01 jul, 2024 - 09:33 • Ângela Roque
A data para a canonização de Carlo Acutis não foi ainda anunciada esta segunda-feira. O Papa Francisco presidiu ao Consistório que aprovou a data de 20 de outubro para os restantes 14 novos Santos da Igreja (*) , mas a do jovem beato, que foi patrono da JMJ Lisboa, será posteriormente definida, informa o boletim diário do Vaticano. Segundo avança a agência italiana ANSA, deverá ocorrer durante o Jubileu de 2025.
Carlo Acutis nasceu em 1991 e morreu em 2006, com uma leucemia fulminante. Tinha apenas 15 anos. É considerado o padroeiro da internet, porque foi pioneiro no uso dos meios digitais para evangelizar. Criou um site dedicado aos milagres religiosos, e muitos dos vídeos que gravou podem ainda ser consultados no Youtube. A sua canonização ocorrerá numa época de grande desenvolvimento tecnológico e de enormes desafios, por causa da Inteligência Artificial.
Foi beatificado em 2020, em Assis, onde está sepultado, mas um segundo milagre atribuído à sua intercessão - a cura de uma jovem brasileira com uma doença rara no fígado – abriu portas à canonização, conforme anunciou o Vaticano em maio ultimo.
O padre Ricardo Figueiredo, atual diretor de comunicação do Patriarcado de Lisboa, é autor do livro ‘Não eu, mas Deus – Biografia espiritual de Carlo Acutis’ (2019), que escreveu já depois de terem sido aprovadas as suas virtudes heróicas, em julho de 2018.
Em entrevista à Renascença, transmitida este domingo, fala num “Santo especial”, por quem sente grande proximidade, já que são praticamente da mesma idade.
Como define Carlo Acutis?
É um Santo especial por isto: é o primeiro que mostra que é possível levar Deus a sério também no mundo da tecnologia, no mundo digital. Com os traços próprios da sua espiritualidade para esta época, mas surge como o Santo de calças de ganga, como está na sepultado. É um Santo de hoje, e a Santidade é para todos os tempos.
Nesse sentido é um exemplo ainda mais próximo para os jovens? De resto, ele foi um dos Santos patronos da JMJ…
É muito curioso vermos isto do ponto de vista da reflexão e da sociologia da religião... O fenómeno Carlo Acutis é o de um jovem que galvaniza, quer dizer, eu vejo a quantidade de grupos de jovens, crianças e miúdos que andam a aprofundar e a querer imitar o Carlo Acutis. Estes fenómenos vão surgindo na história da Igreja mais ou menos de 100 em 100 anos. Basta pensar há 100 anos, qual era o grande Santo sensação que encheu as igrejas? Foi Santa Terezinha do Menino Jesus, num mundo marcado pela I Guerra Mundial, o peso que teve a sua oração e a sua experiência em relação ao ateísmo que estava a desenvolver-se muito naquela época, ela encarna esta espiritualidade. Passaram 100 anos e quais são os desafios de hoje? É uma queda no materialismo filosófico, em que só o que é material é que conta, e aparece um Santo que vem testemunhar a força, a presença e o significado do sobrenatural. Isto é qualquer coisa de muito importante para a nossa época, por isso Carlo Acutis surge para os jovens de hoje como este grande desafio de levar Deus a sério e mostrar que é possível ser cristão também neste mundo (da tecnologia).
Como o Papa Francisco escreveu a respeito dele, o Carlo Acutis soube não cair na armadilha do individualismo, do fechamento a que tantas vezes as novas tecnologias podem levar. Ele foi capaz de verdadeiramente colocar tudo ao serviço e de perceber que o sentido da sua vida era na doação ao outro, por Cristo.
Carlo Acutis morreu há 14 anos e vai ser beatifica(...)
Foi a idade dele! Foi ele nascer em 1991 e eu em 90. Porque ele viveu os mesmos desafios, as mesmas dificuldades e as mesmas oportunidades que a nossa geração está a viver. Portanto, o que mais me marcou foi esta esta proximidade de um menino que, sendo da minha idade, soube viver de uma forma heróica tudo isto. Mesmo na questão da vivência do sofrimento e doença, como os enfermeiros contam, quando lhe perguntavam ‘como estás?’, ele a sofrer imenso, e a primeira resposta que tinha era um sorriso e depois dizia ‘estou bem’. Ofereceu tudo isto, todos esses sofrimentos pela Igreja e pelo Papa. Saber dar sentido e significado ao sofrimento é outra das suas marcas muito importantes.
Por isso Carlo Acutis é um desafio enorme - para a minha geração e para toda a Igreja - de viver para o sobrenatural num mundo em que os conflitos armados e as guerras tantas vezes nos mostram que só se olha para o umbigo, para as coisas materiais, para o capital. E Carlo Acutis mostra-nos que a nossa vida vale porque somos filhos de Deus e porque somos chamados à comunhão com Deus.
Que mensagem deixa a quem ainda não conhece ou sabe pouco sobre este que vai ser o novo Santo da Igreja?
O grande testemunho do Carlo Acutis é mostrar que a vida sobrenatural não é um luxo só para alguns, mas que é a nossa essência mais profunda, a nossa identidade mais profunda é vivemos para a realidade sobrenatural. Portanto, o grande desafio que deixo é procurarem: hoje ligamos o computador e temos tantos vídeos no YouTube sobre Carlo Acutis, e podemos ver as exposições que ele montou e idealizou na Internet. Este jovem soube verdadeiramente fazer a diferença porque levava Deus no seu coração, e porque levava Deus no seu coração quis também colocar Deus no coração do mundo.
(*) Entre os restantes 14 novos Santos que vão ser canonizados a 20 de outubro está José Allamano, fundador dos missionários da Consolata, que têm grande presença em Portugal; Marie-Léonie Paradis, religiosa canadiana que fundou as Irmãzinhas da Sagrada Família; Elena Guerra, fundadora das Irmãs de Santa Zita; e os mártires de Damasco – oito religiosos da Ordem dos Frades Menores, e três leigos, todos mortos por “ódio à fé” na Síria, entre 9 e 10 de julho de 1860.