03 abr, 2020 - 17:00 • Maria João Costa
A pouco mais de um mês de completar 97 anos, o ensaísta Eduardo Lourenço venceu nesta sexta-feira o Prémio Árvore da Vida – Padre Manuel Antunes. O júri atribuiu a distinção por unanimidade.
Este prémio, concedido pela Igreja católica através do Secretariado Nacional da Pastoral da Cultura, e com o apoio da Renascença, visa destacar o percurso e obra de personalidades que, além de atingirem elevado nível de conhecimento ou criatividade estética, refletem o humanismo e a experiência cristã.
Numa primeira reação, o ensaísta Eduardo Lourenço mostra “grande surpresa” com o prémio e ironiza dizendo: “Já não estou em idade para receber prémios”. Mas, por escrito, manifesta à Renascença “grande satisfação e honra” com esta distinção.
Explica o autor de “O Labirinto da Saudade” que essa satisfação e honra são, “não tanto” por si, “mas pela grande admiração” que tem pelo Padre Manuel Antunes, de quem diz ser “velho amigo” e “que sempre cultivou a exigência crítica e deixou uma obra notável”, a que Lourenço diz “voltar sempre com grande proveito”.
Segundo o júri, “desde há meio século, Eduardo Lourenço constituiu-se no mais reputado pensador português da atualidade”.
O ensaísta nascido em São Pedro de Rio Seco, em Almeida, no distrito da Guarda, dá uma “atenção compreensiva e crítica aos problemas culturais e sociais emergentes no mundo contemporâneo” e assume uma “renovadora mitografia do ser lusíada”.
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Autor de obras como “Heterodoxia”, diz o júri que a “obra ensaística” e a escrita de Eduardo Lourenço são “de rara qualidade literária” e revelam “a qualificada condição de filósofo” e uma “fecunda questionação da sua circunstância nacional e internacional”.
O júri desta edição foi constituído pelos bispos D. João Lavrador, presidente da Comissão Episcopal da Cultura, Bens Culturais e Comunicações Sociais; D. Américo Aguiar, presidente do Conselho de Gerência da Renascença; o padre António Trigueiros, S.J.; a académica Maria Teresa Furtado; Guilherme d’Oliveira Martins, administrador da Fundação Gulbenkian; e José Carlos Seabra Pereira, da Pastoral da Cultura.
Dado o momento atual de estado de emergência, as reuniões de júri foram mantidas em modo virtual.
No comunicado do júri é destacada a “educação familiar católica” de Eduardo Lourenço que “nunca renegou os princípios e os ditames do humanismo cristão”. Pode ler-se mesmo que “Eduardo Lourenço sustentou sempre, com desassombro e brilho, que a sua demanda de Conhecimento se queria coerente com o horizonte da «vivência mesma da Verdade» e que nela obedecia, «por temperamento e por formação espiritual», à «única motivação radical» que «finalmente é como decisão de ordem “religiosa" e mesmo "mística" [...] que melhor se compreenderá» («Segundo Prólogo sobre o Espírito de Heterodoxia»)”.
Apaixonado pela poética de Fernando Pessoa ou a escrita de Antero de Quental, Eduardo Lourenço é, segundo o júri, alguém que tem uma “radicalidade pensante”, na qual “decorreu o confronto inquieto com o sentido do trágico, em autores que particularmente o atraíram (como Antero de Quental) e na perspetivação do seu próprio destino”.
“Há dias em que madrugamos e julgamos que vamos apanhar Deus. Em vão: Deus levanta-se sempre mais cedo!...” – a frase de Eduardo Lourenço é sublinhada pelo júri no seu comunicado.
“O Labirinto da Saudade” é uma adaptação da obra h(...)
Em declarações à Renascença, D. João Lavrador, presidente da Comissão Episcopal da Cultura, Bens Culturais e Comunicações Sociais, refere que o ensaísta é um verdadeiro “humanista cristão”, preocupado constantemente com o valor da “verdade”.
O Prémio Árvore da Vida – Padre Manuel Antunes costuma ser entregue na reunião da Pastoral da Cultura, mas este ano, dado o atual quadro de crise pandémica, esse encontro não terá lugar. Ainda não há data para a entrega do prémio – uma escultura da autoria do artista Alberto Carneiro.
Em edições anteriores, a Árvore da Vida – Padre Manuel Antunes distinguiu personalidades como o poeta Fernando Echevarría, o cientista Luís Archer S.J., o cineasta Manoel de Oliveira, a classicista Maria Helena da Rocha Pereira, o político e intelectual Adriano Moreira, o trabalho de diálogo entre Evangelho e Cultura levado a cabo pela Diocese de Beja, o compositor Eurico Carrapatoso, o arquiteto Nuno Teotónio Pereira, o pedagogo Roberto Carneiro, o jornalista Francisco Sarsfield Cabral, a artista plástica Lourdes Castro, o professor de Medicina e Bioética Walter Osswald, o ator e encenador Luís Miguel Cintra; o ator Ruy de Carvalho e no último ano, o historiador José Mattoso.