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“Ensemble 23”

JMJ. Jovem iraquiana: “Foi a fé que me manteve viva até agora”

24 jul, 2023 - 06:51 • Maria João Costa

São cerca de 50 os jovens que integram o “Ensemble 23”. O grupo multicultural vai participar em vários momentos da Jornada Mundial da Juventude. Entre os bailarinos está Sofia, uma jovem de 21 anos de nacionalidade iraquiana. Cresceu na guerra, sobreviveu às bombas que caiam enquanto estava na missa. Diz que Deus a “protege de todos os males”.

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O sorriso não deixa imaginar o que Sofia já viveu. Esta jovem iraquiana que está em Lisboa para integrar o Ensemble 23 que vai animar com dança vários momentos das cerimónias da Jornada Mundial da Juventude, conta como a fé foi o seu salvo conduto na vida até hoje.

Sofia nasceu no Iraque quando a guerra começou. Fugiu com a família para a Síria, mas aí também sentiu na pele o que era a guerra. De regresso ao Iraque, esta jovem católica que com a família pertence a uma minoria religiosa do país, sofreu a perseguição dos radicais do estado islâmico.

É tudo isto que Sofia traz na bagagem que a acompanhou até Lisboa. Para trás ficaram três aviões, e vários países entre o Iraque e Portugal. “Percorri toda esta distância para integrar esta equipa de dança”, conta-nos cheia de alegria numa pausa dos ensaios do Ensemble 23 que irá, entre outras coisas, dançar na cerimónia de acolhimento ao Papa Francisco a 3 de agosto.

Sentada nas escadas da Escola 2+3 da Galiza, no Estoril, onde decorrem os ensaios, Sofia conta à Renascença que “a viagem não foi fácil”, mas admite que vinha “focada num objetivo maravilhoso”. Ela sempre quis participar numa Jornada Mundial da Juventude e percebeu que tinha em Lisboa a sua oportunidade.

Sofia está agora a estudar Belas Artes em Londres e considerou que a dança poderia ser a forma de se juntar à Jornada de Lisboa. Para trás ficam tempos difíceis dos quais fala com um sorriso na cara.

“Atacaram a igreja onde ia” à missa

Aos 3 anos fugiu do Iraque para a Síria, mas não deixou de ouvir o som dos ataques, porque “dois a três anos depois começou a guerra”, conta-nos. “Atacavam as escolas e as igrejas onde estavam os cristãos. Atacaram a igreja onde eu costumava ir. Mesmo quando estava na missa ouvia bombas a caírem”, relata Sofia.

“As bombas caíram a poucos metros de mim, mas eu não fiquei ferida. Estava dentro da igreja e para mim aquilo foi um milagre”, explica Sofia que olha para a igreja como um local de segurança para si. “Sempre que estou na igreja, haja que barulhos houver, sai que estou bem amparada”.

Face à insegurança na Síria, onde enfrentou ameaças, a família de Sofia resolveu regressar ao Iraque, mas não encontraram a paz que procuravam. “Quando chegamos ao Iraque com vontade de começar uma nova vida do zero, o estado islâmico surgiu, começou a queimar as nossas aldeias. Pegou fogo às casas onde vivíamos”.

Sofia considera que mesmo na adversidade, ela e a sua família foram “abençoados”. “Muitas pessoas não sobreviveram. Nós tivemos apenas uma hora para abandonar a aldeia e acabamos por ter de regressar à Síria”, recorda.

Uma prova de superação

Passar por tudo o que passou foi nas palavras de Sofia “uma preparação para qualquer dificuldade que encontre na vida”. Esta rapariga de cabelos encaracolados diz que se sente “grata por acordar todos os dias, ver que estou viva e que tenho a oportunidade para estudar. Não tenho de temer que alguém possa magoar a minha família. Estou grata pelas pequenas coisas”.

Questionada sobre como é ser católica, pertencer a uma minoria religiosa, num país de maioria muçulmana, Sofia recorda as perseguições quando regressou ao Iraque e o país estava tomado pelos membros do estado islâmico.

“A minha família sempre que voltava a casa, e estávamos todos presentes, sentíamos que era uma bênção. Todas as manhãs, sempre que saiamos de casa beijávamo-nos, porque nunca sabíamos se iriamos voltar com vida a casa. Mas todos os dias rezávamos a Deus por estarmos bem e vivos” explica-nos Sofia.

Ter fé não é só ir à missa ao domingo

“A fé foi o que me manteve viva até agora na minha vida” admite Sofia. Depois de ter passado já por tudo o que viu e sentiu na pele, esta jovem iraquiana estabelece diferenças na forma como vê a religião e a espiritualidade a ser vivida entre os jovens.

“Para outros a fé é quando vão com as suas famílias ao domingo à igreja, ou têm de seguir certos rituais, acreditar em algumas coisas. Eu acho que todos temos diferentes formas de viver a fé”, explica-nos nesta conversa.

Sofia remata, no entanto, que “no final do dia, todos nós, sinto que estamos no mesmo patamar”, ou seja, há diferentes hábitos, mas o que os une é “pensar que Deus é bom e maravilhoso, que nos protege de todos os males, mas de diferentes formas”, remata.

O testemunho de Sofia aos jovens

Perguntamos a Sofia o que esta experiência fez dela e de que forma olha para os seus colegas de várias nacionalidades que integram o Ensemble 23. A jovem artista sublinha a importância do seu testemunho.

“Percebi que nem toda a gente tem esta experiência, por isso quero transmitir isto e mostrar às pessoas que elas têm uma boa vida e que devem estar gratas por isso e que Deus é bom”. Ela que se sente “abençoada” por poder dançar para o Papa Francisco em Lisboa, admite que gostava de poder continuar a viajar.

“A viajar aprende depressa muita coisa. Se estivesse sentada em casa, metida nas minhas coisas não aprenderia tanto”, explica Sofia que viajou para Portugal, um país que não conhecia antes e ao qual talvez gostasse de regressar depois da experiência da Jornada Mundial da Juventude

Sofia integra o grupo de 50 jovens do Ensemble 23 que está a trabalhar com a encenadora Matilde Torcato para participar em três momentos da JMJ, a cerimónia de acolhimento, a Via Sacra e a vigília no Campo da Graça.

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