15 fev, 2016 - 18:58
"No Portão da Eternidade", Vincent Van Gogh
Venceu o National Book Award em 2001, foi nomeado para um Pulitzer no ano seguinte e o “The Times” incluiu-o na lista dos 100 melhores livros da década. Editado em 2001, “O Demónio da Depressão – Um Atlas da Doença”, do escritor norte-americano Andrew Solomon, foi recebido com estrondo. Quinze anos depois, a obra é editada em Portugal.
O livro, cuja edição portuguesa tem 812 páginas, percorre a história de uma doença que Andrew Solomon classifica como “um mecanismo de desespero”.
Solomon, 53 anos, parte da ideia central de que a “depressão é a imperfeição do amor”, para depois organizar um “atlas da doença” ao longo da história, dos vários tipos de patologia, da análise de estatísticas e de entrevistas sobre a forma como a depressão é encarada, nas várias geografias, mas sobretudo com base no próprio caso pessoal.
“Para sermos criaturas que amamos, temos de ser criaturas capazes de desesperar com o que perdemos, e a depressão é o mecanismo desse desespero. Quando surge, degrada o indivíduo e acaba por eclipsar a capacidade de dar e receber afecto”, lemos no livro.
Solomon investigou e concluiu que a ciência, a filosofia, o direito, a psicologia, a literatura, a arte, a história e “muitas outras disciplinas” têm estudado a doença, mas que, no campo específico dos estudos da depressão, “faltava uma síntese”.
Não há duas pessoas com uma depressão semelhante
No “Atlas” de Solomon, são estabelecidas rotas e conclusões sobre os diferentes tratamentos, considerações detalhadas sobre os medicamentos utilizados, as distintas terapias e mesmo a dependência em relação a fármacos, tendo como base depoimentos e relatos que permitem perceber que “não há duas pessoas que tenham uma depressão semelhante”.
Nesse sentido, um dos aspectos mais interessantes da “pesquisa” de Andrew Solomon sobre a depressão é o estudo da doença em vários pontos do mundo – do Senegal ao Camboja, da Gronelândia aos países ocidentais.
“As características distintivas da depressão na Gronelândia não são o resultado directo da temperatura e da luz; são a consequência do tabu de não falarem acerca deles mesmos”, refere o escritor.
Além da “história” da depressão no Ocidente – da antiguidade clássica ao Renascimento –, o livro de Solomon preocupa-se também em "desmistificar" as eventuais causas sociais associadas à doença e relativiza as “supostas” ligações da depressão como causa de suicídio, assim como aprofunda as estratégias da indústria farmacêutica e a forma como o poder político lida com um problema que afecta milhões de pessoas, no caso dos Estados Unidos.
“As definições de depressão influenciam determinantemente as decisões políticas, que, por seu turno, têm influência em quem sofre. Se a depressão fosse uma ‘simples doença orgânica’, então deveria ser tratada como é tratada qualquer doença orgânica – as companhias de seguros deveriam cobrir os riscos de depressão grave da mesma forma que cobrem os riscos de cancro”, escreve Solomon.
Como a ferrugem corrói o ferro
Do ponto de vista pessoal, o escritor refere que a a depressão tem sido “mais ou menos” dividida em menor (leve) e maior (profunda).
A depressão leve é um facto gradual e, por vezes, permanente, “que desgasta as pessoas como a ferrugem corrói o ferro”. “Num caso [leve], é uma dor demasiado profunda para uma causa ligeira, um sofrimento que se sobrepõe a todas as outras emoções e as elimina. A depressão profunda é, ao mesmo tempo, um nascimento e uma morte: ambos são uma presença de alguma coisa nova e o total desaparecimento de qualquer coisa”, escreve Andrew Solomon, com base nos diagnósticos e nas notas dos casos de depressão que o afectam há longos anos.
“O diagnóstico é tão complexo como a doença. Os pacientes estão constantemente a perguntar ao médico: ‘Estou com uma depressão?’, como se o resultado fosse uma análise ao sangue. A única forma de descobrirmos se estamos deprimidos é ouvirmo-nos e observarmo-nos a nós próprios, para sentirmos os nossos sentimentos, e depois analisá-los”, indica o autor.