21 out, 2020 - 16:28 • Olímpia Mairos
O bispo auxiliar de Braga, D. Nuno Almeida, questiona, em carta aberta, o Parlamento sobre a intenção de legislar sobre a eutanásia num momento em que o país atravessa uma crise provocada pela Covid-19.
“Junto o meu clamor e indignação aos que se perguntam: Como é possível que, num tempo de emergência em que a pandemia continua a alastrar, o Parlamento Português discuta a eutanásia?”, escreve o bispo.
A Assembleia da República vai debater, esta quinta-feira, o projeto de resolução n.º 679/XIV/2.ª, sobre a proposta de referendo sobre a “(des)penalização da morte a pedido”. A votação está prevista para sexta-feira.
D. Nuno Almeida entende que “nas difíceis e imprevisíveis circunstâncias de crise pandémica em que vivemos, o que se pede aos deputados e a todos nós, é que velemos e zelemos para que sejam respeitados os direitos, já consignados em lei, associados à dignidade humana e que devem ser praticados durante o período em que se avizinha o fim da vida”.
O bispo auxiliar de Braga lembra que “os direitos do fim da vida” incluem, entre muitos outros, “o direito aos cuidados paliativos”.
O prelado defende que apesar da pandemia, “é preciso fazer tudo o que está ao nosso alcance para que sejam dadas respostas adequadas às necessidades dos doentes em fim de vida e terminais, que assentam essencialmente no alívio do sofrimento físico e psíquico, prestado por uma equipa devidamente capacitada, no apoio espiritual e no suporte afetivo através da família e amigos”.
D. Nuno Almeida declara que “para justificar a legalização da eutanásia e do suicídio assistido, há quem alegue que dessa forma o Estado não toma qualquer partido a respeito de conceções sobre o sentido da vida e da morte e respeita, apenas, a vontade e as conceções sobre o sentido da vida e da morte de quem solicita tais pedidos” e alerta que “não é assim”.
“O Estado e a ordem jurídica, ao autorizarem tal prática, dando-lhes o seu apoio, estão a tomar partido, estão a confirmar que a vida permeada pelo sofrimento, ou em situações de total dependência dos outros, deixa de ter sentido e perde dignidade, pois só nessas situações seria lícito suprimi-la”, explica.
O bispo auxiliar de Braga alerta que “há o sério risco de que a morte passe a ser encarada como resposta à doença e ao sofrimento, já que a solução não passaria por um esforço solidário de combate a essas situações, mas pela supressão da vida da pessoa doente e sofredora, pretensamente diminuída na sua dignidade”.
“É mais fácil e mais barato. Mas não é humano”, acusa o prelado.
Na carta aberta, D. Nuno Almeida alerta ainda que é natural que “os mais pobres e débeis”, se “sintam socialmente pressionados a requerer a eutanásia, porque se sentem a mais ou um peso”.
“É este, sem dúvida, um perigo agravado num contexto de envelhecimento da população e de restrições financeiras dos serviços de saúde que implícita ou explicitamente se podem questionar: para quê gastar tantos recursos com doentes terminais quando as suas vidas podem ser encurtadas?”, escreve o prelado.
O bispo auxiliar de Braga considera que “não podemos ignorar que entre nós uma grande parte dos doentes, especialmente os mais pobres e isolados, não tem acesso aos cuidados paliativos, que são a verdadeira resposta ao seu sofrimento” e que a legalização da eutanásia e do suicídio assistido “contribuirá para atenuar a consciência social da importância e urgência de alterar esta situação, porque poderá ser vista como uma alternativa mais fácil e económica”.
“Não é preciso legislar sobre a eutanásia e sobre o suicídio assistido. O que precisamos, neste tempo incerto de pandemia, é de concretizar e cumprir o que já está legislado para que todos tenham uma existência feliz, apesar das lágrimas, e um fim de vida digno”, defende.