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​Jesuítas em Beirute. “Com a ajuda dos portugueses, o nosso trabalho nunca esteve em causa”

03 abr, 2021 - 15:27 • Ângela Roque

Oito meses depois da explosão que destruiu parte da capital do Líbano, ainda há obras por fazer, a pobreza aumentou e a ajuda internacional escasseia. O padre Rui Fernandes fala à Renascença do apoio que os jesuítas asseguram em Beirute, onde têm um hospital, uma igreja e uma universidade, e criaram uma rede de distribuição de cabazes alimentares, que já se estendeu a todo o país.

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Na Igreja dos Jesuítas, no centro de Beirute, ainda há marcas da violenta explosão de 4 de agosto de 2020. “Ainda temos os vidros forrados a plástico. É uma igreja muito grande e vai levar tempo a arranjar”, diz à Renascença o padre Rui Fernandes, para acrescentar, logo a seguir, que “o essencial é que seja possível acolher as pessoas e trabalhar, e isso vai-se fazendo”.

O sacerdote português, que se encontra a fazer doutoramento na Universidade de São José, na capital libanesa, conta que “o país está a enfrentar uma crise política e económica muito forte, muito séria”, e que “seja por falta de dinheiro, seja por falta de criatividade, o Estado tem sido completamente incapaz de dar assistência à população”.

Logo após a explosão houve muito interesse e apoio internacional, mas esgotou-se em três meses. Em novembro já não havia praticamente nenhuma organização não-governamental (ONG) estrangeira no terreno. “Percebe-se que as empresas ou Estados têm dificuldade em investir em países quando há suspeitas de corrupção. Isso percebe-se, mas quem acaba sempre por pagar a fatura são as populações que precisam de ajuda. Por isso, sim, há um certo esquecimento do Líbano”, lamenta o padre Rui Fernandes.

Neste momento, a ajuda à população está a ser dada sobretudo por ONGs do próprio país, e também pelos jesuítas. “As nossas obras em Beirute foram diretamente atingidas pela explosão. Foi preciso restaurar janelas, portas, telhados, arranjar mobílias, seja nas nossas residências, seja na nossa escola, no nosso hospital ou na igreja grande que a Companhia de Jesus tem no centro da cidade. Mas, o nosso trabalho nunca esteve em causa. Se fazia sentido estar cá, era nesta altura”, assegura.

Na Universidade de São José criaram-se equipas de apoio às vítimas da explosão. E com a colaboração de vários restaurantes, cafés e supermercados, criou-se uma rede de distribuição de cabazes alimentares. Uma rede que “hoje já se estendeu a todo o país, por causa da pobreza, fruto da crise económica grave que o país está a sofrer”.

No terreno continua também o Serviço Jesuíta aos Refugiados (JRS), que “para além do apoio às populações síria e palestiniana, que já dava antes, logo após a explosão começou a ajudar as famílias, com apoio psicológico, distribuição de alimentos e de pequenas pensões, ou bolsas, para que possam ter alguns recursos. E esse trabalho continua”.

Rui Fernandes agradece a generosidade dos portugueses que contribuíram para a campanha solidária lançada pelos jesuítas em Portugal, ainda em agosto. Foram esses donativos que permitiram fazer obras, e assegurar apoio médico no hospital que têm em Beirute. “Depois da explosão foi no nosso hospital que muitas pessoas procuraram cuidados médicos, e puderam tê-los de forma gratuita, graças a essas doações”.

Os donativos também serviram para começar a arranjar a igreja onde, apesar das limitações, por causa da Covid-19, as celebrações voltaram a ser possíveis. “As igrejas têm sido pontos de encontro muito felizes, e as pessoas têm participado imenso”, conta o sacerdote, que fala também da vivência da Páscoa.

“O lado bonito aqui da realidade do Médio Oriente, é que a Páscoa cá é vivida de uma forma muito plural. Há muitas igrejas cristãs, em comunhão com Roma, e outras comunidades antigas, e cada uma tem os seus calendários. Nós estamos a celebrar a Páscoa agora, outros fazem-no só daqui a um mês, e vamos poder celebrar outra vez com os nossos vizinhos, e vai ser uma alegria!”, sublinha o jovem padre português, que acolheu com expetativa a vontade já manifestada pelo Papa em visitar o Líbano.

“O Papa esteve no Iraque, e foi extraordinário, e anunciou que pensa vir também aqui ao Líbano. Sem dúvida que isso é importante para as comunidades locais. O Papa tem sido uma voz muito importante no diálogo entre as diferentes tradições religiosas, e na denúncia das instrumentalizações da religião, de como às vezes as religiões são usadas para o terrorismo e para a violência. Sem dúvida que para as comunidades cristãs será uma alegria enorme poder recebê-lo, até porque é uma figura consensual aqui, nas igrejas locais”, conclui o sacerdote.

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