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Padre Abel Canavarro. "A Igreja sairá mais purificada" desta pandemia

31 jan, 2021 - 15:56 • Henrique Cunha

"A fé é um fator agregador, na medida em que nos leva ao essencial e a descobrir aquilo que é fundamental. E, portanto, no fundo, a Igreja não vai ser como era", antevê o sacerdote e académico, numa entrevista à Renascença em que fala também das Jornadas de Teologia que vão decorrer na Católica do Porto entre 1 e 4 de Fevereiro.

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Entrevista ao padre Abel Canavarro
Ouça aqui a entrevista ao padre Abel Canavarro

O diretor-adjunto da Faculdade de Teologia da Universidade Católica, padre António Abel Canavarro, está convicto de que "a Igreja sairá mais purufucada" deste tempo de pandemia.

"A fé é um fator agregador, na medida em que nos leva ao essencial e a descobrir aquilo que é fundamental. E, portanto, no fundo, a Igreja não vai ser como era", antevê o sacerdote e académico, em entrevista à Renascença.

"Creio que teremos uma fé mais sólida, uma fé feita mais de convicção. Não vamos ter, possivelmente, grandes comunidades", acrescenta Abel Canavarro, nesta conversa marcada também por mais uma edição das Jornadas de Teologia da Faculdade de Teologia.

Em tempo de pandemia, os trabalhos decorrerão "online", a partir de segunda-feira, dia1, e até dia 4 de Fevereiro. "Vemos nesta dificuldade uma oportunidade para abrir outras portas na evangelização", diz Abel Canavarro.

Que imprtância atribui ao papel da fé neste contexto de pandemia?

Vemos estas circunstâncias que estamos a viver nos despojaram de muitas atitudes, de muitas ações e práticas e pastorais que fazíamos na Igreja para nos levarem ao essencial. O essencial é o encontro com Deus é a atenção às pessoas, sobretudo esta cultura de proximidade e de atenção ao outro onde o rosto de Cristo nos interpela que vem sempre ao de cima.

No primeiro confinamento ,houve quem se mostrasse descontente com o facto de existirem decisões diferentes para situações idênticas. Este tempo de pandemia - dizem alguns - faz emergir a nobreza de carácter, mas também revela a mesquinhez das pessoas. É também aqui que entra a fé como fator agregador?

Sim, penso que, de facto, a fé é um fator agregador, na medida em que nos leva ao essencial e a descobrir aquilo que é fundamental. E, portanto, no fundo, a Igreja não vai ser como era. Mas penso também que a Igreja sairá mais purificada, porque a fé e as convicções profundas não podem ser abaladas por uma ou outra decisão que se possa tomar, com a qual eu não estou de acordo.

Precisamente: teremos uma fé mais sólida no fim de desta pandemia?

Eu creio que sim. Creio que teremos uma fé mais sólida, uma fé feita mais de convicção. Não vamos ter, possivelmente, grandes comunidades. Vamos ter comunidades mais pequenas, comunidades menores, mas penso que vamos ter comunidades mais convictas. Aliás, é sempre este processo de purificação da Igreja que nestas circunstâncias nos trás também ao de cima aquilo que eram as comunidades primitivas: menos pessoas, mais convictas, uma fé mais autêntica e, sobretudo, uma fé que leve também a um empenho e que depois se torne visível no testemunho da vida, do dia a dia. É o recomeço de uma nova etapa.

Essa "ação purificadora" vai ter também influência junto dos fiéis. É de recear problemas acrescidos quando estamos a viver uma situação que obriga ao encerramento das Igrejas? Poderá haver aqui fatores de preocupação quanto à participação celebrativa dos fiéis?

