23 jul, 2021 - 06:30 • Sandra Afonso
Informação é poder, seja quando estamos a negociar um novo salário, numa discussão de futebol entre amigos, a comprar carro ou a assistir a um debate político. O que nos dizem não é suficiente, mas há mais informação disponível, se a soubermos ler.
Nem os constrangimentos impostos pela pandemia, como a máscara, são impedimento, garante Alexandre Monteiro. “Dizem que com a máscara não conseguem ler a pessoa. Aquela zona da cara é 0.01 da informação que nós emitimos de forma inconsciente”, diz à Renascença o especialista em linguagem não verbal.
No segundo livro agora publicado, “Torne-se um Decifrador de Pessoas” (Editorial Planeta), Alexandre Monteiro explica como aplicar as ferramentas da espionagem na criação de “profiles”, para conhecer as pessoas, “as suas necessidades, os seus medos, as suas intenções, através de todas as pistas possíveis deste mundo não verbal: desde o corpo, a forma de vestir, a forma de comportar, o que é que tem em casa, como é que está o carro, que anéis é que usa, o tipo de sapatos, o tipo de penteados”.
Alexandre Monteiro ajuda a decifrar as pistas que nos rodeiam e a “criar o perfil da pessoa”. Partilha ainda “todas estas técnicas que se usa no mundo da espionagem para influenciar pessoas, para sermos ainda mais líderes, para conseguirmos interrogar melhor, seja numa entrevista de trabalho, seja o nosso parceiro ou parceira, seja no nosso grupo de amigos”.
Em entrevista à Renascença, o especialista diz que “este é o código que a espionagem usa, que a maior parte das pessoas nem sabe que existe. Eu traduzi este código para usarmos no nosso dia a dia”.
São “métodos e técnicas ensinados pelas maiores escolas de espionagem mundiais (como CIA, FBI, Mossad, MI6), e pelos melhores especialistas em comportamento humano (como psicólogos, especialistas em inteligência militar, neurobiólogos, metalistas e neurologistas).”
Podemos recolher informações em tudo, não há uma pista, um gesto, uma característica, “o conjunto é que é poderoso”, segundo Alexandre Monteiro.
“A forma como a pessoa mexe com as mãos, o que faz com os dedos, como é que sorri, que tipo de rugas é que tem, como é que mexe os pés, onde é que se coça, tudo isto vai-nos dar caminhos para o perfil.”
Ainda assim, as mãos são a pista preferida de Alexandre Monteiro, “porque estão constantemente a comunicar: segurança, liderança, insegurança, opinião contrária, tensão emocional, agressão”, explica.
Quem mexe muito as mãos, é mais emocional, quem mexe pouco, é mais analítico. Falar com os dedos afastados revela uma pessoa subjetiva, relativa ou de ideias mais abstratas. Falar com os dedos juntos indica uma pessoa racional e cética.
Quem aponta o dedo tem tendência para ser mais impulsivo e agressivo, normalmente gosta mais de controlo e de domínio. Segundo Alexandre Monteiro, “há muitos políticos que substituem o dedo indicador pelo polegar, para retirar agressividade ao gesto”.
Quem esconde o polegar, com as mãos nos bolsos ou um cruzar de braços, sente-se inseguro ou ameaçado.
Os mais autoritários tendem a falar com as palmas das mãos para baixo, virar as palmas das mãos uma para a outra é sinal de teimosia e de quem não quer ser confrontado.
“Normalmente dizemos que são a janela da alma, mas o que podemos ler nos olhos são as pupilas: quando dilatam é sinal de interesse ou de medo, quando contraem é sinal de desinteresse”, diz Alexandre Monteiro.
Além de não revelarem muita informação, “como somos uma cultura com os olhos muito escuros, é muito mais difícil lermos as pupilas”, acrescenta o especialista.
Em alternativa, “as sobrancelhas falam muito mais do que os olhos. A testa fala muito mais do que os olhos”, garante o autor, que deixa exemplos: “aquelas pessoas que fazem muitas vezes as sobrancelhas em V, normalmente recorrem mais à expressão de raiva, são mais competitivas, mais de desafio. Se as sobrancelhas estão mais abertas, criando um espaço no meio, são pessoas mais amigáveis”.
Porque nem sempre temos acesso à melhor informação, tudo o que está disponível deve ser bem aproveitado. Tudo é mesmo tudo. Desde o tipo de calçado e vestuário, até às cores, o estado da casa e do carro e o cuidado com objetos diários como o telemóvel.
