21 jun, 2023 - 16:21 • Maria João Costa
“Graffiti é uma arte, e se arte é um crime, que Deus nos perdoe”. A frase faz parte de uma das instalações criadas por Lee Quiñones, uma das lendas do grafitti norte-americano que integra a exposição “Urban (R)evolution” patente a partir de hoje, e até 3 de dezembro na Cordoaria Nacional, em Lisboa.
O artista norte-americano que privou com nomes como Jean-Michel Basquiat ou Keith Haring percorre a exposição, de ténis brancos salpicados de tinta. Entusiasmado com a mostra que conta a história da arte urbana nacional e internacional, Lee, como é conhecido, recorda episódios da sua vida, dos dias por exemplo em que o icónico Keith Haring partilhou consigo uma parede para ser grafitada.
Na exposição que mostra o trabalho de 18 artistas de diferentes gerações revela-se o percurso desde a década de 1970 até aos dias de hoje. Promovida pela Everything is New de Álvaro Covões, a exposição tem a curadoria de Pauline Foessel e Pedro Alonzo.
Numa espécie de caixas, os artistas deram espaço à sua imaginação e criaram especificamente para esta exposição algumas obras. Exemplo disso é o trabalho de VHILS que explicou que fez uma obra em que “trouxe três histórias, de três rostos” que fez em diferentes cidades.
Trata-se de uma criação que reflete sobre a relação das pessoas com o meio onde vivem e crescem, e o que as “define”. “A coisa interessante de ter feito todos estes projetos nos últimos anos e estar em diferentes cidades, é perceber que, apesar das nossas diferenças, as lutas nestas cidades são comuns”, explica VHILS que remata que o mais interessante é “uma reflexão sobre a nossa resiliência e da luta nas nossas rotinas de conseguirmos superar as lutas”.
Entre os artistas portugueses presentes com trabalhos originais estão ±MaisMenos±, Akacorleone, Nuno Viegas, Obey Sktr, Wasted Rita ou Add Fuel. Este último, que dá pelo nome de Diogo Machado trabalha sobre a arte dos azulejos portugueses e criou a instalação “Núcleo” para a Cordoaria. “O meu trabalho tem sido desenvolvido há cerca de 13, 14 anos à volta da reinterpretação o azulejo português e quis criar algo que representasse o meu trabalho nos vários formatos”, do stencil e do spray ao azulejo explica o artista
No meio do trabalho em tons de azul e branco Add Fuel admite que “acorda todos os dias a ver azulejos por todo o lado” e convida os visitantes a entrarem dentro da sua instalação que no meio do “Núcleo” tem um chão em espelho que pode provocar vertigens aos mais sensíveis.
Outra das obras portuguesas é de Januário, o artista mais conhecido pela sua assinatura ±MaisMenos±. Trata-se de uma peça composta por vários televisores que no centro mostram quadros digitais de mercados financeiros. À volta, outras televisões mostram o mundo em que vivemos e fazem também uma espécie de percurso do artista. Januário explica que quis refletir sobre “o mundo mais ou menos. É uma peça para questionar este mundo baseado nos mercados”
Shepard Fairey é considerado um dos mais importantes artistas gráficos e urbanos contemporâneos e mostra a sua mais recente criação nesta exposição em Lisboa. No meio de paredes vermelhas, brancas e pretas onde introduzi-o também o azul, o artista explica que já foi preso mais de 16 vezes por fazer o que faz.
Um dos seus trabalhos surge numa fotografia, em que o vemos empoleirado em cima de um escadote que está no tejadilho de um carro e pintar um dos cartazes que carateriza o seu trabalho.
A pare de Shepard Fairey, em Lisboa poderá também ver recentes criações de artistas como o espanhol Felipe Pantone que faz uma instalação colorida a três dimensões e que cria no visitante a ideia de entrar num espaço digital. Também artistas como Futura ou Jason Revok expõe nesta mostra que reúne artistas que trabalham habitualmente no espaço público.
Pedro Alonzo, o curador faz questão de sublinhar o lado mais livre desta exposição. O fator “surpresa”, como lhe chama levou a que os curadores “não soubessem o que os artistas iam fazer”. A única certeza que tinham é que “os artistas iriam responder ao espaço” da Cordoaria Nacional.
No extenso edifício da Cordoaria Nacional, a par de obras criadas de propósito para a exposição, surgem fotografias de Martha Cooper que ao longo dos anos foi registando os trabalhos de grafitti e arte urbana, obras muitas delas efémeras que não fora serem fotografadas pela lente de Cooper, hoje já não haveria registo delas.
As imagens mais antigas revelam os primórdios da arte urbana, numa altura em que Noa Iorque passada uma crise inflacionista grave a pare de uma degradação da situação social que fez espoletar a cena artística. Carruagens de metropolitano grafitadas, crianças pobres a brincarem nas ruas são algumas das fotografias que Martha Cooper documentou.
Mas esta fotografa não parou na década de 1970. Continua ainda hoje a fotografar e registou obras recentes da dupla brasileiros os Gémeos ou um trabalho de VHILS em Rabo de Peixe, nos Açores.