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​"Será um pingue-pongue celeste" até Júpiter, diz português na missão Juice

12 abr, 2023 - 19:12 • Pedro Mesquita

O engenheiro aeroespacial Bruno Sousa, que trabalha há 20 anos na Agência Espacial Europeia, explica que esta será uma longa viagem de oito anos. Um dos alvos é a lua de Ganimedes, que pode ter condições para o desenvolvimento de vida.

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QUA BRUNO SOUSA

A Agência Espacial Europeia (ESA) lança, esta quinta-feira, a partir da Guiana Francesa, um satélite em direção a Júpiter. A missão JUICE pretende detetar a existência de condições de vida nas Luas do planeta gasoso, 11 vezes maior do que a Terra.

A hipótese mais provável é que "sejam ambientes habitáveis", diz à Renascença o diretor de operações de voo da missão JUICE.

O engenheiro aeroespacial português Bruno Sousa, que trabalha há 20 anos na Agência Espacial Europeia, explica que esta será uma longa viagem de oito anos, com uma rota particularmente curiosa: O satélite deverá cumprir uma espécie de "pingue-pongue celeste", aproveitando os empurrões que lhe serão dados pela gravidade da Terra e de Vénus. A ideia é garantir, pelo caminho, a energia suficiente para alcançar a órbita de Júpiter, em 2031.

Que missão é esta? Qual é o principal objetivo da JUICE (JUpiter ICy moons Explorer)? Em português será qualquer coisa como “explorador das luas geladas de Júpiter?

Sim. É uma missão para explorar o sistema joviano, sistema de Júpiter e as suas luas. Estas luas são planetas que estão cobertos de gelo, mas debaixo da sua superfície, há água e este sistema joviano recebe bastante energia do planeta.

Portanto, havendo energia e havendo água, há condições para haver vida. E o que a missão vai fazer é explorar se essas condições estão presentes e se são, de facto, ambientes habitáveis.

Antes da partida, diria que existem essas condições?

Acredita-se que sim. A lua em que, no fim da missão, vamos entrar em órbita é Ganimedes. Nesta lua há um campo magnético próprio. Portanto, além da Terra é o único corpo celeste que tem um campo magnético próprio, dos planetas de formação rochosa. Tem energia e tem água no estado líquido. Portanto, imagina-se que sim. A hipótese mais provável é que os ambientes sejam habitáveis.

Agora, se há de facto vida ou não, saberemos daqui a oito anos, quando a missão chegar a Júpiter. Nós não conseguimos ir numa trajetória direta daqui da Terra… não há nenhum foguetão que tenha a potência necessária para injetar a sonda na trajetória direta. Ou seja, vamos ter que fazer um “pingue-pongue celeste”. Vamos ter que ganhar energia com os planetas Terra e Vénus para poder chegar a Júpiter, e isso vai demorar alguns anos.

Explique-me melhor como vai ser esse “pingue-pongue” para chegar até Júpiter, em 2031.

Partimos da Terra e voltamos à Terra um ano depois. A gravidade da Terra, vai dar-nos um empurrão que nos irá colocar numa trajetória para Vénus. Vamos passar em Vénus, e apanhar também um empurrão da gravidade de Vénus, que nos vai pôr numa trajetória de volta para a Terra, onde vamos passar mais duas vezes até garantirmos a energia suficiente para atingir Júpiter.


Na prática vão acumulando energia. É quase como se fosse uma bateria.

Exatamente. Vamos transferindo a energia do planeta para nós, a energia orbital.

Enquanto diretor de operações de voo, o que é que faz? É uma espécie de comandante de um navio, mas a partir da Terra?

Exatamente. Eu sento-me aqui, nas traseiras da sala, onde tenho uma visão privilegiada sobre o que está a passar. Há aqui várias equipas que estão a trabalhar. À minha frente está a equipa que controla o satélite, propriamente dito. Portanto, eles são os marinheiros na sua analogia. E quando há algum problema, alguma situação crítica em que uma decisão tem que ser tomada, eu estou aqui para tornar disponíveis os recursos necessários, e ajudar a tomar as decisões difíceis.

Porque é que foi convidado para ser o diretor de operações de voo? É porque já tem muita experiência nesta área?

Sim. Trabalho na Agência Espacial Europeia há 20 anos. Sou chefe de operações da “Missão Cluster”, que são quatro satélites a voar em formação. Também tenho mais duas missões que estão atualmente a voar. Uma está a voar perto do Sol e outra que está a caminho de Mercúrio. Quando é assim, há um dia em que nos vêm bater à porta e dizem: “Olha, não nos queres ajudar aqui a lançar o “JUICE” para Júpiter?” Foi o que aconteceu.

Não sente que é uma espécie de drone que está telecomandar a partir da Terra?

Pois é. Realmente é como se fosse uma sonda telecomandada…

Haverá imagens transmitidas para a Terra, ao longo da viagem?

Sim, sim. Logo a seguir ao lançamento, algumas horas depois do lançamento. Vamos fazer o “downlink” das imagens que o satélite vai tirar, no momento em que desdobrar os painéis solares. Ele tem uns painéis solares bastante complexos, com 27 metros de comprimento de ponta a ponta, são 85 m². O desdobramento é um processo complicado e para isso instalaram-se duas câmaras para tirar fotografias e para podermos verificar se os painéis solares foram desdobrados.

Como é que imagina a chegada a Júpiter e, se calhar ainda, com mais entusiasmo a Ganimedes, uma das luas geladas onde, como dizia, podem existir condições de vida?

A chegada vai ser interessante. Nós vamos chegar com uma velocidade relativa, em relação a Júpiter, que é bastante elevada. Portanto, vamos ter que fazer uma manobra de travagem para alinhar a nossa velocidade com a Júpiter.

Terá que ser uma manobra suficientemente grande para que a gravidade de Júpiter nos apanhe, e nos deixe ficar em órbita. Bom, e depois, ao longo do tempo, vamos ter de ir ajustando essa órbita de forma a aproximar-se sucessivamente das luas de Júpiter. Será uma fase bastante complexa, bastante crítica, e muito interessante.

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