20 dez, 2024 - 07:00 • José Pedro Frazão
O Patriarca de Lisboa admite está a ser feito um “esforço grande” para melhorar os salários, mas denuncia a fraca valorização do trabalho em Portugal. Em entrevista à Renascença, a propósito da quadra natalícia, D. Rui Valério diz que é preciso contornar uma “cultura de baixos salários”.
“Sempre me escandalizou o pouco valor que o trabalho tem em Portugal. Pouco reconhecimento traduz-se em baixos salários. Quanto aos últimos tempos, creio que Portugal está a fazer um esforço grande - é preciso admiti-lo - em todas as forças e instituições envolvidas, indiscriminadamente, seja de quem dá trabalho, seja de quem o promove, seja de quem o recebe”, afirma o Patriarca de Lisboa.
D. Rui Valério tem esperança no “incremento de adesão dos nossos jovens e adolescentes a uma autopromoção em termos profissionais e tecnológicos”, mas, por outro lado, manifesta insatisfação por ver universitários que levam o reconhecimento do seu esforço num diploma, mas têm de se contentar com os trabalhos possíveis.
Sobre o papel dos empresários, ressalvando ter pouca informação, sublinha as suas dificuldades “para fazer face a todo o esforço e a todas as despesas que têm”.
Para o Patriarca de Lisboa, o problema está muito mais a montante, na necessidade de definir “uma estratégia nacional para o país, em que definitivamente nos vamos empenhar em combater a pobreza e promover o desenvolvimento”. É preciso ir além das palavras no combate à pobreza, alerta o Patriarca, uma vez que as situações de pobreza, de carência e sofrimento “são muito propícias a grandes discursos, a grandes narrativas, a grandes propósitos que depois não passam do papel. Ficam meras intenções, ficam projetos adiados”.
Sem querer referir-se a episódios ou debates concretos, D. Rui Valério sustenta que a imigração deve ser encarada “como uma oportunidade e não como uma ameaça” pela sociedade portuguesa. O Patriarca de Lisboa deixa no ar uma interrogação sobre se está a ser feito o suficiente para que a imigração não seja um problema em Portugal.
“Já se fez alguma coisa para que da imigração, antes de ser sinónimo de problemática e dificuldade de integração, se diga que é grande oportunidade para Portugal na chegada destes irmãos, a chegada destas pessoas?”, questiona D. Rui Valério sem querer dar uma resposta à sua interrogação. Noutro plano, D. Rui Valério apela a Bruxelas para que desenhe apoios e estratégias para responder à crise na habitação…
“Aconselho, peço, solicito à União Europeia que esta problemática da habitação seja desenvolvida a partir de uma perspetiva que vem dessas instâncias, com apoio, com auxílio, com estratégias”, apela o Patriarca nesta entrevista em tempo de Natal na Renascença.
D. Rui Valério deixa ainda um apelo às instituições civis no contexto de um período de maior frio. “Como seria bom que houvesse uma campanha junto das grandes superfícies comerciais para disponibilizarem pelo menos alguma roupa ou algum utensílio que possa, de certa forma, trazer um conforto às pessoas”, sugere o Patriarca, assegurando que esse pedido já foi feito pela Igreja.
Em jeito de conclusão, o Patriarca de Lisboa insiste no objetivo “urgente” de criar em 2025 uma paróquia para os sem-abrigo, com pároco próprio, que permita um acolhimento “na dimensão espiritual – onde se sentem excluídas - e que consiga também acrescentar algum bem-estar à própria pessoa”. D. Rui Valério confirma o sonho de candidatar Lisboa à organização do Encontro Mundial das Famílias em 2030 – “um número redondo” – que conta por tradição com a presença do Papa.
“É um desejo e um sonho que tenho e devo-lhe dizer porquê. Primeiro, por uma razão muito prática, porque de facto nós somos já especialistas e competentes em acolher, organizar e gerir estes grandes acontecimentos. E em segundo lugar, porque o bom exemplo que temos, concretamente aqui em Lisboa, ao nível do sentido da importância da família, é razão bastante para que acolhamos aqui um acontecimento dessa índole”, explica D. Rui Valério que neste Natal, manifesta o desejo de ver uma sociedade que dê “mais liberdade, mais espaço, mais abrangência, mais mundo à felicidade e à alegria”.