16 nov, 2022 - 18:30 • Henrique Cunha
O número de peregrinos a fazer os caminhos de Santiago vem aumentando anualmente. De acordo com a Oficina do Peregrino, mais de 300 mil pessoas chegam todos os anos a Compostela depois de atravessarem o território nacional.
A realidade não escapa aos agentes económicos e, no norte do país, em particular no Minho, as autarquias desdobram-se em iniciativas de promoção do caminho português, seja ele o da costa ou o central/primitivo.
Na região, há a consciência de que “são os peregrinos que mantém e preservam economicamente a sustentabilidade de muitas famílias”, avança à Renascença o vice-presidente da Câmara de Ponte de Lima, Paulo Sousa.
O autarca adianta que “há mercearias, há pequenos comércios que ainda hoje subsistem à custa do Caminho” e que noutras freguesias, fora da rota de Santiago, "esses pequenos comércios desapareceram”.
Paralelamente, Paulo Sousa fala do investimento que o Caminho proporciona ao concelho e dá o exemplo: "Um casal de russos que passou por aqui, gostou e decidiu investir num hotel com o objetivo é trazer turistas russos para cá e absorver um conjunto de experiências ligadas ao território e ao consumo de produtos locais”.
O autarca de Ponte de Lima dá também “o exemplo de uns filipinos que passaram por cá e compraram uma quinta na parte superior da vila e fizeram um projeto de enoturismo”.
“Há muitas pessoas que acabam por percorrer o Caminho e que, depois, decidem investir aqui no território, quer em projetos de turismo quer na aposta de residência temporária ou definitiva”, adianta.
O mesmo cenário é descrito por Elisa Braga, responsável pelos pelouros da cultura, turismo e artesanato da Câmara de Barcelos. A autarca entende que o Caminho de Santiago “é um eixo estratégico para toda a política cultural e social de Barcelos”.
A responsável recorda todos os edifícios seculares associados ao Caminho e adianta que “em termos sociais, trata-se de um eixo de desenvolvimento fundamental para o território, pois temos vindo a assistir à abertura de espaços de turismo de habitação, de alojamento local, que os peregrinos nos trazem".
“O peregrino é peregrino hoje, mas volta amanhã, se for bem tratado. Volta como turista e não só: volta também como investidor”, afirma.
Luísa Braga diz que há "casos de pessoas que não estavam ligadas a Barcelos, que acabaram por investir em Barcelos depois de fazerem o Caminho de Santiago”.
“Conheço pessoas que escolheram Barcelos para segunda casa ou mesmo primeira casa depois do caminho de Santiago", reforça.
Muito importante nesta realidade é a forma como a população local entende a importância estratégica do Caminho. Na opinião da autarca, esse entendimento traduz-se "na forma como as populações tratam o peregrino”.
“Penso que a população está super-educada e muito interessada. Temos vários exemplos, ao longo do Caminho, com pessoas, muitos particulares que são os primeiros a abordá-los e a perguntar se precisam de alguma coisa."
A forma como as populações tentam acolher todos os que passam é também sublinhada pelo vice-presidente da Câmara de Paredes de Coura, Tiago Cunha: "As pessoas têm consciência da importância que o peregrino representa para a económica do concelho”.
O autarca lembra que “todos os anos, de acordo com os registos, mais de 300 mil pessoas passam por este caminho, que é, verdadeiramente, 'O Caminho". Essas 300 mil pessoas geram uma dinâmica económica muito forte”.
"Em termos de concentração de negócios associados ao caminho, verificamos que o número de pequenas empresas criadas é muito maior nestas quatro freguesias”, concretiza.
“O caminho já é uma realidade económica interessante e importante para as pessoas daqui, pois estamos a falar de um número muito grande de empresas, sobretudo, de alojamentos locais, mas também restaurantes e cafés”, reforça o autarca.
Tiago Cunha entende que “essa resposta veio porque existe uma ideia de explorar a passagem dos peregrinos e isso também faz com que as pessoas cuidem muito bem dos peregrinos”.
Num momento em que algumas autarquias minhotas - Barcelos, Ponte de Lima, Paredes de Coura e Valença - estão a promover o Caminho Português de Santiago Central - Caminho Primitivo, através de um projeto de comunicação e cooperação intermunicipal, cofinanciado pelo Fundo Europeu de Desenvolvimento Regional (FEDER), integrado no Programa Operacional Regional Norte 2020, que se insere na reprogramação da “Estratégia PROVERE Minho Inovação”, os municípios alertam para a necessidade de “não se transforma o caminho num negócio”.
“Temos de garantir que mantemos o Caminho genuíno, com identidade”, diz o vice-presidente da Câmara de Ponte de Lima, Paulo Sousa. "Este é um recurso identitário e para o preservarmos temos que o valorizar."
"Muitas vezes, ao querermos acrescentar valor de uma forma artificial, estamos a prejudicar o Caminho”, aponta Pualo Sousa, apelando a que "todos tenha disso consciência”.
Sendo o caminho também "um ativo importante do país", os decisores políticos locais "têm que ter muito cuidado na forma como se gere este processo”.
“Às vezes, nota-se a propensão para a proliferação de Caminhos, mas, na verdade, temos de ter uma consciência coletiva no sentido de preservar e valorizar e acrescentar valor, mas sem degradar e destruir".
Também a vice-presidente da Câmara de Valença, Ana Paula Xavier, considera o Caminho central como “primordial na estratégia de promoção de todos os Caminhos para Santiago de Compostela”, porque “é aquele que, em termos económicos e sociais, tem tido um impacto mais significativo no concelho”.
“Não obstante sermos um território onde a maior parte dos Caminhos param e confluem, este Caminho Central é aquele que está na génese de promoção do Caminho porque é o mais antigo, onde há maior número de peregrinos e caminhantes”, acrescenta a autarca.
"A certificação é mais um passo, mais um meio para atingir esta estratégia e este objetivo que é o de criar condições para que este percurso, para este Caminho. A certificação vem reforçar essa identidade, vem valorizar este Caminho”, remata.