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Arte em São Bento: 40 obras que são uma provocação à política

04 out, 2023 - 09:00 • Maria João Costa

A residência oficial do primeiro-ministro inaugura nestya quarta-feira e abre ao público amanhã, 5 de outubro, mais uma edição da Arte em São Bento. Nas paredes são mostradas 40 obras de 33 artistas nacionais da Coleção Manuel de Brito, o fundador da Galeria 111, espaço que está a completar 60 anos.

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Escolher que obras se penduram nas paredes da residência-oficial do primeiro-ministro não é um simples exercício de decoração, e a prová-lo está o trabalho que o curador Sérgio Fazenda Rodrigues fez em mais uma edição da Arte em São Bento que é inaugurada dia 4 de outubro, por António Costa.

No Palacete de São Bento é mostrada uma parte da Coleção Manuel de Brito, o acervo construído pelo galerista, já desaparecido, da Galeria 111 que em 2024 completa 60 anos. O espólio, explica o curador tem “mais de duas mil obras listadas”.

A escolha não foi fácil, mas Sérgio Fazenda Rodrigues explica, na visita à imprensa onde a Renascença marcou presença que “as obras não são uma simples ação de decoração do espaço, são sim a construção de um fio condutor que guia de local em local” e onde, nas palavras do curador há “um olhar provocador para a questão da política e da sociedade”.

Deste acervo saíram muitas obras que em alguns casos, são peças iniciáticas das carreiras de alguns artistas, já que Manuel de Brito manteve ao longo dos anos uma “relação de proximidade” com os artistas, indica Sérgio Fazenda Rodrigues.

“É uma coleção feita de proximidades, ou seja, que foi nascendo e consolidando-se a partir de relações de amizade e proximidade com os artistas”, sublinha o curador que elegeu do acervo nomes cimeiros da arte contemporânea portuguesa.

Entre eles estão artistas como Paula Rego, Maria Helena Vieira da Silva, Eduardo Batarda, Noronha da Costa, Helena de Almeida, Eduardo Nery, Rui Chafes, Menez ou Nikias Skapinakis. Muitos deles são ou eram criadores que trabalharam com a Galeria 111 que ainda hoje mantém as portas abertas, em Lisboa, dando, a viúva Arlete Alves da Silva e os filhos Rui Brito e Inês Brito continuidade ao trabalho de Manuel de Brito.

A caixa de correio em São Bento não recebe cartas

A palavra provocação é repetida pelo curador da exposição ao longo da visita que faz sala a sala, pelo Palacete de São Bento. E uma dessas provocações está longo na entrada da casa.

“A primeira obra que abre a exposição é a ‘Caixa do Correio’ do Rodrigo Oliveira que está colocada debaixo dos retratos dos anteriores primeiros-ministros, mas na verdade não recebe correspondência, nem dá uso à sua função”, explica Sérgio Fazenda Rodrigues perante a caixa de correio de cor branca, com uma chave pendurada.

A sala onde o primeiro-ministro recebe os seus convidados vemos na paredes de fundo um Eduardo Batarda de grandes dimensões, ladeado por uma Vieira da Silva e um João Queiroz que fazem um diálogo com o jardim de São Bento que se vê pelas janelas.

Mas a peça que salta à vista quando se volta a ouvir a palavra provocação é a que está num dos sofás e que quase se confunde com uma das almofadas de decoração. A peça, uma espécie de almofada feita a partir de “um saco de sarapilheira” que remete para os antigos “sacos de trincheira”, usados na guerra e que é uma peça recente artista Ana Pérez-Quiroga que tem inscrito a vermelho o lema da Revolução Francesa, Liberdade, Igualdade e Fraternidade.

Quem se encoste nesta “comoda almofada”, poderá também subir as escadas até à sala de reuniões de António Costa. Pelo caminho encontra outras obras provocatórias, uma deles um desenho de António Palolo que remete para a Guerra Colonial. “O que nos mostra são mutilados de guerra”, explica o curador perante uma obra que parece “muito luminosa”, mas que é “trágica”.

A fera política está na sala de reuniões de António Costa

À medida que o visitante percorre as salas, há detalhes que não escapam ao olhar e quando se chega à sala de reuniões do primeiro-ministro percebe-se mais uma vez o jogo de provocações que o curador deixa.

“Aquilo que temos aqui é, na continuidade do espírito da exposição, uma aproximação à ideia do espírito do animal, ou à intuição que o espírito animal traduz. É uma tentativa de compreensão e de chegar ao contato com os outros seres”, explica Sérgio Fazenda Rodrigues perante as três peças que escolheu para aquelas paredes.

Em grande destaque e que ficará por trás de António Costa quando assumir a condução de uma reunião está a “Arca de Noé”, um dos derradeiros trabalhos de Júlio Pomar, uma pintura sobre madeira cheia de cor e animais.

Ao lado “um outro objeto de parede do Pedro Gomes que é num artista contemporâneo” e que remete para as figuras japonesas dos “três macacos sábios” que não veem, não ouvem e não falam. A fechar o trio está, mesmo de frente para o lugar assumido pelo primeiro-ministro, um desenho de Paula Rego, “onde percebemos a relação humana com os animais”.

António Costa recebe os seus primeiros convidados nesta selva artística esta quarta-feira a partir das 17 horas. A Arte em São Bento abre ao público, com entrada livre no dia 5 de outubro, dia da Implantação da República, das 15 horas às 19horas. Depois, e até setembro do próximo ano, poderá visitar a “Arte em São Bento” no primeiro domingo de cada mês.

A iniciativa Arte em São Bento acontece desde 2017 e foi criada para promover a produção artística nacional. Pelo Palacete já passaram em edições anteriores coleções como a de Serralves, a António Cachola ou em 2022 a Coleção Peter Meeker, de Pedro Álvares Ribeiro.

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