Na segunda-feira, morreu de Covid-19 o padre Stan Swamy, detido pelas autoridades indianas por alegadas ligações a grupos terroristas. Com 84 anos, Swamy morreu depois de ter passado os últimos anos de vida a defender os direitos humanos de minorias étnicas na Índia, especialmente dos muçulmanos.
A morte do padre Stan Swamy marca o fim de um conflito entre o pároco e a Índia. O padre José Maria Brito, diretor do Ponto SJ, o portal dos Jesuítas em Portugal, afirmou à Renascença que é fundamental continuar o trabalho de Stan Swamy: apelar às autoridades até que sejam cumpridos os direitos humanos na região.
O que marcou a vida de Stan Swamy?
Foi um jesuíta que tinha 84 anos, quando foi preso no dia 8 de outubro tinha 83 anos, e que ao longo de mais de 50 anos esteve empenhado em defender os direitos humanos dos mais frágeis, de um modo muito especial os Adivasis - que era uma etnia indiana que estava, inclusivamente, fora da lógica das castas indianas e que era muito desprotegida -, dando consciência às populações, especialmente aos líderes jovens, dos seus próprios direitos.
E na sequência de tudo isto, acabou por ser injustamente envolvido num caso de uma manifestação que ocorreu num sítio onde ele nunca esteve, como se tivesse ligações maoístas e fosse terrorista. Coisa que nunca ficou, nem de perto nem de longe, provada.
Ou seja, foi detido por falsas acusações por ligações terroristas?
Por ligações a grupos terroristas, nomeadamente grupos que tinham estado ligados a uma manifestação da qual que resultaram uma série de detenções e de conflitos.
O seu trabalho foi sobretudo de consciencialização deste líderes mais jovens, inclusivamente de se empenhar numa ação contra estes direitos serem negados. Como com questões que tinham a ver com expropriações de terrenos em zonas rurais, de populações muito frágeis e feitas de uma forma bastante arbitrária e pouco correta.
Estava preso desde outubro, foi sempre muito difícil ao longo destes meses dar-lhe as condições mínimas de dignidade na cadeia. Nas primeiras semanas, chegou a dormir no chão. Sofria de Parkinson e precisava de uma pequena palhinha para poder beber autonomamente e foi difícil conseguir esse autonomia para uma coisa tão simples como beber água.
Depois, a nível de autoridade policial e dos tribunais, foram sempre sendo-lhe negadas quaisquer possibilidades de sair por razões médicas. Entretanto, foi autorizado porque ele acabou por contrair Covid-19, estava também no hospital devido ao seu estado debilitado de saúde e estava à espera que o Supremo Tribunal pudesse decretar a sua liberdade devido a razões médicas. A audiência estava inicialmente para o 2 ou 3 de julho, e acabou por ser adiada para dia 6. Ele acabou por morrer ontem de manhã.
Isto demonstra que na Índia há um quadro de intolerância religiosa? Isto enquadra-se nisso?
Enquadra-se claramente num desrespeito grande por questões de direitos humanos. Vários tipos de ativistas de direitos humanos foram presos, há uns tempos um humorista foi preso antes de ter tido o seu espetáculo, era um humorista muçulmano. Não creio que neste caso, o padre Stan a questão tenha sido explicitamente religiosa, foi uma questão de direitos humanos mas, noutros casos, os muçulmanos em estados que são governados pelo mesmo partido do Governo nacional têm sentido uma maior dificuldade em poder ter a sua ação respeitada, e têm sentido mais este tipo de arbitrariedades no que diz respeito à sua liberdade.
A provincial dos jesuítas em Portugal enviou uma carta à embaixada da Índia. Obteve alguma resposta?
Essa carta foi enviada em janeiro, no início deste ano, na altura em que se comemorava o aniversário da constituição da Índia, justamente porque é uma constituição baseada em todo este tema dos direitos humanos, do respeito pela liberdade das pessoas, independentemente da sua proveniência, social ou religiosa. E nessa altura, a carta foi publicada no Diário de Notícias e foi subscrita por várias personalidades.
Houve uma resposta uns dias depois da embaixada da Índia, uma resposta sem responder diretamente ao assunto mas garantindo a separação de poderes judicial e legislativo, que não estava muito clara neste caso.
Na verdade, o que se percebia é que de facto isso não estava a acontecer. A resposta foi muito pouco clara relativamente à situação do padre Stan. E o próprio Governo diria que haveria provas nesse sentido.
Perante este caso que levou à detenção e falecimento do padre Stan Swamy, que apelo é que deixa à comunidade internacional?
Nós já por diversas vezes procuramos alertar, a nível internacional, a vários movimentos e junto de deputados do Parlamento Europeu e de várias instâncias. Creio que há que ter em consideração que a questão dos direitos humanos na Índia é uma questão muito séria, a falta de respeito pelos direitos humanos.
Pudemos também recentemente participar com a Amnistia Internacional no encontro de líderes da União Europeia com a Índia, no Porto, numa vigília silenciosa alertando para esta situação da falta de respeito de direitos humanos. E esse é o apelo que temos de continuar a fazer, que sejamos vigilantes.
E dizendo de um modo muito claro: evidentemente que na relação entre os Estados, tem de estar sempre assegurado o respeito pela soberania dos Estados; mas a defesa dos direitos humanos é uma exigência e depois deixamos que se coloque em causa a dignidade das pessoas e dos seus direitos.