14 jul, 2020 - 13:07 • Marisa Gonçalves
O atendimento faz-se por ordem de chegada e cada vez chegam mais pessoas à Paróquia de São José da Nazaré, no Catujal, freguesia de Unhos, concelho de Loures. É uma das 19 freguesias em situação de calamidade, na Grande Lisboa.
À porta, a fila compõe-se, essencialmente, por jovens mães, desempregados e idosos. Rostos diferentes, vidas diferentes, mas todos procuram o apoio alimentar.
“Eu venho por causa da pandemia. Começou quando eu tinha acabado de ter um menino. O meu marido trabalha de vez em quando e eu já estava em casa sem trabalho. Agora, está mais difícil”, conta à reportagem da Renascença, uma das paroquianas.
Ao lado, outra diz que está sozinha, com dois filhos e com mais despesas para pagar. “Ganho o ordenado mínimo, mas não chega. Tenho um adolescente com 11 anos em casa, que come de manhã à noite, e tenho outra filha, com 18, que já esteve em 'lay-off'. Não sei até quando é que o ordenado vai batendo."
Verdade é que pouco se sabe, do futuro, por estes dias. Sabe-se, sim, que os pedidos de ajuda não vão parar.
Paula Magalhães, responsável pela área social na Paróquia de São José da Nazaré, recolhe, um a um, os cartões dos titulares dos agregados familiares. A cada cartão corresponde uma avaliação já feita com a Segurança Social, no caso das famílias referenciadas. Hoje, chegam novos pedidos.
“Estamos a receber uma média de 10 a 12 por semana. Já temos marcações até final de agosto. Temos inclusivamente famílias que, no passado, faziam parte daquele leque que pessoas da nossa sociedade que apoiava a paróquia com dinheiro ou alimentos e agora estão aqui”, revela.
O salão, onde até há uns meses decorria a catequese, está agora transformado em espaço de preparação dos cabazes, com a ajuda de cerca de 15 voluntários.
“Sinto-me grato por poder ajudar nesta altura”, diz José Carlos, um dos voluntários, enquanto preenche mais um cabaz com enlatados, cereais, massas, leites, iogurtes, bolachas, frutas e legumes, entre outros produtos.
Pandemia da pobreza
Apenas Lisboa regista mais novos casos de Covid-19(...)
Os alimentos que ali são distribuídos vêm da autarquia, do Banco Alimentar e da sociedade civil.
O Centro Social da Paróquia de São José da Nazaré, uma das mais de 30 entidades do concelho que asseguram a distribuição de bens alimentares, apoia 485 pessoas, no âmbito do programa alimentar às famílias mais atingidas pela crise económica provocada pela pandemia. Há que somar ainda a lista dos doentes Covid. São, até agora, 11 famílias em isolamento com apoio integral, nalguns casos incluindo água, luz e gás.
“Ninguém sai de casa e nós fazemos as compras da medicação e de algum bem essencial. Estamos em contacto com o Centro de Saúde, porque há famílias que não têm outro meio de comunicação e, nesse caso, usamos o e-mail, o telefone ou deslocamo-nos lá presencialmente. A alimentação vai da nossa paróquia”, explica Paula Magalhães.
No dia da entrega dos produtos, o combinado é telefonar e deixar os sacos à porta, cumprindo as normas de segurança. Tudo graças à boa vontade e com recursos próprios dos voluntários, que assim contribuem para aliviar as dificuldades causadas pela Covid-19.
Paula Magalhães acredita ainda que há outras situações de carência que não chegam ao seu conhecimento, por vergonha, e sustenta: “Confesso que tenho medo do futuro. Não se prevê que quem tenha ficado sem emprego possa vir a recuperá-lo facilmente. Teremos de arranjar alternativas”.
Em todo o concelho de Loures são 13 mil as pessoas que beneficiam de ajuda alimentar. Gonçalo Caroço, o vereador do Departamento da Coesão Social e Habitação diz-se ciente de que o número vai aumentar. “Recebemos todos os dias pedidos de apoio e tentamos coordenar esses pedidos com a Segurança Social e com as instituições que estão no terreno. Se tivesse sido a própria autarquia a fazer esse trabalho, não conseguiria nunca chegar a estas pessoas. Estamos já a falar num apoio global de meio milhão de euros para alimentos e sabemos que esse apoio vai ter de continuar porque a pobreza vai alastrar-se”.
Apesar de ligeiras descidas no número de casos confirmados do novo coronavírus, o Governo decidiu manter, por mais 15 dias, a situação de calamidade em 19 freguesias da Grande Lisboa, o estado de contingência para a Área Metropolitana de Lisboa e a situação de alerta para Portugal Continental.
Nesta terça-feira, o Governo e os parceiros sociais reúnem-se em sede de concertação social. O objetivo é discutir os apoios à retoma da atividade empresarial e laboral, após os constrangimentos causados pela pandemia.