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Abusos sexuais

Perito do Vaticano. "Há padres que cometeram abusos e continuam a viver sem serem incomodados"

01 fev, 2022 - 23:22 • Lusa

Padre Hans Zollner, membro da Comissão Pontifícia para a Proteção de Menores, defende investigação na Igreja italiana.

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Um dos principais conselheiros do Vaticano sobre abuso sexual de menores defendeu esta terça-feira uma investigação no seio da Igreja Católica italiana, na sequência de relatórios sobre crimes de pedofilia no clero, publicados em vários países.

"O abuso sexual de menores é uma realidade em todas as sociedades e regiões do mundo", incluindo a Igreja italiana, disse Hans Zollner, membro da Comissão Pontifícia para a Proteção de Menores e diretor do Instituto de Antropologia para a Prevenção do Abuso, com sede em Roma.

Segundo o padre alemão, que é um conselheiro próximo do papa Francisco, "3 a 5% dos padres foram acusados de abusos nos últimos 75 anos, em todo o mundo".

"Pensamos que os números são comparáveis em Itália. Muito provavelmente existem padres que cometeram abusos e que continuam a viver sem serem incomodados", advertiu.

"É obviamente necessário realizar uma investigação em todos os países do mundo (...). Devemos fazer todo o possível para fazer justiça às vítimas do passado e evitar abusos hoje", disse, quando questionado sobre a necessidade de uma tal investigação em Itália.

Embora esteja a perder terreno, a Igreja mantém grande influência em Itália, o país dos papas, onde cerca de 66% dos 61 milhões de habitantes se intitulam católicos, de acordo com uma sondagem publicada em 2019.

Entre estes católicos, "alguns líderes religiosos e leigos dizem que o problema do abuso sexual está confinado à Europa Central ou América do Norte, mas não é esse o caso", disse Zollner, que tem vindo a tomar um número crescente de posições sobre o assunto nas últimas semanas.

A rede "O Abuso" (Rete L'Abuso, em italiano), uma associação italiana de vítimas, com 1.300 membros, contabilizou mais de 300 padres implicados ou condenados durante os últimos 15 anos, dos 50.000 em Itália.

É impossível, contudo, ter "números precisos" devido à ausência de "relatórios independentes", tais como as revelações chocantes da comissão chefiada por Jean-Marc Sauvé, em França, ou um relatório recente na Alemanha, implicando o papa emérito Bento XVI sobre o tratamento destes factos, quando era arcebispo de Munique.

Outros relatórios foram produzidos na Austrália, Irlanda, Estados Unidos. Enquanto isso, "a sociedade italiana ainda parece estar muito fechada ao assunto", declarou Zollner, referindo que os meios de comunicação social nacionais estão relutantes em abordar o assunto.

"Este tipo de investigação foi quase sempre iniciado quando a sociedade, como um todo, estava pronta para enfrentar esta espinhosa questão. Em Itália, não vejo esta prontidão", disse o especialista, acrescentando que outros setores da sociedade também podem estar preocupados.

Como resultado, "ninguém tem muito interesse em abrir a ´caixa de Pandora` e enfrentar a situação de frente".

No entanto, há "sinais" de uma mudança de mentalidade, sublinhou.

No sábado, o influente cardeal Gualtiero Bassetti, presidente da Conferência Episcopal Italiana (CEI), confirmou ao diário Il Corriere della Sera que há já algum tempo que "pensava em lançar uma investigação profunda e séria".

"Os bispos italianos estão a considerar o método a ser adotado. Esta é a primeira posição forte sobre o assunto", saudou Zollner.

Em Portugal, os bispos anunciaram, em novembro, a criação de uma comissão independente, e, em Espanha, o governo solicitou na semana passada a criação de uma comissão sobre o assunto.

Por seu lado, a Conferência Episcopal Italiana está a implantar células locais de escuta a nível diocesano, uma resposta insuficiente, na opinião das vítimas, que apelam a uma comissão independente e a uma ação mais rápida.

"É difícil negar os abusos, mas algumas pessoas veem-no como um ataque à Igreja, ou pensam que é exagerado", indicou Zollner.

A Igreja deve "superar um certo esprit de corps [espírito de corpo] que tende a proteger primeiro a instituição", uma cultura que ainda está "demasiado difundida", concluiu.

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