06 fev, 2024 - 07:00 • Miguel Marques Ribeiro
“Como o tempo passa!...”, exclamou Ricardo Casimiro, ao tomar consciência de que esta terça-feira se assinalam 30 anos desde a atuação dos Nirvana em Portugal.
O empresário fundou, em 1979, a Tournée, empresa de espetáculos que promoveu a vinda da formação liderada por Kurt Cobain ao nosso país, para um concerto único realizado a 6 de fevereiro de 1994, no Pavilhão Dramático de Cascais.
Em meados dos anos noventa, os Nirvana eram muito provavelmente a maior banda de rock do planeta. “Foram talvez a banda mais icónica da sua geração”, considera Ricardo Casimiro.
Para isso “terá contribuído eventualmente também a morte prematura do seu líder carismático”, ocorrida sensivelmente dois meses depois da apresentação em Portugal.
Há meses que pairava sobre Kurt Cobain a sombra de problemas resultantes do consumo de drogas e de degradação do seu estado de saúde mental.
“Eu acho que ele estava com uma forte depressão”, aponta Casimiro. Era “o que corria lá nos bastidores, ou seja, na crew deles”.
Nada que tivesse transparecido no pouco contacto que o promotor teve com o artista. Pediram-lhe para montar uma casa-de-banho extra nos bastidores, para além das duas que tinham sido preparadas.
Mal começou o ensaio de som, no dia do concerto, Ricardo Casimiro e a sua equipa dirigiram-se aos camarins, de forma a aproveitar a ausência da banda para efetuar a montagem. “Abri a porta e quem é que eu vejo? Estava o Kurt sentado numa cadeira com os cotovelos nas coxas a fumar e eu fiquei um bocado atrapalhado. Estava ali o líder carismático dos Nirvana, não é? E perguntei-lhe assim quase a medo: “Eh pá, desculpa incomodar, mas vimos montar uma casa de banho se não te importas?” e ele: “Tudo bem, força, entra, entra”.
Horas depois, pelas 19h30, abriram-se as portas da sala para os 4500 espectadores previstos. O Pavilhão Dramático de Cascais, que hoje já não existe, “era uma estrutura velha e sem condições, mas era ainda assim a maior sala de espetáculos do país, com capacidade para 9 mil lugares”.
Os bilhetes, que custaram na altura 4 mil a 4500 escudos, ou seja, o equivalente a 20 e 22,50€, respetivamente, há muito tinham esgotado. Uma pequena fortuna, se tivermos em conta o tempo passado desde então, mas nada que tivesse impedido a realização de mais espetáculos, se tivesse havido essa oportunidade.
“Naquela altura, teriam feito três ou quatro concertos se houvesse datas, porque esgotou rapidamente”. E se fosse hoje, “eles iriam para outra sala. Talvez o Altice Arena”, porque o espetáculo estava desenhado para indoors, senão seria “certamente ao ar livre ou em estádio”.
Os Buzzcoks, conjunto de referência do punk britânico, muito apreciada pelos Nirvana, asseguraram o aquecimento. O trio formado por Kurt Cobain, Chris Novoselic e Dave Grohl, acompanhada por Pat Smear (como segundo guitarrista) e Melora Creager (no violoncelo) entrou em palco pelas 22h.
O alinhamento foi beber dos três álbuns de originais de estúdio do grupo: “Bleach”, de 1989, “Nevermind”, de 1991, que catapultou os Nirvana para o estrelato, e “In Utero”, último álbum de originais, lançado em 1993.
Pelo palco lisboeta, passaram assim grandes êxitos como Smells Like Teen Spirit, Rape Me ou Come As You Are, mas também canções menos conhecidas como Blew (que encerrou o concerto) e um cover de David Bowie, The Man Who Sold The World.
Ao todo, foram 25 músicas, tocadas em cerca de 100 minutos, que, segundo as palavras que António Freitas escreveu na altura para o jornal BLITZ, deixaram “"Para trás um público maravilhado e absolutamente rendido à simplicidade do trio que transformou o punk".
No entanto, durante as semanas seguintes, a degradação do estado de saúde de Kurt Cobain acabou por se impor e a In Utero European Tour, iniciada precisamente em Cascais, foi interrompida quando passava pela Alemanha, recorda o site livenirvana! onde é possível encontrar o histórico de todos os concertos realizados pela formação norte-americana.
Ricardo Casimiro fala sobre o concerto dos Nirvana em Portugal
A 8 de abril, o vocalista e guitarrista do conjunto que popularizou o estilo grunge, foi encontrado morto na sua casa, em Seattle, nos Estados Unidos, dando-se assim por encerrada a história dos Nirvana.
“Teve uma morte trágica, morreu prematuramente”, lamenta Ricardo Casimiro. “Veio engrossar aquele ‘grupo dos 27’ [artistas que morreram com 27 anos] de que faz parte o Jim Morrison [,Jimy Hendrix, Janis Joplin, Brian Jones] e mais recentemente a Amy Winehouse”.
Ainda assim, a três décadas de distância, fica a certeza de que a passagem da banda por Portugal marcou toda uma geração: “Isto está na memória das pessoas”, afirma Ricardo Casimiro, “e estará enquanto a música estiver presente e a música de Nirvana não nos vai abandonar para já. Acho que vamos durante muitos anos ainda consumir os Nirvana”.