Só no carro é possível reunir várias informações sobre quem o utiliza. “Para percebermos como é que a vida da pessoa está, basta olhar para a zona da porta onde costumamos guardar tudo, a porta do condutor: se está mais desarrumada, se tem muitas contas, que papéis é que lá tem, se tem lá livros, se está muito sujo. Olhando para aquela zona do carro nós conseguimos perceber muito mais sobre a pessoa e como é que ela organiza a sua vida”, diz Alexandre Monteiro.
Mas não fica por aqui. É ainda possível “perceber se a pessoa é mais cuidadora, mais organizada e mais meticulosa pelas frinchas dos bancos, se têm sujidade e migalhas. Se a parte de trás está mais suja que a parte da frente indica crianças, se a pessoa não cuida daquelas pancadinhas no carro quer dizer que é uma pessoa menos preocupada com os bens materiais ou então é mais desmazelada”.
Até os autocolantes que alguns colam nos carros dizem mais do que o que se pensa. Se forem de clubes ou associações, por exemplo, indicam “uma pessoa de tribo”, se têm caras más, revelam “pessoas mais competitivas”.
Saber interpretar a informação que nos rodeia é também uma ajuda para evitar agressores e lidar com situações de conflito.
Alexandre Monteiro identifica várias pistas visíveis, mais simples, ao nível do contacto físico, que permitem identificar potenciais agressores:
- Quando a pessoa está a falar connosco, olhar para as mãos: se enquanto fala fecha o punho, é um sinal de pré-agressão, quer dizer que o corpo está a preparar-se para agredir;
- Se as sobrancelhas começarem a ficar em V e semicerrar os dentes, também são sinais de agressão, ou tentativa, há esta vontade de o fazer;
- Se em vez de ter os pés numa posição normal, afasta o pé dominante e a mão dominante para ganhar balanço para bater.
Ao nível da manipulação, há a chamada microexpressão facial de desprezo, quando sorrimos unilateralmente: “indica superioridade e pode indicar manipulação em contexto de negociação, ajuda ou compra”. “Muito cuidado com este tipo de pista”, avisa este especialista.
O enrolar de olhos também indica superioridade, não valorizar o que o outro está a apresentar ou a dizer: “também é uma boa pista de sentimento de superioridade, manipulação ou falta de consideração”, acrescenta.
Em sociedade acabamos também por nos cruzar com as chamadas pessoas tóxicas. Primeiro é preciso identificar os sinais, porque muitas vezes nem percebemos que estamos perante este tipo de pessoas, e existem diferentes versões:
- A que está sempre a desdenhar, o objetivo desta pessoa é ser melhor e para isso tenta descredibilizar os outros: "não é bem assim", "tu pensas que é fácil", "eu sou a melhor";
- A que desconfia de tudo, não de forma cética de quem quer aprender, pelo tom percebemos que a intenção é desvalorizar e descredibilizar: "quem é que disse isso?", "onde é que aprendeste isso?", "essa escola não presta para nada";
- A que está sempre a desafiar tudo o que fazemos, na base da intimidação: "vais ter consequências", "estou a passar-me contigo", "o que dizes não serve para nada", "vais ficar de castigo";
- A do poder dominante, ela é que pode, ela é que quer.
“Todos estes tipos de pessoas tóxicas impedem o nosso crescimento e o objetivo é valorizarem-se a elas próprias e não ajudar a outra pessoa a ser melhor ou orientá-la. Porque, muitas vezes as pessoas tóxicas vêm de uma insegurança. Quanto mais tóxicas são, mais inseguras são”, defende António Monteiro.
Numa conversa, entrevista ou debate é ainda muito útil detetar mentiras.
Quando se conhece bem o outro, basta procurar comportamentos anómalos.
Se não for o caso, deve ficar atento a desvios de olhar e mais demora em responder, repetir a pergunta, responder com outra pergunta, tendência para descredibilizar e minimizar o assunto, a vitimização, omitir informação e dramatizar.
Alexandre Monteiro chama ainda a atenção para curiosidades como as cores da roupa e assessórios.
Entre as piores opções está o amarelo, considerado demasiado emocional para o trabalho; o cinza, transmite passividade e falta de energia; e o roxo, em exagero, cria a perceção de arrogância e distância.
Se quiser fazer figura, opte pelo vermelho, que emite poder e energia; o preto, que transmite liderança e é adelgaçante; ou o azul, ideal para ambientes de trabalho agitados e tensos porque tem um efeito calmante.