Penso que haverá. E esta preocupação leva-nos, certamente ,ao essencial, leva-nos também a procurarmos novas formas de acompanhamento e de estarmos próximos das pessoas. E, sobretudo, uma Igreja não tanto que está à espera do que acontece, mas uma Igreja que nas dificuldades é capaz de ser criativa, é capaz de se reinventar na fidelidade ao Evangelho, mostrando outra dinâmica de proximidade, de verdade e de autenticidade.

Por isso, inclusivé, alguns estilos de vida - o estilo de ser padre, o estilo de ser cristão - têm de mudar. De mudar muito neste contexto porque, enfim, este pensar que muitas vezes nós temos este saudosismo de um certo regime de cristandade no qual nós já não estamos, mas do qual teimamos em não sair; certamente que esta situação irá alterar-se. Penso que surgirá algo novo, algo diferente que trará mais ao de cima aquilo que são as características da Igreja como a comunhão, a fraternidade, a solidariedade; aquilo que hoje se fala muito a sinodalidade, inclusive na vida e na vivência da própria Igreja. E depois também no modo de viver e de celebrar a fé.

Por último, o que motivou o tema destas jornadas: "Um só corpo, um só Batismo - A Diversidade dos Carismas e a Construção da Comunhão"? Que expectativas tem pelo facto deserem apenas transmitidas "online"?

Este tema tem subjacente toda esta problemática porque sentimos e vemos que descobrir a Igreja como esta comunhão na diversidade de pessoas de carismas constituem a Igreja e que todos contribuem para a comunhão. E vemos que hoje, de facto, esta comunhão na Igreja e com a Igreja é importante, não só ao nível da expressão da fé, mas também ao nível do pensar e do refletir a fé. Portanto, esta diversidade dos carismas é esta construção da Igreja que é comunhão de pessoas, cada uma chamada por Deus pelo Batismo.

Depois, claro, há que perceber esta dimensão de uma Igreja que é constituída por estes carismas e perceber que a espiritualidade batismal é raiz da Igreja onde surgem as várias vocações. Por isso, a vida e as vocações na Igreja e os carismas são, no fundo, para levar às ultimas consequências. Nesta comunhão de carismas surge, então, uma Igreja nesta diversidade, mas também unida pelo mistério de Jesus Cristo e que encontra em Jesus Cristo o seu centro unificador e a partir do qual a Igreja desenvolve também a sua própria ação.

As jornadas de teologia são desenvolvidas neste contexto de pandemia e fomos obrigados a recorrer ao "online". No início, queríamos que elas fossem presenciais como têm sido até agora, mas tivemos de passar para este modelo. Claro que este modelo, se por um lado nos priva da presença física e do encontro das pessoas na universidade, por outro lado também nos desafia e também tem uma consequência positiva que é a de nos fazer chegar mais longe e podermos, até, atingir públicos que de outra forma não poderiam estar presentes.

Vemos também nesta dificuldade uma oportunidade para abrir outras portas na evangelização, para abrir outros meios, inclusivé para chegarmos junto das pessoas que talvez a forma presencial não atingisse. Esta situação abre-nos também para um desafio em que não devemos absolutizar modelos na formação e na evangelização, mas acreditar que um misto pode levar-nos mais longe.

A expectativa é alta, o tema é interessante não só pela temática, mas também pelos oradores, e, por isso, penso que é um momento de reflexão, é um momento de pensarmos como podemos construir esta comunhão na diversidade dos carismas e depois também tocando os vários aspetos, uns mais teóricos e outros mais práticos, penso também que será um contributo para uma nova forma de viver a fé e de construirmos também a comunhão na Igreja.

Esperemos que em junho, na altura do encerramento do ano académico, possamos lançar o livro com as conferências e os textos que vão ser pronunciados nestas jornadas. Nestas, deste ano será publicado o volume das jornadas do ano passado. Mas, este ano decidimos que em junho iriamos fazer a publicação das Jornadas de 2021 para não ficarem tão longe no tempo e assim também podermos colocar à disposição das pessoas o material escrito daquilo que será tratado nesta jornada.

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