22 fev, 2017 - 09:27
Aos 71 anos, o músico Sérgio Godinho lança "Coração mais que perfeito". O seu primeiro romance tem quase o mesmo sabor do primeiro álbum, como um "dique criativo que se solta".
O livro, com selo da Quetzal, é apresentado no sábado no festival Correntes d'Escritas, na Póvoa de Varzim.
"Foi agora, porque foi agora. É como encontrar uma pessoa por quem, de repente, estás apaixonado e já a podias ter conhecido. Agora não me vejo tão cedo a prescindir da escrita, porque já me entrou na veia", disse à agência Lusa o escritor de canções.
Apesar de ser conhecido sobretudo pelos discos, que edita desde a década de 1970, Sérgio Godinho tem canalizado a escrita criativa por outros géneros, como teatro, argumento para cinema, ficção para crianças, poesia e contos.
Esta semana publica "Coração mais que perfeito" numa altura em que já terminou um segundo romance e tem em pausa a escrita de um terceiro, para poder compor canções para um novo álbum a editar no outono.
"É uma coisa um bocado viciante, criar personagens e ir à procura delas e elas te perguntarem para onde vão, o que é que são, porque é que estão a fazer aquilo, o que é que as impele", a propósito da escrita do romance.
O livro tem duas personagens centrais - Eugénia e Artur -, arranca com o suicídio de uma delas, recua no tempo para contar a vida da outra e prossegue no presente, já depois desse acontecimento traumático.
Eugénia é "uma mulher forte, mas não perfeita, com uma ética um bocado pessoal e que não segue muito os cânones", descreveu o escritor. Foi prostituta, abortou, viu morrer o marido e continua a amá-lo depois da morte.
"O livro tem poucas personagens, mas personagens com espessura. Todas elas têm alguma coisa de mim e não têm. Não é de perto nem de longe autobiográfico. As personagens são minhas amigas para sempre", sublinhou.
Sérgio Godinho disse ter encontrado prazer e disciplina em escrever todos os dias, ao final da tarde ou à noite, mas demorou dois anos a terminar este romance, acompanhando também o tempo narrativo, longo, da vida da personagem Eugénia.
"Quando me abalancei para isto sabia que ia escrever um romance. O tempo era já de um romance. Aquilo que escrevo vai sendo corrigido, não guardo versões anteriores. O que faço é olhar no dia seguinte e ver o que não ficou claro ou que pode se acrescentado", contou a propósito do processo criativo.
"Coração mais que perfeito" surge depois do livro de contos "Vidadupla" (2014) e do de poesia "O sangue por um fio" (2009).
"O meu tempo neste momento é mais o tempo do romance. Gosto desse amadurecer, gosto de descobrir o que é que há de inesperado num trajecto, no aparecimento de uma nova personagem, o que é que ela muda na tua vida", sublinhou o romancista.