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Caminho de Santiago. “Há um aumento exponencial do número de peregrinos em Portugal”

25 jul, 2024 - 07:30 • Henrique Cunha

Presidente da Federação Portuguesa do Caminho de Santiago revela que o Porto já é o segundo ponto de partida a nível mundial. Sarria, na provincia de Lugo, continua a ser o primeiro ponto de partida de quem faz o Caminho.

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A presidente da Federação Portuguesa do Caminho de Santiago (FPCS), Ana Rita Dias, diz que a escolha do Porto como ponto de partida coincide “com o momento em que as companhias low cost passaram a operar no Aeroporto Francisco Sá Carneiro”.

Nesta em entrevista à Renascença a propósito do Dia de Santiago, que se assinala esta quinta-feira, a responsável sublinha “a dinamização recente do Caminho da Costa” e ainda “um aumento da percentagem de peregrinos estrangeiros em relação aos nacionais”.

Criada em 2019, a FPCS considera fundamental “o apoio das entidades que tutelam a Cultura e o Turismo”, nomeadamente “através da abertura de linhas de financiamento especificas” que possam beneficiar “a multiplicidade de atores presentes no Caminho de Santiago”.

Ana Rita Dias alerta ainda para uma das principais dificuldades no apoio aos peregrinos em Portugal, em particular “a ausência de enquadramento legal claro no que se refere aos albergues de peregrinos”.

“Sem um enquadramento legal claro, não é possível incentivarmos a criação de albergues de peregrinos nos traçados portugueses”, assinala.


Nesta altura qual o percurso do Caminho mais procurado?

O traçado mais implementado em Portugal, com uma estrutura de hospitalidade, marcação e dinamização mais antiga é o chamado Caminho Central Português, que pode ter início no Algarve, em Lisboa ou no Porto, um pouco de acordo com a disponibilidade temporal do peregrino, e tem vindo a ser trabalhados pelas entidades públicas e associativas há décadas. No entanto, a dinamização recente do Caminho da Costa, a partir do Porto, foi fundamental para um aumento exponencial do número de peregrinos em Portugal, principalmente estrangeiros, e transformou o Porto no segundo mais importante ponto de partida, a nível mundial, coincidindo com o momento em que as companhias low cost passaram a operar no Aeroporto Francisco Sá Carneiro.

Outros percursos em Portugal, não sendo os mais procurados, têm público alvo específicos, que buscam, por exemplo, caminhos de maior autenticidade e contacto com o interior do país, percursos de introspeção e silêncio, trilhos com fundamentação em relatos históricos, ou percursos mais apelativos para fazer em bicicleta ou a cavalo.

E qual é principal origem dos peregrinos?

Nos vários traçados em Portugal, tem-se verificado um aumento da percentagem de peregrinos estrangeiros em relação aos nacionais. A Espanha ocupa sempre um dos primeiros lugares do pódio, mas dependendo do Caminho considerado, nacionalidades como a alemã, brasileira, italiana e holandesa chegam a superar o número de peregrinos portugueses, facto que demonstra a relevância internacional do fenómenos jacobeu em Portugal.

É possivel aferir a importância do Caminho na dinamização da economia local e na fixação de populações?

O rigor histórico na definição dos traçados, além de garantir a qualidade da experiência e a autenticidade da peregrinação, coincide na oportunidade de dinamizar territórios fora dos grandes centros urbanos, uma vez que o peregrino/ viajante calcorreia todas as localidades ao mesmo ritmo, no seu percurso até à Catedral Compostelana, atravessando cidades mas também vilas, aldeias e lugares. Perante o fenómeno jacobeu, todas as terras estão em pé de igualdade, não há localidades mais importantes ou com mais oportunidades, pois nelas passará, repousará e buscará alimento o peregrino. Desta forma, poucos projetos são mais importantes que o Caminho de Santiago na dinamização da economia local, seja empresas de animação turística, ou pequenos negócios na beira do caminho. Na Galiza, onde o fenómeno jacobeu tem já uma longa história de desenvolvimento sustentável, são inúmeros os exemplos de pequenas comunidades que viram reverter o decréscimo populacional, proliferar pequenos e médios negócios e dinamizar produtos locais tradicionais. Em Portugal, esses exemplos também já ocorrem, principalmente nos traçados mais percorridos.

O que é que ainda falta na promoção do Caminho?

A Federação Portuguesa do Caminho de Santiago, criada em 2019, tem feito um importante caminho ao trazer todas as entidades relacionadas com o Caminho de Santiago a um mesmo fórum, discutindo uma estratégia nacional para o Caminho de Santiago em Portugal. A estabilização dos principais traçados portugueses, de uma forma conjunta, e a partilha de desafios e soluções, tem permitido robustecer o projeto, principalmente o apoio ao peregrino no terreno, possibilitando uma promoção mais sustentada, em escala nacional, que possa dirigir-se a um público cada vez mais global. Para este processo, o apoio das entidades que tutelam a Cultura e o Turismo é fundamental, nomeadamente através da abertura de linhas de financiamento específicas, que possam beneficiar a multiplicidade de atores presentes no Caminho de Santiago, desde municípios, juntas de freguesia, associações, alojamento e restauração, operadores turísticos, paróquias, etc. A FPCS defende que a promoção deve ser conjunta, comunicando os vários traçados de peregrinação portugueses, e garantindo as devidas condições de hospitalidade em todo o território, ao invés de repartir caminhos, regiões, municípios e freguesias em estratégias de promoção pontuais e desarticuladas.

Há deficiências para colmatar ao nível das estruturas de apoio aos peregrinos?

Uma das principais dificuldades em Portugal é a ausência de um enquadramento legal claro no que se refere aos albergues de peregrinos, situação pela qual a FPCS se bate desde a sua criação, e resultou já, em boa hora, na discussão prévia de um primeiro diploma legal em preparação pelo Turismo de Portugal. Sem um enquadramento legal claro, não é possível incentivarmos a criação de albergues de peregrinos nos traçados portugueses, e na opinião da FPCS sem albergues de apoio aos peregrinos não há, verdadeiramente, Caminho. A hospitalidade jacobeia, o espírito de partilha, de tolerância e de troca de experiências e culturas são as características essenciais do Caminho de Santiago como Rota Cultural Europeia, e esse é o espírito do albergue de peregrinos.

Por outro lado, há uma preocupação crescente com a influência que as alterações climáticas estão a ter na manutenção dos trilhos pedestres, principalmente nos traçados mais rurais. Temos verificado, de ano para ano, um esforço crescente em manter os caminhos transitáveis, sendo necessário um esforço maior no corte de vegetação rasteira invasiva. Esta realidade tende a manter-se com o aumento das temperaturas e graus de humidade, o que será um desafio a encarar também na manutenção da infraestrutura para manter o caminho transitável e a sinalética visível..

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