08 out, 2019 - 12:01 • Maria João Costa
Venceu o Prémio Leya em 2014 quando publicou o seu primeiro livro “O Meu Irmão”, agora aos 29 anos, Afonso Reis Cabral vence o Prémio Literário José Saramago com o livro “Pão de Açúcar” editado em 2018 pela Dom Quixote, um romance baseado na história verídica de Gisberta, a transexual de 45 anos morta no Porto depois de dias de agressões de 14 menores.
Nas palavras do júri, constituído pela editora Guilhermina Gomes, a poeta Ana Paula Tavares, os escritores António Mega Ferreira, Nélida Piñon e a viúva de Saramago Pilar del Rio, “Pão de Açúcar” é uma história “com espesso e confuso mundo da memória e retira do esquecimento acontecimentos que os jornais e os relatórios da polícia tinham tratado de forma redutora e parcial com silêncios e omissões que o autor se propõe a revelar”.
O mesmo júri refere que o autor “desafia o leitor a novos olhares que as regras escritas e o rigor do texto impõem”.
'Pão de açúcar" é uma “história ácida acerca de seres plausíveis e autênticos” sublinhou Manuel Frias Martins na cerimónia desta manhã onde esteve presente a ministra da Cultura.
O prémio a Afonso Reis Cabral surge numa altura em que o autor, trineto do escritor Eça de Queirós tem um novo livro que resulta da viagem que fez a pé pela Estrada Nacional 2. A experiência, de 24 dias, de percorrer sozinho os 739 quilómetros que ligam Faro a Chaves está no livro “Leva-me Contigo”.
“Pão da Açúcar” passou pelo crivo da editora Maria do Rosário Pedreira, que já soma quatro autores com Prémio Saramago e que diz que o romance não desculpabiliza, mas tenta perceber o fenómeno da violência praticada por crianças institucionalizadas.
“O livro é uma forma não de explicar nem de desculpabilizar, mas de tentar perceber qual é o passado dessas crianças, porque é que essas crianças reagem de uma maneira violenta, ajuda também a perceber o que são as crianças institucionalizadas em Portugal, aliás a instituição onde estavam recebeu queixas e reclamações e fechou muito pouco tempo depois.”
Maria do Rosário Pedreira elogia o estilo característico de Afonso Reis Cabral. “O que define um autor a sério é ser reconhecível. O que me alegra muito é que de livro para livro vou reconhecendo coisas que são só dele e uma das coisas é essa atração pelo escuro, e por outro lado uma certa poesia na linguagem aliada a essas coisas escuras. É muito difícil falar de uma forma bela das coisas que são feias. Isso é que eu sinto que é uma das características mais presentes do estilo do Afonso.”
20 anos do Prémio José Saramago
Ao longo das últimas duas décadas, o Prémio Literário José Saramago tem posto em evidência uma biblioteca de qualidade de escritores lusófonos. Criado em 1999 pela Fundação Círculo de Leitores, o galardão pretendia distinguir autores do mundo lusófono com menos de 35 anos. Nos 20 anos do prémio foram anunciadas novas regras para as próximas edições. A editora Guilhermina Sousa confirmou que vão alterar a idade limite dos candidatos que passa assim de 35 para 40 anos.
O primeiro a vencer o Prémio Saramago foi o autor Paulo José Miranda com o livro “Natureza Morta” que está agora a ser reeditado pela editora Abysmo e que será apresentado no Festival Fólio.
Atribuído de dois em dois anos, o Prémio Saramago distinguiu em 2001 o livro “Sobre Nenhum Olhar” de José Luis Peixoto. O livro, nas palavras de José Eduardo Agualusa, apresenta “uma galeria de personagens atormentados (…) vencidos pela vida, e no entanto, capazes, como a certo ponto escreve o autor, de roubarem morte à morte”.
O Prémio Nobel da Literatura ainda era vivo e presenciou a atribuição do terceiro prémio José Saramago á brasileira Adriana Lisboa pelo livro “Sinfonia em Branco”, em 2003. Depois seguiu-se Gonçalo M.Tavares com o livro “Jerusalém” em 2005, “O Remorso de Baltasar Serapião” de Válter Hugo Mãe em 2007 e em 2009 “As Três Vidas” de João Tordo.
Já sem a presença de Saramago foram atribuídos os prémios com o seu nome em 2001 à brasileira Andréa del Fuego com o livro “Os Malaquias”, ao angolano Ondjaki pelo livro “Os Transparentes” e em 2015 a Bruno Vieira Amaral pela obra “As Primeiras Coisas”.
O último vencedor do Prémio Saramago foi o brasileiro Julián Fuks pela obra “A Resistência” editada em Portugal pela Companhia das Letras.
O Prémio Saramago tem o valor de 25 mil euros e foi entregue est terça-feira a Afonso Reis Cabral na sede da Fundação José Saramago em Lisboa.