentimento que vai acompanhar todas as celebrações à distância. “Tenho tanto para agradecer, tanto, pois nunca me tem faltado na vida e por isso não vou perder as transmissões na Renascença”, confidencia, realçando que “a rádio permite ver o que a televisão não mostra”.
Como assim? Perguntamos. Com um sorriso, responde: “fecho os olhos, entro no coração onde está Nossa Senhora e rezo sem distrações”.
Para esta engenheira de Lamego, habituada a tirar férias para ir a Fátima, não é fácil renunciar e ficar em casa, mas sublinha que “também esta dor pode e deve ser oferecida”. “Nossa Senhora sabe bem as lágrimas que tenho derramado e acredito que ela as acolhe no seu regaço e as converterá em bem para alguém”, diz.
Com tudo preparado para mais uma peregrinação a pé à Cova da Iria, Noémia dos Anjos não esconde a “desilusão por não poder cumprir o desejo”, no entanto, sublinha que “foi a melhor decisão que tomaram”.
“Não podemos correr riscos, este vírus é traiçoeiro e o caminho implica muito contacto uns com os outros quer nas caminhadas, quer nas refeições e até no descanso”, refere a assistente operacional de Vila Real.
Noémia dos Anjos não vai a pé, mas está a seguir a sugestão do Santuário de Fátima e está por estes dias a fazer a sua peregrinação interior.
“Tenho rezado mais e tenho oferecido esta dor e posso dizer-lhe que peregrinar com o coração, como aconselhou o senhor reitor do santuário, é mais doloroso do que palmilhar o caminho”, conta. A dor resulta, explica, “por não poder agradecer, olhos nos olhos, a Nossa Senhora as muitas graças que me tem alcançado”.
Luís Correia, de Vila Real, não esconde a tristeza. Tinha tudo programado para a sua quarta peregrinação a Fátima, com um grupo de 60 pessoas.
“É algo que não se consegue explicar muito bem. Fisicamente custa, são sete dias a pé, muitas horas a caminhar, pouco descanso, mas é a coisa que mais gosto de fazer”, conta à Renascença, acrescentando que “preferia fazer a peregrinação a Fátima que ir de férias”.
“O que me leva a ir à pé a Fátima, em peregrinação, é a fé e o agradecimento a nossa Senhora”, afirma, dando nota da “tristeza imensa”, quando recebeu a notícia de que tudo estava cancelado.
O grupo teria iniciado a caminhada no passado dia 4 de maio, e este domingo deveria estar a ser realizado o percurso entre Pombal e Fátima. “Não ir à Fátima, este ano, é como se um vazio esteja por preencher, uma dor na alma, uma tristeza imensa”, descreve Luís, antecipando já a tristeza que vai ser viver pela televisão o 12 e o 13 de maio”.
“Aquela sensação ao entrar no Santuário, a última etapa que estaríamos agora a cumprir, é algo que não dá para descrever... É a coisa mais incrível que pode haver”, testemunha, completando que “outro ponto forte é a procissão de velas do dia 12 de maio”.
Também para Fernando Moura, presidente da Associação de Peregrinos Flavienses, peregrino de Fátima há 16 anos, é “uma grande tristeza e uma saudade imensa” não realizar o caminho até à Cova da Iria.
A Associação de Peregrinos Flavienses à qual preside, já tinha tudo preparado e o grupo de 52 pessoas teria arrancado na madrugada de 2 de maio, rumo a Fátima. Nesse mesmo dia, como não se puderam fazer ao caminho, na sede da associação, num gesto simbólico, acenderam uma vela junto à imagem de Nossa Senhora.
O grupo de peregrinos mantém-se ligado por WhatsApp e “todos os dias e todos unidos” revivem e partilham as experiências passadas. “É uma peregrinação diferente, mas não deixa de ser uma peregrinação, embora virtual, em que vamos assinalando as várias paragens e etapas. Revivemos orações, refeições, convívios, alegrias e dificuldades. Hoje, por exemplo, estaríamos a chegar a Pombal”, conta à Renascença.
O peregrino Fernando começou por ir a Fátima em promessa, mas já há vários anos que o faz “simplesmente para agradecer a Nossa Senhora de Fátima o ano que passou”. Compreende a decisão do santuário, em vedar as cerimónias aos peregrinos para a evitar a propagação da Covid-19, e acalenta a esperança de realizar a sua 17ª peregrinação ainda este ano.
“Estamos a pensar, se isto melhorar, em ir lá em setembro ou outubro. Não queremos complicar a vida a ninguém, queremos ir em segurança, mas acalentamos essa esperança porque é muito doloroso não ir a pé a Fátima”.
Também o grupo Além Rio, de Vila Real, tinha tudo preparado para mais uma peregrinação que este ano já não vai concretizar. Henrique Silva conta que seriam “60 pessoas, algumas que vinham de propósito do estrangeiro para fazerem o caminho connosco”, para sublinhar a “dor e a tristeza que significou o cancelamento”.
O grupo estava a fazer a preparação com percursos semanais de 15 a 40 quilómetros. A última caminhada aconteceu no dia 8 de março, quando decidiram cancelar a peregrinação, ao perceberem que “não havia condições de segurança para realizar o caminho”.
“Pela nossa saúde e pela saúde dos outros, foi a melhor decisão que tomaram”, afirma Henrique, referindo-se à decisão do Santuário de Fátima em realizar as cerimónias de 12 e 13 de maio sem fiéis.
Para Henrique, que vai a Fátima há 17 anos seguidos, este ano já “não há qualquer hipótese de fazer o caminho”, apesar de “muitos elementos do grupo terem sugerido ir em outubro”.
De acordo com uma fonte da GNR de Vila Real, não foram vistos por estes dias peregrinos nas estradas deste território e foram vários os grupos organizados que informaram aquela força de segurança de que este ano, devido à Covid-19, não realizariam as habituais peregrinações a Fátima.
13 de Maio
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