18 fev, 2022 - 08:00 • Isabel Pacheco
É da bagageira do velho Opel Corsa que Augusto Barbosa monta a sua banca improvisada no centro da cidade de Braga. Traz o que “a terra lhe dá” e das promoções que “apanha” nos supermercados.
Há limões, batatas, tangerinas, abóbora, uns quilos de arroz e outras tantas latas de atum. “Tudo para oferecer.” “Estou a dar o que cultivo no meu terreno. O que me sobra venho dar, porque sei que há pessoas necessitadas”, acrescenta o reformado.
Augusto, desloca-se da Póvoa de Lanhoso até Braga, porque acredita que é na cidade onde a ajuda faz mais falta.
“Hoje temos batatas, limões, mas também compro arroz, atum e azeite quando está em promoção e depois dou”, conta, realçando que “isto acaba num instante”.
“Há pessoas que vem ter comigo e confessam que têm vergonha, mas que são necessitadas”, conta. “Já me apareceu aqui um casalinho novo. Ela veio ter comigo e disse-me que estavam ambos no fundo de desemprego. Levaram o que tinha e nunca mais apareceram.”
“Lá deviam ter arranjado emprego”, atira.
As histórias vão-se repetindo, conta Augusto que, aos 75 anos, e na reforma, garante ter encontrado a melhor forma de ocupar os dias.
“Sinto me bem a fazer isto. Se estivesse no lugar de outras pessoas gostaria que me fizessem o mesmo”, confessa nestas declarações, acrescentando haver pessoas que dizem rezar por ele.
Os pedidos de ajuda por bens alimentares que chegaram à Caritas Arquidiocesana de Braga duplicaram em 2021. João Nogueira fala numa situação “preocupante” e admite que a instituição já não tem mãos a medir.
“Um eventual agravamento da situação torna incomportável o apoio prestado pela Cáritas. Não temos os recursos humanos que queremos e não temos capacidade para reforçar”, reconhece o presidente da instituição.
O aumento das rendas da habitação para valores incomportáveis por muitas famílias é um dos principais culpados, aponta João Nogueira que garante que “a pandemia não é responsável por tudo”.
“Temos situações de várias famílias que têm de partilhar a mesma habitação. Já não alugam uma casa, mas um ou dois quartos de forma a terem uma vida minimamente viável”, conta.
“De facto, hoje trabalhar e ter um salário não quer dizer vida digna”, lamenta.
Apesar da prioridade no apoio da Cáritas ser a alimentação e a saúde, uma parte “significativa” do orçamento da instituição é gasto no apoio às rendas.
Em 2021, foram gastos 30 mil euros em rendas. “Representa muito do nosso orçamento”, reconhece João Nogueira, admitindo que se não fosse o financiamento do Fundo Social Arquidiocesano, a Cáritas “não teria capacidade de resposta”.
Em 2021, a Caritas Arquidiocesana de Braga atendeu mais de oito mil famílias, o dobro do que em 2020. Serviu mais de 25 mil refeições e distribuiu cerca de 13 mil euros em vales alimentares e em ajudas para a compra medicamentos.