Siga-nos no Whatsapp
A+ / A-

​Portugal/Angola: “Não se pode continuar sem diálogo e pedido de perdão”

18 mar, 2021 - 15:49 • Maria João Costa

O ativista político Luaty Beirão e o músico luso-angolano Pedro Coquenão lançaram um projeto musical. O disco que mistura eletrónica, hip-hop e música tradicional angolana estreia-se com o tema “Pele” que aborda o racismo

A+ / A-

Chama-se Ikoqwe e é um novo projeto musical que junta dois artistas luso-angolanos, o rapper e ativista político Luaty Beirão, que assina com o nome Ikonoklasta, e Pedro Coquenão, de nome artístico Batida.

A dupla estreia-se com a fusão dos dois nomes na palavra Ikoqwe, num disco tem como título “The Beginning, the Medium, the End and the Infinite”. Lançado este mês, pela editora belga Crammed Discs o disco reflecte o encontro destes dois artistas que há muito se conhecem e queriam trabalhar juntos num álbum.

Ao programa Ensaio Geral da Renascença, Pedro Coquenão explicou que este encontro de artistas vai para lá da música. Além de amigos, os dois músicos de origem angolana tinham vontade de criar um projeto juntos e isso começou a ser feito há dois anos.

“A ideia de Ikoqwe surgiu há coisa de dois anos atrás. Já tínhamos feito muita coisa, músicas pontuais, mas nunca tínhamos feito nada assim, essencialmente musical e de palco”, conta Coquenão, numa entrevista à distância em que explica ainda que criaram dois personagens, uma espécie de alter egos a que deram voz.

“Elaboramos estes dois personagens que são o Iko e o Qwe que caíram do espaço já algum tempo e andam sempre juntos. São o reflexo de nós, mas são um bocadinho mais do que isso, porque têm vida própria”, revela Pedro Coquenão.


Estas duas personas musicais dão corpo ao projeto e cantam as suas impressões à chegada a este planeta. Nas letras estão os olhares críticos dos dois artistas luso-angolanos.

“As letras do Luaty [Beirão], ao início, eram mais rap e sobre ele próprio, mas depois rapidamente começaram a falar sobre o continente. Há uma letra que fala sobre a chegada das galeras e de como houve um engano ali na troca e no intercâmbio, houve ali um desnível”, conta Coquenão, que, sobre uma das suas músicas, o tema “Bazuca”, explica que “fala sobre a transição da guerra da independência para a guerra civil” em Angola.

Os temas atuais como a colonização, o racismo são algumas das bandeiras destes ativistas músicos que quando se juntam tanto falam de “palermices” como de “notícias que são impactantes” nas suas vidas, diz Pedro Coquenão.

O disco que conta com colaborações de Celeste/Mariposa, Octa Push e Spoek Mathambo e mistura vários ritmos, incluindo música tradicional angolana, olha de forma crítica os temas da História.

Pedro Coquenão fala numa necessidade de diálogo atual para sarar feridas do passado. O músico considera “utópico” continuar a viver deixando para as gerações futuras coisas do passado por resolver.

Sobre a relação Portugal-Angola, Coquenão refere: "há de facto coisas para serem resolvidas. Nós parecemos um bocadinho aqueles pais que se divorciaram ou aquela família que se chateou e tenta resolver essa desavença, esse mau passado não falando e continuando a fazer jantares de Natal. Torna-se utópico. Para mim é o contrário. Não se pode continuar a avançar sem haver uma conversa que não tem de ser formal, mas que pode começar por um pedido de perdão bastante cordial e bonito. Pode passar por uma série de coisas e passa essencialmente por haver um diálogo ao mesmo nível”, aponta o músico que nasceu no Huambo, em Angola e cresceu nos subúrbios de Lisboa.

Racismo e a pele dos músicos Luaty Beirão e Pedro Coquenão

No disco que agora lançam, Luaty Beirão e Pedro Coquenão têm um tema single, intitulado “Pele”, que fala sobre a questão do racismo. A música foi de resto “a primeira vontade” que tiveram de “escrever uma história juntos” para o disco.

“'Pele' surgiu em conversa, ao olhar para um tambor e olhar para a pele e olhar para uma palavra e descodificá-la, desmontá-la. A pele é vista como um fator de tensão nesta altura. A cor da pele é completamente inflacionada a todos os níveis. Claro que há uma história que temos que aceitar e discutir”, diz Pedro Coquenão.

Segundo o músico, este tema mostra a estranheza que os dois alter-egos musicais dos artistas sentiram ao chegar a um planeta onde reparam “haver uma diferenciação entre seres apenas pela cor da pele”. Pedro Coquenão, que diz ter “um nariz enorme”, lembra que “há coisas bem mais grosseiras que provocam o espanto” e chamam mais à atenção do que a cor da pele.

O disco de Ikoqwe já está disponível em formato de LP, CD e nas plataformas digitais.

Comentários
Tem 1500 caracteres disponíveis
Todos os campos são de preenchimento obrigatório.

Termos e Condições Todos os comentários são mediados, pelo que a sua publicação pode demorar algum tempo. Os comentários enviados devem cumprir os critérios de publicação estabelecidos pela direcção de Informação da Renascença: não violar os princípios fundamentais dos Direitos do Homem; não ofender o bom nome de terceiros; não conter acusações sobre a vida privada de terceiros; não conter linguagem imprópria. Os comentários que desrespeitarem estes pontos não serão publicados.

  • Sabem muito
    22 mar, 2021 Mas andam a pé 17:50
    Sim, claro. Pede-se "perdão" e depois fica-se à espera das centenas de milhares de processos contra o Estado Português a pedir "indemnizações" pelo "holocausto colonialista" ... Vocês, sabem muito...
  • Não gostam?
    19 mar, 2021 Desandem 09:44
    Dialoguem vocês nos vossos Países de origem, onde quem protesta ou aparece morto ou tem de andar bem escondido e quanto ao pedido de perdão... Esperem sentados

Destaques V+