25 mai, 2022 - 15:50 • Ângela Roque
O regime sandinista que governa a Nicarágua mandou encerrar o canal televisivo da Conferência Episcopal a 20 de maio, um dia depois do bispo de Matagalpa, e administrador apostólico de Esteli, ter entrado em greve de fome por tempo indeterminado, em protesto contra o assédio policial de que diz estar a ser alvo.
Numa mensagem vídeo publicada pela Fundação AIS, D. Rolando Álvarez, que é o responsável pelo departamento de Comunicação da Conferência Episcopal da Nicarágua e pelo canal católico, conta que na quinta-feira, 19 de maio - dia em que se deslocou a casa de familiares - foi "perseguido durante todo o dia pela polícia”, que lhe disse que estava a “cumprir ordens".
“Vou jejuar até ao momento em que a polícia, através do presidente ou do vice-presidente da Conferência Episcopal, e só eles, me informarem que vão começar a respeitar a privacidade do meu círculo familiar”, sublinha o bispo na mensagem.
D. Rolando, que nos últimos dias só tem ingerido água e soro, já anteriormente tinha denunciado que as autoridades impediram o acesso dos fiéis à Igreja onde ia celebrar missa ao domingo.
“O que o governo quer é uma Igreja muda, que não anuncie a esperança do povo", mas “a Palavra de Deus não está acorrentada", garantiu numa numa entrevista que concedeu no sábado, 21 de maio.
Segundo a Agência Católica de Informações (ACI), o fecho do canal da Igreja foi anunciado pelo Instituto Nicaraguense de Telecomunicações e Correios (Telcor), propriedade do Governo. Na reação, o bispo auxiliar de Manágua, D. Silvio José Báez, escreveu no Twitter que "ainda que a ditadura tire o canal católico do ar, tudo será inútil, porque a Igreja continuará a proclamar o Evangelho da esperança e da justiça”.
Para além do bispo de Matagalpa, também o padre Harvin Padilla, da diocese de Masaya, denunciou esta semana que tem sido perseguido por polícias e paramilitares ligados ao regime.
Em comunicado, a diocese a que pertence já expressou “tristeza e preocupação” com a situação. “Pedimos às autoridades envolvidas que parem com esse comportamento e permitam que cada irmão desenvolva seus direitos, liberdades e garantias humanas e constitucionais, sem obstáculos ou medos”.
Tensão crescente
Estes são os mais recentes episódios de tensão entre a Igreja e as autoridades na Nicarágua, depois de em março último o Núncio Apostólico ter sido expulso do país.
No início do ano, a Assembleia Nacional da Nicarágua – onde a Frente Sandinista de Libertação Nacional (FSLN), de Daniel Ortega, tem uma maioria de 80 por cento - aprovou um relatório que acusa vários bispos e padres de terem apoiado os protestos civis de 2018, que tentaram derrubar o regime. Segundo várias organizações internacionais, na repressão das manifestações morreram cerca de 400 pessoas.
Em julho desse ano, a Basílica de San Sebastián, na cidade de Diriamba, foi palco de agressões violentas por parte de um grupo de paramilitares, em que os alvos foram o arcebispo de Manágua, D. Leopoldo José Brenes, o bispo auxiliar, D. Silvio José Báez, o núncio apostólico, D. Waldemar Somertag, e vários jornalistas. Silvio Báez acabaria por deixar o país, após ter recebido ameaças de morte.
Já em 2020, a Catedral de Manágua foi atacada por incendiários, num ato que muitos consideraram ter-se tratado de uma represália pelo papel que a Igreja tem desempenhado na promoção da paz no país.